Capítulo 8

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DANIEL

Ter um bebê em meus braços depois de algum tempo, era uma sensação estranhamente familiar e prazerosa. Eu sentia falta daquilo, mas sempre pensei que quando acontecesse, eu me sentiria mal.

E muito pelo contrario, ter uma criança indefesa em meus braços novamente, remetia-me à saudade, sim, mas também ao carinho, a vontade de proteger. Era estranho e reconfortante. Prazeroso e agonizante ao mesmo tempo.

Saí do prédio com a cabeça cheia e a sensação de peso nos meus braços. O cheirinho de bebê impregnado em minha roupa. Eu não prestava atenção em quase nada. Apenas no meu caminho à frente, enquanto minha cabeça viajava em memórias guardadas e trancafiadas no fundo do meu coração.

Memórias que eu não queria trazer à tona.

Encontrei-me com Everaldo, o fornecedor, no local marcado. Um restaurante no terraço de um prédio, que nos dava a vista magnífica da cidade vista do alto.

Éder, um amigo, também estaria presente. A reunião seguiu seu curso, e fechamos antes até do horário previsto, assim nos despedimos mais cedo de Everaldo com mais um fornecedor fechado.

— Quer ficar mais um pouco, aproveitar o bar e a vista, e me contar o que tanto está de deixando pensativo? — Éder disse, assim que Everaldo saiu de nossa mesa.

Acabei me sentando novamente, e meu amigo me acompanhou, entendendo que eu havia aceitado o seu pedido.

— Eu revivi algumas memórias hoje. Do tipo que não posso.

— Que tipo de memórias?

Olhei para ele com uma sobrancelha erguida. Meu amigo sabia de tudo o que havia acontecido e principalmente o que eu não gostava de me lembrar. Muito menos de falar, então este pequeno ato já o fez entender.

— Lembra que eu te falei que tinha conseguido uma nova secretária? — Ele balançou a cabeça afirmativamente. — Hoje eu tive que passar na empresa para pegar aqueles papéis que te falei. Quando eu cheguei lá, ela estava com um bebê.

Meu amigo arregalou os olhos em uma expressão assustada.

— Como assim, ela levou um bebê para o serviço? Era dela?

— Sim, era dela. Uma bebê tão linda, os cabelinhos escuros arrepiados. Ela chorava tanto que eu não resisti...

— Você pegou a bebê no colo?

Eu não encarava meu amigo. Meus olhos vagavam pelo nada, relembrando novamente a sensação do bebê nos meus braços. Eu poderia estar repetitivo, ou viajando demais na ideia de ter pegado uma criança no colo por alguns minutos, mas... eram minha mente e meu coração agindo.

E eu estava desacostumado a usar o coração para outra tarefa além de bombar sangue para o meu corpo. Não que eu não fosse um homem... com sentimentos. Sim, eu era, amava a minha família. Minha irmã e minha mãe eram tudo o que eu tinha. Eu amava meus amigos – mesmo eles sendo poucos, mas de grande qualidade. Mas era isso. O sentimento já estava dentro de mim, não era algo novo. E fazer meu coração acelerar apenas por um contato com uma criança estava me deixando mais pensativo ainda.

— É tão bom quanto eu me lembrava. Já falei que ela é linda?

— E o que você vai fazer com a sua secretária?

Finalmente desviei os olhos para meu amigo, e ele tinha o cenho franzido, encarando-me com surpresa.

— Como assim o que eu vou fazer com ela?

— Ela infringiu as regras. Levou uma criança para o trabalho. Isso não está certo.

Encarei meu amigo com os olhes semicerrados, pensando em como ele estava errado. Como aquilo tudo era errado.

Sim, não era certo termos uma criança em nosso local de trabalho. Não era certo ter uma na minha empresa, mas o que eu poderia fazer em respeito a isso? Era uma necessidade, pelo pouco que eu havia ouvido Camila falar.

— Não sabemos o que se passa ou passou. Ela está trabalhando comigo há mais de dois meses e está sendo uma ótima funcionária.

— Mas mesmo ela quebrando...

— Olha só — interrompi meu amigo — ela pode até ser mãe solteira, pode não ter o apoio da família. Ela me disse que a babá havia sofrido um acidente. Eu não vou julgar assim, uma mãe que não tinha com quem deixar a sua filha.

— Mas...

— Não tem mais, Éder — acabei me excedendo um pouco, e falei mais alto. Parei, respirei fundo e voltei minha atenção ao meu amigo. — Ela é minha funcionária. E eu vou saber como lidar com isso.

— Tudo bem. Você está certo, eu não tenho o direito de me meter nas suas escolhas.

— Não é questão de se meter, meu amigo. Estamos debatendo e eu discordo da sua ideia. Apenas isso.

Éder levou o drinque que havia pedido à boca, bebendo e ponderando o que eu havia acabado de falar.

— Sim, você està certo. Mas ainda assim, eu não concordo com você.

— Eu não julgá-la, não significa que eu não irei conversar com ela, esclarecermos tudo e dizer que aquilo é sim, errado. Mas pense comigo, uma pessoa que pode estar sozinha, com uma criança em casa e tem que sair para trabalhar. Que escolha ela poderia ter? Deixar a filha sozinha?

— Você tem razão. É um caso a se pensar — ele ponderou.

— Eu sei que tenho razão. Sempre tenho.

Meu amigo riu, e eu o observei.

Após mais algum tempo com ele bebendo e conversando sobre outros assuntos, voltei para minha casa.

Assim que entrei no silêncio e conforto do meu refúgio, minha cabeça voou novamente para aquele ser minúsculo em meus braços, a sensação sendo preenchida.

Era como se um vazio fosse tampado.

Mas ao mesmo tempo, a escuridão e o silêncio da minha casa começaram a me incomodar.

Uma agonia ruim e desconfortante tomou conta de mim.

Mas se apenas pegar aquela criança havia me deixado assim, então os meus medos e traumas ainda estavam vívidos em mim.

Só me restava passar mais aquela noite na solidão que eu mesmo havia criado.

E às vezes chorar por todo o ocorrido. Pelo passado, presente e futuro.

Era isso que eu fazia em momentos assim, já que o sono não me visitava, lamentar era a minha única opção.

Um CEO ConquistadoOnde histórias criam vida. Descubra agora