Capítulo 12

2 1 0
                                    

O dia que eu tanto aguardava chegou.

A tempestade começou na madrugada. O vento uivava, o trovão rugia e a chuva castigava as janelas da casa.

Coloquei o meu ''Look para dias frios e chuvosos cuja temperatura não ultrapassa os 20ºC'': Botina e calças jeans preta, moletom amarelo-mostarda bem folgado e um pingente de água-marinha.

Saí de casa uma hora antes; me perguntei se o Paçoquinha estava quentinho na casa da moça da lojinha de ração; peguei o metrô lotado (e muito molhado, por sinal), até chegar no portão do campus.

Carregando a mochila a frente do corpo, vou descendo a rua. Seguro meu guarda-chuva com força para que ele não voe com o vento. Pesadas gotas colidem contra a lona.

Passo a catraca, cumprimento o Seu João e desço as escadarias com todo o cuidado do mundo.

Meus pés chapinam nas poças de água. As copas das árvores balançam, suas folhas farfalham e algumas até caem, rodopiando na ventania.

Antes de adentrar no prédio praticamente vazio, dou uma olhada no céu branco-perolado, inspiro o cheiro do ar úmido e fecho o guarda-chuva.

A luz branca ilumina o hall de entrada. Meus passos ecoam sob o piso linóleo, enquanto caminho até os elevadores.

Aperto o botão e espero. ''O cenário tá ok. O clima tá ok. Agora é contigo, Clarice''.

A porta de metal se arrasta com um ruído surdo. Entro no elevador e desço no sétimo andar. São 6:45.

A cafeteria ainda não abriu, o que é uma pena. O dia está perfeito para tomar chá de limão ou de gengibre com mel.

Ando pelo corredor mal iluminado, até chegar na ''sala de convivência'', que se resume em: balcões acoplados abaixo da janela, banquetas e uma mesa circular no meio do recinto.

Permaneço parada na entrada, com a mochila nas costas e a sombrinha na mão. Fecho os olhos e aguço minha audição.

As roldanas e cabos que sustentam o elevador chiam dentro do poço, à minha direita. Suas portas abrem, fecham e a máquina sobe um... Click... dois... Click... três. Abre. Fecha. Parou.

Vozes indistintas ecoam pela escada de emergência. Risadinhas e cumprimentos, creio eu.

Um trovão rugiu no céu.

Abro os olhos.

Ando lenta e silenciosamente até a quinta banqueta. Viro para o corredor mal iluminado. Ninguém.

Puxo o banco e me sento, pousando a mala na carteira ao lado e o guarda-chuva pendurado no encosto do banco.

Abro uma fresta da janela. O suficiente para que o ar circule e que as gotículas não molhem a bancada.

Ponho as mãos no colo e relaxo os ombros. Meus pés pairam a poucos centímetros do chão. Inspiro fundo.

O cheiro de produtos químicos impregna o ar timidamente, algo semelhante a erva doce e álcool, se espirala, flui através das escadas e se mistura com o aroma da chuva que irrompe da janela entreaberta.

Alguém sobe pelo elevador.

A luz do corredor acende e surge o som da porta gradeada da cafeteria sendo aberta. Tilintar de chaves. Cliques de interruptores ligados.

Reflexos frágeis aparecem na superfície vítrea. Um senhor e dois rapazes arrumam as cadeiras e mesas, para que os clientes possam ficar à vontade.

Volto a minha atenção ao mundo lá fora.

Clarice, que não é, LispectorDove le storie prendono vita. Scoprilo ora