"Ponha-me como um selo sobre
o seu coração;
como um selo sobre o seu braço;
pois o amor é tão forte quanto a morte
e o ciúme é tão inflexível
quanto a sepultura.
Suas brasas são fogo ardente,
são labaredas do Senhor. Nem muitas águas conseguem
apagar o amor;
os rios não conseguem levá-lo
na correnteza.
Se alguém oferecesse todas as riquezas
da sua casa para adquirir o amor,
seria totalmente desprezado."Cânticos 8:6-7
...
Um mês depois...
Casa do padre.
Mais um dia chega e com ele a certeza de que eu não estava apaixonado por Juliette.
Paixões são passageiras. É aquela admiração inicial e aquele frio na barriga, mas tudo isso passa. Mas o quê sinto por ela nem passa, nem acalma e a distância só multiplica.
Ela não me procurou mais, não veio as missas que celebro e continua dando aulas no salão paroquial, mas não tem posto os pés na igreja.
Do trabalho para casa, assim é a sua rotina e disso eu sei de cor. Quantas e quantas vezes já não a te segui até que ela estivesse finalmente em casa.
Estou sendo um fraco e não cumpri o quê ela me pediu. Não a esqueço nem quando estou dormindo, inclusive tenho feito amor com ela todas as noites nos meus sonhos.
Quando fecho os olhos lembro do seu cheiro e isso é tão reconfortante quanto beber água quando se tem muita sede.
- até quando vai ficar assim Rodolffo?- Meu pai adorava chamar a minha atenção. - tome uma atitude.
- não tem atitude a ser tomada pai.
- estou indo embora semana que vem... Não tem como adiar mais minha volta, mas quero que volte comigo.
- não vou voltar com o senhor.
- não tem nada que te prenda aqui. Entregue o posto e volte para casa.
- não posso...
- se essa moça não te quis, tudo bem... Outra haverá de querer.
- pai... Eu sou um padre.
- que padre faz o quê anda fazendo nos últimos tempos? Vai deixar essa moça falada, isso é certo. Pare de segui-la. Se quer ser padre que seja, mas isso está muito ridículo.
- é a única forma que tenho de vê-la.
- conforme-se em não vê-la. É o melhor.
Meu pai estava certo, mas eu não aceitava.
...
Ateliê de costura.
- boa tarde... - falei animada.
- Juliette... Tem andado tão sumida. - Camila me deu um abraço.
- pouco tempo... Tenho ajudado mainha nos serviços dela e estou preparando os alunos para as primeiras provas.
- uma professora dedicada. Me mata de orgulho, visse?
Sorri para Camila e ela chegou mais junto a mim.
- olha o quê ganhei. - ela disse mostrando o lindo anel no seu dedo.
- que lindo... Estou feliz por você. Parabéns.
- obrigada querida. E você como está?
- estou superando, carregando, mas acima de tudo estou com fé no esquecimento. Tenho conversado muito com Deus e meu coração está mais tranquilo.
- já entendeu o quê sente?
- sim... Entendi. - suspirei. - no início eu pensei que fosse algo fantasioso ou ilusório. Mas hoje eu sei que não é isso.
- e o quê é?
- eu o amo. Um amor impossível, mas é amor. Meu primeiro amor de verdade.
Camila segurou minhas mãos de forma firme.
- se ele sentir o mesmo vocês podem viver isso.
- não vou me iludir Camila. - suspirei . - Estou quase atrasada... Preciso ir. Depois nos falamos.
Fui em direção ao salão paroquial e lá todos me esperavam ansiosos para mais uma tarde de aulas de reforço.
Meus alunos eram incríveis e ao fim da aula fui arrumar o salão como sempre faço. Era uma rotina e rotinas precisam ser cumpridas.
Olhei pela janela e vi que vinha uma baita chuva e que talvez eu levasse um banho até chegar em casa.
Tentei terminar as coisas mais rápido, até notar a sua presença no salão paroquial.
Escorado em uma parede próximo a entrada e com as duas mãos no bolso, ele me olhava fixamente. Por quanto tempo ele estava ali, eu não sei, mas ele estava.
...
Depois que os alunos saíram eu entrei, inicialmente fiquei escondido, como quase sempre fazia, mas hoje resolvi me mostrar para ela.
"Eu ainda estou aqui"... "Eu ainda não esqueci"... "Eu ainda penso em você"... "Seu cheiro ainda permanece na minha memória"... "Ainda te quero tanto". Tudo isso eram coisas que eu poderia facilmente dizer para ela, mas talvez eu não dissesse por que de certo ela não me deixaria dizer.
Caminhei um pouco para estar mais próximo a ela.
- Juliette...
Depois de analisar o meu rosto, ela me disse:
- Rodolffo...
Era a primeira vez que ela me chamava apenas pelo meu nome e era tão inevitável não sorrir com aquilo.
...