Capítulo 9

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Lobo

A porta se abriu e um homem muito baixo, com longos
bigodes e um jaleco branco que ia até o joelho, nos recepcionou
com um sorriso tão fraco que por um momento pensei que ele
estivesse sofrendo de algum mal intestinal.
— Senhorita Stelle , como é bom vê-la — disse como se não
estivesse escrito no meio de sua testa enrugada que não estava
nem um pouco satisfeito em colocar os olhos em nós.
— É tão bom notar que sentiram minha falta. — Ela abriu um
sorriso debochado para o homem e ergueu o rosto, encarando-o de
frente.
Anastácia  retirou os óculos escuros com calma e abriu um
sorriso ainda mais reluzente quando notou que todos os olhares
dentro daquela sala se viraram para a porta a fim de vê-la. Estava
linda naquele vestido, linda não, radiante seria a palavra mais certa
e deveria admitir que estava surpreso. Não pela beleza cintilante
que ela exibia, longe disso.
Anastácia Stelle  era uma mulher estonteante em qualquer tipo
de situação, mas depois da noite que ela teve, esperava tudo dela,
menos que fosse capaz de se levantar como se nada tivesse
acontecido. E depois de tudo que a ouvi dizer no elevador, foi
impossível não ficar impressionado e admirado pela coragem dela,
ainda que morresse antes de admitir aquilo.
Sua força de vontade para enfrentar qualquer um sem se
esconder atrás do poder do pai me afetou, e como se estivesse
disposta a me surpreender ainda mais Anastácia  entrou pela sala com
uma pose relaxada de quem estava entre amigos e ignorou todos os
olhares arredios que recebeu. Um a um, os 12 homens, que
estavam igualmente vestidos de jaleco branco e sentados

relaxadamente ao redor de uma longa mesa retangular de madeira
pura, a cumprimentaram e em seguida, todos aqueles olhares
recaíram sobre mim, que me mantinha ao lado dela.
— Senhorita Stelle , não podemos permitir a entrada de
estranhos nesta sala. Seu projeto é secreto. — Um deles disse.
— Senhor Jordan, não acha que eu traria comigo alguém que
roubaria meu projeto, não é mesmo? — O homem me sondou dos
pés à cabeça e comprimiu os lábios.
— Acho que a senhorita é muito jovem para saber o que lhe
convém.
— Pois eu discordo. Creio que o senhor se esqueceu que
pessoas como eu, herdeiras de todo um conglomerado, precisam de
um guarda-costas 24 horas por dia. Ele vai aonde eu vou. Tem
alguma oposição? — disse serena e uniu as mãos em frente ao
vestido.
Bem sabia que aquela afirmação era pura mentira. Anastácia 
me jogaria do terraço daquele prédio se tivesse a oportunidade,
ainda assim, vê-la mentir para defender minha posição ao seu lado
fez com que certo prazer me atingisse.
— Sendo assim, acho que ele será de extrema necessidade,
não concorda Jordan? — Outro homem, o único que observava
Anastácia  com um semblante tranquilo no rosto, meneou um aceno em
direção a ela, que retribuiu. Ao que tudo indicava, não eram todos
que a detestavam ali dentro.
— Bem, então vamos começar. Não temos tempo para
perder. — Ela caminhou até o meio da mesa e pegou uma pasta
mostarda disposta sobre ela, assim como um controle remoto que
estava ao seu lado.
Mantive-me parado há um metro de distância dela enquanto
a observava apontar o controle para a parede. Subitamente, uma
tela branca e muito larga desceu por ela e slides começaram a ser
apresentados com todo tipo de números que nem em duas vidas eu
entenderia.
Anastácia  passou a próxima hora explicando seu projeto com
uma determinação invejável. Ali, diante daqueles homens, eu mal a
reconhecia. Ela falava com uma propriedade absurda. Nem sequer

parecia a mesma jovem de 23 anos que roubou minha moto e jogou
areia na minha cabeça. Não, pelo contrário, diria que aquela versão
de Anastácia , palestrando diante de mim, tinha a alma de uma
cientista.
Ela apontava para a tela em euforia, se movimentava mais a
cada segundo, empolgada com o desfecho da apresentação que até
agora eu não tinha entendido. O vestido branco marcava a curva
dos seios empinados, passando pela cintura desenhada até se
acentuar no quadril, revelando uma bunda redonda que precisei de
muito esforço para desviar o olhar. O que não era o caso daqueles
velhos tarados. Alguns deles a observavam com visível interesse.
Uma vontade súbita de arrancar os olhos dos malditos me atingiu.
Alguns minutos depois, Anastácia  finalizou a apresentação e o
tal Jordan ergueu a mão no instante em que ela fechou a boca.
— Diga-me, senhorita Stelle , pretende torrar o dinheiro do
seu pai e o nosso em um projeto como este apenas por luxo, ou de
fato acredita que grandes empresas terão interesse em comprá-lo?
— Fechei os punhos quando vi Anastácia  trincar o maxilar, e torci para
que ela soltasse um dos palavrões que parecia tão acostumada a
praguejar. Ia ser incrível ver a cara do filho da puta se ela o
mandasse a merda ali mesmo.
Mas diferente do que imaginei que faria, a única reação de
Anastácia  foi sorrir. Pelo visto, o sarcasmo também era uma
configuração de fábrica da garota.
— Ora, doutor Jordan, não é porque o senhor é da época de
Noé que não conseguiria entender os tempos atuais. — Alguns dos
cientistas levaram a mão à boca, contendo uma risada. O rosto de
Jordan adquiriu um tom avermelhado como o de um tomate maduro.
— O que proponho não é um projeto simples. O A.S será capaz de
ampliar um raio de espectro magnético com energia dirigida para
identificar qualquer ameaça, interna ou externa. Criando uma rede
de defesa que impossibilitará qualquer ataque contra sistemas,
radares e outros sensores. Se o senhor ainda se lembra, há um
número significativo de guerras eletrônicas que nosso país precisa
enfrentar. Acha mesmo que ninguém terá interesse nesta criação?

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