São quatro horas

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Nenhuma ligação, mesmo após ter feito diversas chamadas para o número de Taehyung, todas davam caixa postal. Aos poucos foi desistindo, a motivação que havia plantado dentro de si lentamente desapareceu do mesmo modo que o psicólogo desapareceu, levando seus sentimentos. 
Mais uma vez foi sugado para a cama, sentindo seu corpo doer diante tantas horas deitado naquele colchão fofo. O cobertor enrolado em suas pernas enquanto o celular morria, pedindo por bateria. Na televisão ressoava uma música calma; uma música nova que havia estreado de algum rapper famoso, Yoongi levou os olhos até a televisão, vendo o terno vermelho brilhante dançando com um banco atrás. 

“Talvez eu me tornei mais ganancioso ao tentar me encaixar com você”

Balançou sua cabeça na tentativa de afastar qualquer tipo de pensamento maldoso, desejava evitar coisas dessa forma, ou então iria afundar cada vez mais. Quando se levantou para colocar o celular para carregar, ouvindo barulhos vindo de sua janela. 
Franziu a sobrancelha, parando quase que imediatamente na tentativa de confirmar se era realmente algo que ouvia ou se era coisa da sua cabeça.

“Paf! Paf!”

Deixou com que o smartphone caísse, chocando-se contra o chão de madeira. Em passos quase corridos foi em direção à janela onde ocorria o barulho. Seu peito doeu de modo tão forte que comparou com um ataque cardíaco.
Era Taehyung! Taehyung viria lhe buscar, pedindo desculpas pelo sumiço, dizendo que teve alguns problemas mas já estava de volta para buscar Yoongi. 

Pensou que o Kim fosse algum procurado pela polícia e para evitar que algum agiota, ou até mesmo traficante e no pior dos casos assassino em série, pudesse seguir o Min. Taehyung sempre iria voltar, porque ele amava-o. 

A cortina parecia mais pesada do que nunca, um bolo de choro subiu em sua garganta enquanto seu corpo parecia tremer sem parar, sem forças para puxar a cortina. Aos poucos o som que vinha foi morrendo, e logo após puxar a cortina, viu quem estava lá.

Não era Taehyung. Viu um cabelo marrom se mexer, a boca bonita se abrir num chamado alto.
— Min Yoongi!

O pálido abriu a boca, chocado demais para tentar processar algo. Namjoon estava lá, usando um casaco verde e fofo, o nariz avermelhado e as bochechas rosadas. Em sua mão havia luvas escuras e um gorro da mesma cor.

— Joon? O que faz aqui?

— Você não responde minhas mensagens, vim te ver. 

Um sorriso triste nasceu em seu rosto, o pálido sentiu vergonha de si mesmo. Havia se trancado quando seus amigos estavam preocupados, como se tivesse esquecido de suas amizades e focado só em Taehyung. Deixou com que um suspiro escapou de seus lábios, trazendo a tona da verdade que ocorria ao seu redor. Se sentiu egoísta.

— Espere alguns minutos, vou vestir um casaco e já desço.

— São quatro horas, Yoongi. O dia já vai se pôr.
 
Em passos rápidos pegou um casaco fino que viu preso no cabide. Era acinzentado e longo, cobrindo boa parte das suas pernas atrás. Calçou um chinelo, puxando a chave da fechadura e trancando a porta. Desceu as escadas com tanta pressa que quase caiu, deu um resmungo por conta disso.

A neve caía de modo fraco, o asfalto estava coberto pelo clima frio embranquecendo tudo ao seu redor. Ao lado de uma árvore Namjoon permanecia parado, o corpo balançando num ritmo criado por si mesmo. Um sorriso nasceu ao ver Yoongi caminhar em sua direção, as covinhas aquecendo todos ao seu redor. Automaticamente sorriu, sentindo seu coração quentinho.

— Finalmente pude te ver, huh? — O maior disse, se aproximando. Olhou de cima a baixo para o amigo, que só conseguia ficar feliz na presença do mais novo. — Não se agasalhou direito?

— Fiquei animado demais para te ver. 

O Kim arregalou brevemente os olhos. Um sorriso sem graça escapou, enquanto desviou o olhar, resmungando baixo.

— Ah, esse hyung, sério… — Yoongi riu. — Por que você não atende mais minhas mensagens? Já não basta Jimin sair por aí e nos dar desculpas fajutas.

— Meu pai morreu. AVC. 

— Yoongi? 

— Foi bem repentino, Joonie. Tipo minha mãe. 

— Meus pêsames. — O Min balançou a cabeça, sentindo seu peito afundar.

— Está tudo bem. No funeral vi minha madrasta chorar sem parar, e eu me senti culpado, porque eu a odiava e ver ela naquela situação me fez sentir desprotegido, como se tivesse derrubado todos os muros que criei na nossa relação. Eu vi ela chorar como uma desesperada, suas amigas confortando e dizendo que o casamento deles foi forte e que ninguém conseguia abalar. — Disse, os olhos baixos, a boca se movendo por conta própria. — Sabe quem conseguiu abalar? Eu. O filho dele. Isso me deixou tão mal, me senti culpado.

— Você não é culpado, nunca foi. Você é a vítima, reconheça seu lugar. — Namjoon suspirou, tocando nos ombros do pálido, que tremia de frio. — O que ela fez foi errado, lembre-se disso. 

— Mas o meu pai…

— Seu pai foi um homem bom, se esforçou para ocupar o lugar que sua mãe deixou, mas ele não tem culpa das coisas que a mulher fez. 

Alguns segundos de silêncio. Yoongi encostou a cabeça no peitoral do mais velho, que subiu a mão até as bochechas do pálido, numa carícia. 

— Eu me sinto culpado por ter deixado aquilo nos afastar. — Confessou. — Eu sou o pior filho do mundo.

Não soube o que responder. A mão grande se afastou só para remover as luvas, a fim de colocar nos dedos brancos e finos de Yoongi, que permanecia sentindo frio. A boca tremia levemente, sem saber se era por conta da temperatura ou do desabafo. 

— Lembra do psicólogo? — Namjoon assentiu, ouvindo cada palavra do Min. — Comecei a frequentar, e nos conhecemos melhor, sabe? E aí nos apaixonamos.

— Oh, bem…

— Mas aí, ele sumiu, sabe? Desapareceu. Tentei ligar para ele, mas um cara atendeu e disse “Min Yoongi? Oh ele pediu para que você nunca mais o ligue”.

— Nossa!

— Uhum. — Suspirou, os pés se movendo contra a neve formando um desenho qualquer. — Na semana seguinte meu pai morreu, e somando tudo, me senti muito mal. Fiquei trancado em casa e nem apareci na faculdade. Minha avó tentou conversar comigo, e ela até me motivou, mas me vi preso. Não sei onde ele mora e o consultório ainda fica vazio, a única coisa que me restou foi esperar ele atender minhas ligações, e aí acabei esquecendo de falar com vocês. Desculpe por…

Calou-se. A boca rosada foi tomada pela carnuda, as mãos que acariciavam seu rosto agora seguravam com tanta firmeza que suas pernas amoleceram. As bocas se separaravm brevemente, conforme as palavras saíam do maior.
— Não posso ocupar o lugar do seu pai, mas posso ocupar o lugar daquele que te amou.

São quatro horas. Yoongi havia recebido um beijo de Namjoon.

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⏰ Last updated: Nov 27, 2021 ⏰

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