Capítulo 5

41 11 6
                                    

Vinícius

31 de dezembro - 23h00m

Gabriela e eu compramos algumas bebidas e deixamos a música nos envolver, dançamos bastante antes de seguirmos até a torre do relógio. Aquele lugar era um grande diferencial na região, o seu formato lembrava muito a Torre Eiffel e as sensações, talvez fossem similares, apesar de nunca ter ido a Paris. A paz e a tranquilidade faziam-se presentes e mesmo com um pouco de medo, era como se pudéssemos enxergar o mundo com outros olhos; a sensação de que caminhar pelos ares era possível, permanecia unânime. O mundo era nosso!

— Eu devo ter passado vergonha — falei, contemplando a multidão lá em baixo.

— Se passou, com certeza não foi o pior — ela riu. — Tinha gente dançando realmente mal. Mas me diz, foi bom se soltar um pouco?

Estávamos com os braços apoiados no parapeito e, ao ouvir aquela pergunta... Eu não sei dizer o que senti, mas parecia tristeza, então a olhei nos olhos e disse:

— Claro — sorri em agradecimento. — É melhor eu ir, não quero criar problemas. — Me afastei do parapeito.

— Que problemas? — A atenção dela estava fixa em mim.

— O que está fazendo aqui, Gabriela? — Um tom de voz alterado ecoou. Neste instante, notei que os olhos da mulher a minha frente brilharam, e por um momento, achei ter ouvido o seu coração chamar por mim.

— Eae. Tudo bem? — Estendi a mão quando Bruno se aproximou, mas ele me encarou e respirou fundo.

— Estou bem — respondeu, apertando minha mão como da outra vez, porém, com uma leve diferença no olhar.

— Que ótimo. Bom revê-lo — sorri. — Eu vou indo. Até mais. — Acenei para Gabriela.

— Não vai ficar, soldado? — Paralisei por alguns instantes. Aquelas palavras adentraram os meus ouvidos e eu percebi. É o Bruno... Aquele Bruno.

— Eu já estava de saída — falei. E logo vi que algumas pessoas se preparavam para descer a torre. — De qualquer forma, obrigado por perguntar. — Virei-me e sai dali às pressas, antes que a última pessoa entrasse no elevador.

Mas é claro, a Gabriela estava com o Bruno. Como pude esquecer que encontrei os dois meses após a formatura da escola e que me disseram que estavam namorando sério? Logo, outras lembranças vieram à tona.

...

— Sim, exatamente. Ah, eu gosto muito desse filme — falei para Gabriela, que me encantava a cada momento.

Estávamos sentados no gramado da escola, próximo ao pátio. É o local que geralmente ficamos na hora do intervalo: à frente, mais embaixo, estavam algumas salas, e atrás de onde estávamos escorados, ficava a quadra.

— Seria bom se pudéssemos rever aqueles que partiram para o outro mundo — ela dizia. — Mesmo que no corpo de um boneco de neve. — Ficamos em silencio por um instante. Até que notei alguém nos observando.

— Ei! — sussurrei. — Não olha agora, mas aquele ali não é o garoto que vive atrás de você?

— Quem? — Ela olhou logo na direção da sala dos professores, no local exato em que o garoto estava.

— Eu falei para não olhar. — Coloquei a mão no rosto.

— Ah. É ele sim. — Ela ergueu uma sobrancelha. — O nome dele é Bruno — disse, olhando outra vez para o garoto.

— Eu não sei, mas ele é estranho. — O olhei disfarçadamente.

Ele sempre esteve por perto, nos observando. Enquanto eu estava no elevador, descendo a torre, me lembrava daquela época.

— Eae, soldado de chumbo. — Bruno se aproximou, sorrindo de ponta a ponta. Só que ele não me engana, pois pelo o seu olhar eu percebo as suas intenções maliciosas.

— Não gosto que me chamem assim — falei, franzindo o cenho.

— Sem problema. E apenas soldado, pode? — Sugeriu com sarcasmo. — É que você anda todo ereto, sabe? No prumo.

— Eu não sei quem espalhou esse apelido, até os alguns professores estão me chamando assim — falei indignado.

— Calma, Vinícius. Esquece esse povo. — Gabriela colocou a mão em meu ombro.

— Como? Eles não me esquecem.

...

— Idiota!

— Oi? — perguntou, a mulher ao meu lado.

— Nada. Me desculpem, pensei alto — virei o rosto, tentando me esconder dos olhares.

Quando finalmente sai do elevador, notei que haviam mais pessoas ao redor da torre. O Parque Linear sempre tem pessoas, mas em datas comemorativas enche como nunca. Eu gosto daqui, quando está mais vazio, claro, porque dá para fazer piquenique, atividades, descansar e até marcar encontros românticos.

Enquanto eu estava perdido em meus pensamentos, tive novamente aquela sensação estranha. A tristeza de antes estava voltando, então comecei a caminhar sem saber o que faria na sequência, contudo, como se tivesse sido despejada em nossas cabeças, gotas de chuva caíram. Parei de andar e olhei para o céu, enquanto algumas pessoas corriam na tentativa de permanecerem secas, eu desejei que as gotas de água levassem embora toda a impureza que havia em mim, no entanto, com a mesma rapidez com que começou, a chuva parou. As nuvens dispersaram-se, abrindo espaço para a lua brilhar. Eu permaneci olhando para o céu, mas alguma coisa direcionou a minha atenção para a torre. Os dois continuam lá em cima. Espera! Não sei se eu estava enxergando direito, mas... "A Gabriela precisava de ajuda." Foi como se uma voz sussurrasse em meu ouvido.

Então, como se finalmente eu tivesse acordado, corri de volta a torre do relógio. Contudo, logo na entrada, fui impedido de subir pelas escadas, pois muitas pessoas passavam às pressas.

— O que está acontecendo lá em cima? — perguntei.

— Um cara maluco disparou uma arma, ameaçando atirar em todos — respondeu o homem que carregava a filha no colo.

Gabriela...

Só havia um elevador, por isso a maioria das pessoas desciam pelas escadas, me atrapalhando também. Mas eu não deveria me surpreender que antes a torre estava quase vazia, já que era comum encher rapidamente em seguida.

***

Com muita dificuldade entrei no elevador, antes que ele subisse outra vez. Meu coração estava acelerado, eu não conseguia ficar quieto; podia sentir ele bombeando em meu peito, enquanto as minhas mãos tremiam e suavam frio. A ansiedade tomava conta do meu corpo. Quando enfim cheguei ao topo, visualizei uma cena que despertou a ira em mim; Bruno segurava Gabriela pelos cabelos e com a outra mão, pressionava a arma no rosto dela.

— NÃO! — Corri na direção dos dois com todas as minhas forças. — Solta ela seu canalha!

Bruno virou o rosto e fitou-me, expressando a sua falta de siso através do olhar e um sorriso malicioso. O tempo parecia lento, era como se eu nunca fosse alcançá-la, mas o silencio que se fazia presente foi quebrado por trovões e um clarão que me impediu de continuar enxergando. Eu via apenas borrões.

— GABRIELA! — gritei, quando percebi que Bruno a jogou na direção do parapeito. Em seguida, entre os borrões, vi que ele apontava a arma para mim.

Laço Entre Almas: A chamada que nos uniuWhere stories live. Discover now