estrelas em cicatrizes

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Ela estava deitada em seu peito. Sua mão acariciava sua pele, os dedos fazendo desenhos imaginários onde se ele se esforçasse bem poderia dizer que ela fez um H e um S. Se recuperavam de mais uma rodada, nunca parecia bom o suficiente. Queriam se devorar para além do normal. Ele descia os dedos pela linha da coluna, a pele macia, se arrepiando contra ele.

— Precisamos de uma árvore de natal. — ele falou com a voz rouca, a garganta seca, mas nenhum dos dois dispostos a se levantar para pegar água.

— Árvore? Para que árvore?

— Para montarmos aqui... vamos passar o natal aqui, não vamos? Moretti vai dar uma festa, mas prefiro mil vezes passar a noite feliz só com você.

Ele beijou o topo de sua cabeça, a apertando mais contra ele. Heloísa soltou uma risada nervosa, trêmula.

— Natal... nossa, fazem anos que eu não comemoro o natal.

Ele a olhou do jeito que dava.

— Não me diga que estava de plantão.

Ela riu sem jeito.

— Natal e Ano Novo.

— Tia Cotinha deve ter te matado.

— Vem, querida, vem abrir seu presente. As meninas já estão lá, você não quer ir?

Aquela não era sua família. Sua família era seu pai, e ele não estava. Olhava para aquela mulher simpática e queria poder ir, mas e se seu pai aparecesse na janela, e se ele voltasse?

— Não quero. — ela falou, cruzando os braços.

— Vamos, Helozinha. A tia fez rabanada e seu tio Sérgio comprou um presente lindo para você.

— Não precisava, meu pai vai trazer pra mim.

Cotinha sentou ao lado da menina que insistia em olhar pela janela por qualquer sinal de que o pai voltaria. Ela não tinha aceitado que ele estava internado, estava grave. A ideia de que seu irmão estava morrendo era avassaladora, mas se fosse ser sincera, sabia que ele já estava morto há muito tempo, e nem a presença da filha foi capaz de salvar.

— Helô...

A pré-adolescente colocou o rosto entre as mãos. Desabou em um choro inconsolável. Cotinha a abraçou com força, sentindo os olhos queimarem. Era o pai dela. Era o seu irmão.

— Por que todo mundo vai embora? — Heloísa perguntou com a voz abafada.

— Eu não vou, meu bem. Prometo.

— Vai cansar de mim como minha mãe cansou.

Stenio virou Heloísa na cama, chamando atenção dela. A delegada voltou das lembranças e forçou um sorriso, acariciando o rosto com a barba por fazer.

— Onde estava? — ele perguntou, sorrindo, acariciando a cintura nua.

— Em vidas passadas.

— Começou... — Stenio estava pronto para sair de cima dela, mas Heloísa o segurou pelos ombros.

— Não, não é isso. Era minha infância. — ela disse com a voz calma, traçando as clavículas dele com os dedos.

Stenio parou de sorrir, sabendo que esse era um tópico extremamente sensível e nunca abordado por ela. Ele sabia o básico, o breve, coisa que ela só contou quando estavam à beira de se casar a primeira vez e ela não queria colocar nome dos pais no convite.

— Sua mãe?

Stenio sentou e Heloísa se apoiou na cabeceira com ele. Puxou o lençol para ficar mais confortável. Sentiu a mão dele na sua, olhou nos olhos dele, cansada.

Chão de Giz Where stories live. Discover now