We can't say goodbye

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Tudo ainda é difícil de acreditar, mas foi real. É real. O mundo abaixo de nós queima e se transforma em cinzas. O Vale se foi, o bunker se foi, toda uma história se foi. Observo o diálogo de Diyoza e Octavia estando sentada do lado oposto do corredor, sinto a respiração calma de Tommy deitado com a cabeça ao meu colo e relaxo o corpo no metal frio me sentindo presa demais pelo curativo feito há pouco. Me viro com calma até prender Bellamy com meus olhos, também observa a irmã, levanto uma mão até um canto bagunçado de seu cabelo e o ajeito num segundo, atraindo sua atenção.

—Não aprendemos nada, não é?—passeia as íris por meu rosto.

Balanço a cabeça e levanto os ombros. Acho que seja difícil dar uma resposta positiva algum dia, a não ser que estejamos cansados de já ter tentado. Suspiro.

—Então, o que será agora? Viveremos no Anel uma segunda vez? Não sei se aguento.

—Temos outra opção.

A nave atraca. A tripulação se põe a ocupar a estação mineradora aos poucos, tanto Wonkru quanto os já familiarizados com o local. Perguntei como foram capazes de deixá-los vir conosco, e então me responderam que houve uma rendição. Que primeiro os salvamos e depois vemos se merecem ser salvos. Meus passos são calmos e curiosos ente os novos corredores, muitos seguem para o que encaro como o centro, porém sigo Bellamy e os mais próximos até a sala de controle.

A proposta discutida é simples. Permaneceremos em criogenia, por dez longos anos. Se a alternativa fosse nos mantermos com as algas do Monty, por falta de suprimentos, Murphy preferiria ser jogado ao espaço. Seria assim o prato tão ruim? Não sei, possivelmente nunca saberei, Maddie deu o veredito sobre o ponto de Raven e Shaw, o piloto. Não posso negar estar intrigada e assustada no mesmo nível, mas já passamos por coisas piores, ficar congelada como um enorme bloco de gelo parece uma ideia estranha, também confortável pelo longo descanso de tanto caos. Subimos até às camaras, numerosas fileiras repletas delas. Kane teve prioridade, seu estado será resolvido em uma cirurgia assim que acordarmos, ficará bem.

Nosso grupo se divide. Enquanto Bellamy se ocupa em verificar a da irmã, vejo a de Thomas. A tecnologia é surpreendente e o funcionamento aparentemente simples, deixo que se ajeite no que parece uma cama macia e futurista e vizualizo o botão que dará início a todo processo.

—Achava a história do Capitão América legal, mas nunca quis dizer que queria ficar como ele.—avalia a estrutura, já deitado. Rio.

—Te vejo em um minuto.—pisco um olho. Ele puxa um canto da boca num sorriso, me dando permissão de fechar.

Permaneço por um minuto, até resolver enfim caminhar até a minha ao lado. Teria condições de ativar sozinha, mas não seria a mesma coisa sem ele. O Blake vem em passos calmos, não posso deixar de apreciar. Não conseguiria jamais me perdoar se o tivesse deixado. Me sinto em partes anestesiada. Anestesiada pois estamos bem, sem desavenças e com um plano traçado, mesmo assim, abraço um ponto de insegurança sólido e convincente, cruel.

—Me diz a primeira coisa que quer fazer na nova Terra?—pede.

—Com certeza não gritarei "estamos de volta, vadias", Octavia já ganhou a fama.—estreito os olhos, fingindo estar pensativa—Talvez olhe para o céu, e peça ao universo mais uns anos para viver a vida sem esbarrar em uma armadilha de vizinhos.

—Válido.—meneia a cabeça—Eu pediria outra coisa.—não sei ler ao certo seu olhar.

—Ótimo, estarei curiosa por uma década inteira.—recolho as pernas e me ajeito, deitando na cama—Vamos, ante logo com isso, ainda quero estar sorrindo quando te ver novamente.

—Sem despedidas?

—É só um cochilo—o fito novamente—, ou está esperando um pedido de casamento?

—Isso eu respondo depois.—desvia os olhos com ar cativante de humor—Bons sonhos.

