Capítulo 14

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Anastácia Stelle

Passei o restante do dia dentro do quarto. Sentia-me exausta,
física e emocionalmente, e ainda não podia acreditar em tudo o que
tinha acontecido.
Então era ele...
O cavaleiro que me salvava toda noite. Um misto de
vergonha e gratidão me preencheu. Ainda podia sentir seus braços
ao meu redor, protegendo-me com carinho. Um carinho que eu não
esperava, principalmente depois do beijo de ontem.
Um toc-toc leve chamou minha atenção.
— Posso entrar? — Ruth disse da porta.
— Sim, claro — falei, deitada em minha cama.
Ruth entrou logo em seguida, trazendo o almoço para mim. O
cheiro delicioso da comida de Judith preencheu o cômodo e meu
estômago roncou alto.
— Muito obrigada, Ruth — agradeci quando a mulher pousou
o almoço na mesinha do quarto.
— Fiquei sabendo que resolveu voltar a dançar. — Ela
pigarreou e um brilho intenso preencheu seus olhos escuros.
— Sim. — Sorri de lado com a lembrança que me trazia uma
sensação de liberdade indescritível. — Acho que no fim das contas,
não vai demorar muito para que a professora volte.
— Estou particularmente feliz com esta notícia, senhorita
Stelle. — Ela não me olhou nos olhos, mas notei o tom de voz baixo
e emocionado que Ruth, sempre tão durona, tentava esconder.
— Obrigada, Ruth, por nunca desistir de mim. — Suspirei.
— Coma tudo, senhorita e fique bem. Já é agradecimento o
suficiente. — E saiu sem voltar a me encarar. Sorri para a travessa

tampada sobre a mesa e pela primeira vez senti que começava a
ver um pouco de luz na escuridão que me cercava há três anos.
Tentei ler um livro depois que terminei o almoço, mas não
conseguia me concentrar. Bastava começar a ler para que meus
olhos se perdessem e minha mente voltasse ao exato momento em
que fui envolvida no abraço mais gostoso do mundo. Lobo tinha
cheiro de perigo, e gosto de perdição. Uma combinação que me
deixava quente a ponto de estremecer.
Abandonei o livro e fechei os olhos, desejando voltar àquele
instante, onde suas mãos firmes me envolviam como se eu
pertencesse a ele. Sua voz baixa sussurrando em meu ouvido ainda
me fazia arrepiar.
Naquela manhã ele não se importou com a etiqueta que tanto
zelava, pouco ligou para as regras que o afastavam de mim. Mal
raciocinei quando a música parou. Tudo que consegui fazer foi cair
no chão, fraca pela descarga de emoções que corria pelas minhas
veias. Minha mente estava confusa, obscura, meu coração doía
tanto que cogitei estar sofrendo um enfarto e quando imaginei que,
mais uma vez teria que lidar com aquilo sozinha, para minha
surpresa, Lobo entrou na minha dor. Ele tocou minhas feridas com
suas mãos e mesmo que ainda doessem, senti pela primeira vez
que não estava completamente sozinha com toda aquela aflição.
Soltei o ar entre os lábios, tentando ignorar o palpitar
estranho no meu peito. Um calorzinho insistente que me deixava
eufórica.
Meu celular tocou quando recebi uma mensagem. Alcancei o
aparelho e desbloqueei a tela. Comprimi os olhos quando vi que era
uma mensagem da tia Claire.
Não se esqueça que temos um jantar hoje, querida. Estou
levando um presente sensacional. Seu pai pediu a Ruth que
fizesse sua torta de maçã favorita, e a minha também :).

Sorri para o celular. Podia imaginar minha tia tentando
convencer Ruth a fazer aquela torta que, cá entre nós, era divina.
Nem conseguia me lembrar quando foi a última vez que
jantamos todos juntos. O que será que deu neles? O jantar já estava
marcado, mas torta de maçã e presentes surpresa?
Estreitei os olhos, já imaginando o que poderia ter
acontecido. A bocuda da Ruth deve ter contado a eles sobre os
episódios de terror noturno e da minha pequena ida à academia.
Ainda assim, não consegui evitar a faísca de alegria que
explodiu em meu peito. Papai estaria em casa de noite, disposto a
passar um tempo comigo. Revirei-me nos lençóis de seda e parei
olhando para o teto. Talvez fosse a chance perfeita para, quem
sabe, conseguir autorização para ir à festa de Carla no final de
semana. Aquilo seria perfeito.
O não eu já tinha, bastava agora buscar o sim.
A noite caiu e uma corrente fria se abateu sobre a casa.
Escolhi um vestido felpudo rosa claro e curto, mas bem quentinho.
Fiz alguns cachos nos cabelos e arrisquei marcar os olhos com um
sombreado preto que os destacavam. Corri até o espelho quando
terminei e gostei muito do que vi.
Estaria me enganando se dissesse que estava me arrumando
para jantar com meu pai e minha tia.
Na verdade, estava pensando nele. Ainda que soubesse que
aquilo era uma loucura.
Uma sensação estranha me incomodou quando me virei para
a porta prestes a sair e fiquei me perguntando onde estavam as tais
borboletas no estômago que sempre ouvia falar quando as
mocinhas ficavam nervosas nos livros de romance. O nervosismo
que estava sentindo mais parecia com uma dor de barriga, isso sim.
Desci as escadas olhando para todos os cantos e murchei
um pouco quando não vi Lobo por ali.

SOB A Proteção do Lobo Where stories live. Discover now