Capítulo 10

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Anastácia Stelle

A luz do sol passava pela janela do carro e tocava minhas
pernas desnudas com um carinho quentinho. Meus pensamentos
vagavam enquanto encarava a paisagem passando rápido através
da janela.
Lobo dirigia em silêncio e eu mal conseguia olhar em sua
direção. Ele tinha mesmo batido em Foster por minha causa?
O pensamento fazia meu peito arder de um jeito
inconveniente, incômodo. Ninguém nunca tinha me defendido de
nenhum dos ataques verbais que já sofri naquela empresa. As raras
pessoas que já presenciaram algo jamais se importaram e eu
também nunca fiz questão de ser protegida contra aquilo, afinal,
sentia-me forte o suficiente para lutar contra aqueles idiotas com
mais do que alguns insultos, com projetos tão incríveis que nem
mesmo o mais odioso entre eles poderia rejeitar. Mas Lobo me fez
experimentar algo que nunca tinha sentido antes.
Quando estávamos na sala apresentando a continuação do
projeto, vez ou outra um daqueles idiotas me fazia um novo insulto
disfarçado de brincadeira. Já estava acostumada com aquilo e
mesmo diante das idiotices que diziam, conseguia manter minha
postura e sempre os respondia com sarcasmo mais puro que
poderia existir, mas Lobo não parecia satisfeito com aquele meu
jeito de lidar com a situação.
Toda vez que um dos cientistas abria a boca, ele fechava os
punhos até que veias grossas destacassem o dorso de sua mão e
os encarava com uma feição de quem arrancaria a cabeça deles
ainda naquela reunião. O que me deixou em um misto de
preocupação e surpresa.

O trabalho de Lobo era me proteger contra ameaças que
colocassem minha vida em risco, além de me irritar constantemente,
mas em nenhum momento ele precisaria proteger minha integridade
moral, mas foi exatamente o que ele fez.
Ainda não conseguia acreditar que ele bateu mesmo no
Foster. Santo Deus, como eu queria ter visto a cena. Sorri para a
janela, imaginando o quanto aquele babaca deve ter ficado irritado.
Mesmo que tivesse pedido ao meu guarda-costas para
manter as mãozinhas longe de qualquer encrenca, estava radiante
por ter sido defendida por ele. E era exatamente por isto que não
conseguia encará-lo. Uma palpitação despontava em meu peito só
pela ideia de ficar diante aqueles olhos singulares e chamativos.
Lobo estava revirando meus sentimentos e eu não gostava nada
daquilo. Na verdade, estava apavorada.
Chegamos à Casa da Colina um tempo depois e fomos
recebidos pelos dois seguranças responsáveis pela entrada e saída
de veículos do local.
Um a um, todos os guardas estacionaram os carros no
espaço estrategicamente reservado para eles. Um ponto que ficava
exatamente entre a casa e a saída principal. Aquilo facilitava uma
fuga emergencial, caso necessitássemos de uma.
Assim que paramos, Shaw se adiantou e desceu do carro,
abrindo a porta para mim.
— Tenha um excelente dia, senhorita Stelle . — Ele desejou e
foi se encontrar com Lyon e Ray.
Apressei-me a sair das vistas do homem que pretendia evitar,
mas por algum motivo, Lobo desceu do veículo e parou diante de
mim, impedindo a minha passagem. Todos os sentimentos
conflituosos que eu tentei evitar durante a viagem retornaram com
força no instante em que ele tirou os óculos escuros e sondou meu
rosto com calma. Os olhos expressivos brilhavam como duas
lanternas com luzes em tonalidades diferentes. Então, tive a
impressão de que por um mísero segundo ele desceu os olhos para
minha boca, mas aconteceu tão rápido que não saberia dizer se foi
real ou só uma alucinação da minha mente criativa.

— A senhorita não tomou café na empresa, como disse que
faria — ele relembrou. O tom de voz forte surgiu baixo, profundo.
— Eu... — Pisquei. — Não consigo comer quando estou
prestes a entrar em uma das reuniões. Fico tão ansiosa que nem
mesmo água consigo beber.
— Então deveria comer algo imediatamente após sair de lá.
— Ele inclinou a cabeça de lado e me dei conta de que quando
estava assim, conversando com Lobo tão de perto, sempre ficava
com a cabeça muito erguida, como se estivesse olhando para o céu.
Ele era muito alto e, daquele ângulo, sua boca ficava ainda mais
chamativa. De repente não consegui desviar os olhos dela. —
Aquele lugar sugou metade da sua energia, se não se alimentar,
acabará passando mal.
— Vou comer. — Ah, como eu queria devorá-lo ali mesmo. —
Porcaria — xinguei alto quando meus percebi para onde meus
pensamentos estavam me levando e vi Lobo erguer as
sobrancelhas. — NÃO, não é você a porcaria.
— Fico bem satisfeito em saber. — Ele estreitou os lábios,
como se segurasse um sorriso.
— De fato, devo estar com fome e confusa. — Passei a mão
no rosto. — Obrigada pela ajuda hoje. — Seus olhos desceram para
os meus, lançando-me no inferno que era acompanhar suas íris
bicolores sondando cada pedacinho da minha face e esquentando
partes em meu corpo que, até o momento, estavam bem quietinhas.
— Sei que pedi que não interferisse, mas fiquei feliz que o tenha
feito.
— Senhorita Stelle ... — Ele me interrompeu. — Não fiz
absolutamente nada além do que me é exigido como seu guarda-
costas. Ainda que queira arduamente se livrar de mim, é meu
trabalho defendê-la, de tudo e de todos, principalmente dos babacas
que não podem se aproximar fisicamente, mas tentam da pior
forma... emocionalmente. — Ele completou e meu coração pulou um
pouco mais com a seriedade e compromisso de suas palavras.
— Ainda quero me livrar de você. — Comprimi os olhos e o
encarei. — Mas não vou atormentá-lo pelo resto do dia. Pense nisto,
é uma oferta de paz — brinquei.

SOB A Proteção do Lobo Where stories live. Discover now