06: Devia ter dito obrigada

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Tudo o que sei é que eu não paro de chorar um segundo sequer que estou ao lado do seu corpo desfalecido ali no chão do seu quarto. Eu imploro a Deus para que nada tenha acontecido com ela conforme tento fracassadamente sentir sua vitalidade através do pulso assim como vejo fazerem em filmes.

Não demoro a desistir dessa ideia e levar a orelha ao seu peito, sentindo parte da minha tensão cair por terra com o som fraco das batidas do seu coração.

Estou com os pensamentos confusos, e por segundos não sei o que fazer até ouvir som de passos de alguém descendo à escada. Então eu jogo a mochila em qualquer canto daquele quarto pequeno e rumo ao encontro a quem quer que estivesse em casa.

E o desespero dentro de mim é tão imenso que quando vejo o amigo do meu irmão prestes a adentrar a cozinha eu quero agradecer aos céus por ele ter chegado agora.
O garoto ouve meus passos apressados, e são suficentes para que ele se vire e esteja com o cenho franzido ao ver-me pateticamente chorando.

— O que houve, Igith? — Ele indaga com calma, dando um passo largo em minha direção.

Eu não consigo articular frase alguma, por isso puxo a manga do seu casaco sem me importar com a sua reação e o levo ao quarto da minha avó, apressada. E estou muito grata que ele não tenha resistido a isso, tanto como que ele parece muito mais capacitado a agir nesta situação quando chega até a mais velha ainda caída no granito gelado do quarto e a apoia sobre o seu colo.

— Chame uma ambulância, agora.

Obedeço a sua ordem e retorno a sala. Tenho dificuldades de pensar com coerência quando estou sobre pressão, por isso passo minutos mais que necessários tentando dar o endereço de casa.
Encerro a chamada e volto ao encontro deles. Minha avó já está deitada sobre a cama, ainda desacordada, enquanto Querin segura levemente em sua mão e lhe encara minuscioso.

Quando ele me vê, deixa a mão de vovó Yame ao lado do corpo adormecido e se levanta da cama.
Eu ainda estou chorando e limpando as gotas salgadas com as costas das mãos na mesma frequência, tentando não pensar no pior.
Não quero nem imaginar o que eu faria se a minha avó não tivesse sinais vitais quando a encontrei deitada naquele não. Umas das probabilidades, é a da minha alma ter ido junto da sua, pois é incondicional a importância que esta senhora tem na minha vida.

Eu fico ao seu lado fazendo carinho em seus cabelos e beijando sua mão enquanto Querin me dá privacidade e espera pela chegada da ambulância em frente da casa.
Acho que passa meia hora ou algo assim até que a ajuda leva a minha avó para a cabine da viatura.

Eu estou sentada no segundo degrau das escadas com a cabeça abaixada e apoiada nas mãos. Parei de chorar um pouco, mas minha garganta ainda está sufocada e seca.

Eu ainda estou com medo.

Nenhum dos meus parentes chegou ainda e faz tempo que liguei para cada um deles.

Aqui e agora, o único que está perto de mim  é este desconhecido que vêm calmo em minha direção e tenta me passar essa tranquilidade que não consigo absorver por mais que eu tente bastante.
Afinal, é a minha avó que está sendo levada para um hospital agora.

— Igith, você precisa se hidratar um pouco antes que eu te leve ao hospital. — Eu ergo o olhar até ao copo d'agua estendido para mim. Fungo uma vez, e não ligo que costumo ser orgulhosa às vezes. Eu aceito e bebo todo o conteúdo de uma vez só, a ver se os meus soluços também passam ou então reduzem um pouco.

Depois, Querin estende sua mão para que eu me levante. Sua ajuda parece inocente, mas eu hesito bastante em aceitá-la.
Ele não parece o tipo que me faria mal, entretanto, por vezes é uma grande batalha não pensar diretamente nisso.
Eu deixo o copo de lado e aperto sua mão, num impulso cuidadoso o garoto me põe de pé e estamos frente a frente, mas eu não o encaro porque me sinto ridícula demais no momento.

Marcas do Passado [✓]Where stories live. Discover now