—Para você também.—me sinto relaxada quando o botão é pressionado, guardando seu rosto em meus pensamentos.

[ ANOS MAIS TARDE ]

Me sento sobre o estofado, tranquila como se tivesse vivenciado a melhor das rotinas por tempos. A pele suave de meu corpo ainda gélida. Parece que não passei de dez segundos com os olhos fechados. Ficamos o prazo esperado? Olho ao redor expandindo minha percepção; centenas de camas seguem acessas e piscando em verde e vermelho. Parece um laboratório esquecido no meio de uma fuga. As luzes do teto estão apagadas, porém tudo está limpo. Miro a câmara de Thomas; funcionando. Olho a de Octavia do lado oposto e está vazia; descongelada. Aperto os dentes. Viro o rosto para a frente e me deparo com o Blake. Ele sai de um dos corredores, vindo de encontro a mim com uma caminhada apressada quando nota que estou desperta. Pulo da superfície, o som ecoando ao chão. Sem uma palavra esclarecedora, pego sua mão estendida e deixo que me guie até a sala de controle. Murphy está de braço dado com sua namorada frente ao vidro coberto da nave. Raven está sentada na cadeira ao lado de Monty, Harper em pé com as mãos apoiadas nos ombros dele. Clarke também está de frente ao vidro, seus braços estão cruzados. Echo e Octavia seguem a linha deles.

Por que ninguém diz nada? Somente alguns olhares são trocados. Estou sonhando, ou... é assim que o além se parece?

—Queria que fôssemos os primeiros.—o Green tira o foco da tela que expõe alguma imagem distante demais para minha compreensão. De alguma forma, meu estômago remexe—Espero que possam entender. Eu mesmo ainda preciso de um tempo para digerir.

Ele não sorri ou demonstra frustração. É neutro, mas isso não é sinal de algo bom. É tão neutro que inquieta meu interior. Olho de canto para Bellamy. O que deu de errado essa vez? O ar está acabando? Estamos ficando sem energia? Temos vistantes? Vivemos em uma simulação? Sua mão se firma na minha, não tenho certeza se sabe o que Monty quer dizer.

Anda logo.—John reclama entredentes.

Volto a encarar a tela e percebo quando o homem pressiona um botão chamativo de tom amarelo. Me atento no segundo em que o ranger da placa fria que protege ao vidro começa a subir. Meu corpo arrepia com o mínimo feixe de luz que incide sobre minha pele, tão dourado quanto a cor dos sonhos mais puros — ou tão aterrorizante quanto ver algo se consumir numa explosão. Avanço alguns passos na companhia do mais velho, não tendo espaço para trocar meu campo de visão além da movimentação torturante de lenta. Quero me abaixar para contemplar o resultado, porém me seguro. Sinto a eternidade envelhecer minha pele. Faltando um centímetro até a esperada revelação, o ar me falta.

Tudo congela. Exceto pela movimentação de astros sublimes.

Sinto minha alma querer sair do corpo. Meu cérebro deseja falhar com a imagem. Não entendo. Eu não... esperava. Miro Bellamy um instante, apenas uma confirmação de que tudo é real. Como pode? Subo a mão por seu braço e apoio uma mão no vidro, mexendo os dedos sobre longínqua superfície que segue a órbita. Por que somente nós estamos aqui? Seria tão avassalador se presenciado por todos? Queria Thomas aqui, abraça-lo e dizer que tudo ficará bem, que daremos um jeito de tudo voltar ao que era antes. Engulo em seco, piscando os olhos assombrada. Tombo a cabeça no peito do moreno quando recuo um passo, escondendo meu rosto e o apertando forte quando meu peito se contrai. O que diz no instante em que retribui é um choque:

—Estamos de volta.

Elizabeth, mãe, queria que pudesse presenciar isso de alguma forma. Nada é como antes, mas, talvez, como tudo deveria ser. A humanidade retornará à Terra. O solo é verde. Vibrante, caloroso e — a quilômetros de distância — real.

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Não sei como anunciar que chegamos ao fim, sinceramente. Deixaria uma forma de agradecimento ao final, mas guardei para um capítulo separado.

Passa a telinha aí...

—Anna ♡

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