Sei

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Yoongi precisou tocar na campainha sete vezes para, enfim poder confirmar que Taehyung não estava lá. Precisou deixar três suspiros de decepção escaparem, exausto por ter seu tempo gasto a toa. E só uma palpitação foi o suficiente para saber que a voz grossa que lhe chamava, era do psicólogo.

Olhou para trás, vendo o mesmo usando uma regata branca junto de um casaco xadrez, e em sua cabeça havia um boné para trás.

Que horror!

O Min precisou piscar para acreditar no que estava vendo. Parecia que o mais velho estava pronto para um dia de férias em família. O carro prateado combinava perfeitamente com essa atmosfera familiar; não conhecia muito sobre carros, então, os identificava como cor.

- O que está fazendo? - Questionou, vendo o sorriso maroto do Kim.

- Entra no meu carro.

- Você vai me sequestrar?

- Claro que não! - Respondeu. - Você seria meu cúmplice pra enterrar o corpo.

Yoongi apenas revirou os olhos, rindo. Deu a volta e entrou no carro, colocando o cinto de segurança logo.

- E então? Onde vamos, Taehyung?

- Para sua infância.

[…]

De início pensou que iriam para algum tipo de creche, jardim de infância ou até um parquinho. E no fim, estava certo. Carregando uma “tupperware azul”, repleta de sanduíches, e claro, quatro caixinhas de suco numa sacola de supermercado.

Taehyung tirou o tênis e a meia, sem se importar com os outros ao seu redor, e o mais novo achou isso incrível. Fez o mesmo, tentando ignorar os — possíveis — olhares sobre si.

- Como você e sua mãe faziam? - O mais alto perguntou. - Digo, quando saíam juntos.

- Ela deitava a cabeça no meu colo.

Taehyung abriu um sorriso, e sem se importar, fez o que foi dito. Os fios castanhos desceram até o colo de Yoongi, o fazendo arregalar os olhos.

- Por favor me diga que você fazia cafuné na cabeça dela.

- Sim!

Os dedos brancos tocaram o cabelo alheio. Primeiro, os polegares deslizaram pelas sobrancelhas grossas e bem feitas, indo para os lados. Tocou também suas bochechas gordas, se segurando para não às apertar. Viu aos poucos as mesmas ficarem rosadas. Taehyung estava com vergonha.

Abriu um sorriso, entretanto, o mesmo logo se desmanchou, ao ver o Kim abrir os olhos e se esfregar contra a palma da mão do Yoongi, claramente pedindo por mais.

- Yoongi... - Começou.

- Cale a boca. - Rebateu, ficando envergonhado. - Você vai estragar o clima.

Antes que o mais velho pudesse responder, Yoongi já havia bagunçado o cabelo do psicólogo, e aos poucos, seu coração também. Taehyung prendeu a respiração, ficando envergonhado pelos toques, sua melhor opção era acatar o carinho, e seguir com a consulta.

- Como foi? Digo, depois da morte da sua mãe.

Yoongi precisou respirar fundo, aprofundando-se nas memórias daqueles péssimos dias. Ainda conseguia sentir o cheiro de vela apagada, misturado com chá mate.

- Eu tive medo, sabe?

- Sei.

- Fiquei com medo de não conseguir me acostumar com aquela vida, sem minha mãe. - Suspirou, tocando a testa de Taehyung. - Meu primeiro aniversário sem ela foi o pior de todos, eu juro. Torcia para ela sair da cozinha com um bolo de morango para mim, e no fim, tudo sobre aquilo ter sido um sonho ruim, sabe?

- Sei.

Os ombros caíram, tamanha tristeza. O garoto parecia procurar as palavras certas para continuar, ou até coragem.

- Dois anos depois meu pai apareceu com uma mulher. Ela parecia ser gentil, sabe? Mas aí... Ela se mostrou.

- Yoongi... - O psicólogo tocou o rosto do paciente. E parecia que o mundo havia parado.

Os cabelos negros de Yoongi combinavam muito bem com o céu. Na verdade, tudo parecia combinar com Yoongi.

- Taehyung...

E pela primeira vez, Taehyung gostou da forma que seu nome desliza pelos lábios rosados do Min. Parecia tão suave, igual algodão. Tão natural, tão... Yoongi.

- O que ela fez com você?

O pálido abriu a boca, tentando dizer. Seu rosto ficou vermelho, de tanta vergonha. Não era algo bom, pelo contrário. Era vergonha pelo passado. Ao ponto de passar a noite pensando naquilo, pensando em como poderia corrigir seus erros.

Aos poucos, os olhos cor amêndoa brilharam em lágrimas. Taehyung levantou num pulo, em alerta. O corpo parecia retrair, enquanto o ar faltava no corpo pálido de Yoongi. O Kim levou a mão até o bolso, pegando o fone de ouvido. Tamanho desespero, acabava por ser atrapalhado, conectou o fone ao seu celular, colocando no seu cantor preferido.
Passou o fone para o menor, que encarou seu psicólogo indeciso com o que ele planejava fazer.

- Vai dar tudo certo. - Garantiu.
Fez, colocando o fone pode ouvir a voz doce do cantor acertar seu corpo num furacão de sentimentos. Parecia que todo aquele choro iria sair a qualquer momento; o choro guardado depois de tantos anos.

Sentiu seu corpo ser entrelaçado, num abraço apertado com Taehyung, sua cabeça repousou no ombro, e enfim, se sentiu seguro. Naquele momento, sentiu que poderia chorar tudo que foi engolido, todas as memórias que teve de enterrar pelo seu próprio bem, Yoongi teve que as enfrentar.
Talvez se sua mãe não tivesse morrido, o Min não teria conhecido a mulher que estragou sua vida. Os soluços saíam altos, descontrolados. Sua mão apertou a manga da jaqueta do psicólogo, que o apertava e balançava lentamente, numa tentativa de tentar o acalmar.

Aquele grande monstro, enfim tinha encontrado Yoongi.

E Taehyung sabia que a melhor forma de encerrar isso, era o encarando frente a frente. Sabia que chorar era o melhor remédio, principalmente depois de ter guardado tudo.

Num piano descontrolado, o interior do pálido parecia se remexer, numa sinfonia assustada, atormentada. Ainda conseguia se lembrar dos dias com sua madrasta. Os sorrisos, as frases, e principalmente, seus erros. Conseguia se lembrar do quão inocente e infantil havia sido, caindo no papo da mulher.

E sentia-se idiota por isso.

Aos poucos, da mesma forma que seu choro veio, ele também desapareceu.
Já havia tocado a mesma música quatro vezes, porém, em nenhum momento Taehyung havia o soltado.
Se apenas ficar em silêncio, poderia aproveitar mais um pouco dos braços calorosos de Taehyung?

Yoongi não quis saber de pensar ou refletir, a segurança que havia no psicólogo era o suficiente.

myself; kth + mygWhere stories live. Discover now