no mais, estou indo embora

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Stenio a tirou da delegacia depois de conseguir fazê-la se acalmar. Ele pegou sua bolsa, a carta do chão, e segurando a mão dela, saíram pelos fundos da delegacia. Como tinha deixado Heloísa na delegacia pela manhã, estavam com o carro dele. Depois de fechar a porta do carro para ela, deixou os olhos correrem pela carta que ela leu, sentindo o coração doer um bocado pensando na reação dela a essas palavras. 

Nenhuma menina deveria ler essas coisas da própria mãe. 

E no fundo ele sabia que foi a menina abandonada que essas palavras atingiram, e não a delegada de crimes virtuais. 

No carro, ele dirigia para outro lugar. Tinha certeza que ela não queria ir para casa, não iria querer explicar a Creusa agora o porque dos olhos inchados. Ele a conhecia bem o suficiente para saber que uma volta pela cidade poderia fazer a mente dela clarear as ideias jogadas ali. Quando chegaram na orla distante da praia, onde não tinham muitos quiosques, apenas uma extensão de areia branca e quente, Stenio parou o carro. 

— Vamos descer um pouco? — ele perguntou com carinho, segurando a mão dela. — Ou quer ficar aqui? 

Ela olhou o mar e suspirou. 

— Acho que andar pode me acalmar. 

— Ótimo... 

Stenio tirou o terno, deixando só a camisa azul claro, com os botões desfeitos e a manda dobrada. Heloísa prendeu o cabelo, segurava os saltos e esperava ele travar o carro. Stenio segurou a mão dela enquanto caminhavam até conseguirem sentir o mar no rosto. Sentaram na areia mesmo, pouco importando se sujaria. 

Ele a olhava com atenção. 

— Eu li a carta. — ele falou alto o suficiente para ultrapassar o barulho das ondas. 

— Eu não sabia que eu precisava tanto ler aquilo, e que iria doer tanto. — Heloísa começou, mexendo na areia, sentindo os olhos arderem. — Por anos eu imaginei como seria, eu realmente imaginei, receber uma ligação, uma mensagem, uma visita... qualquer coisa, eu imaginei. 

— Quem te enviou isso? 

— Ninguém, meu irmão veio trazer pessoalmente. — ela falou com certo desdém, mas logo suspirou, olhando para Stenio com pesar. — Ele não tem culpa do que ela fez, no fundo eu sei que só sinto inveja por ele ter tido o que eu não tive. 

— Seu irmão? Ele está no Rio então. 

— Está, com a esposa. Quer que eu a conheça. — ela soltou um riso irônico. — Como uma família feliz. 

— E ele? 

— Ele sente muito por tudo que eu passei, mas não acho que a opinião que tem sobre ela vai mudar. Ela foi uma santa para eles. 

— Na carta ela diz que pensava em você. 

— Mas que nunca teve espaço para mim nessa vida perfeita, eu era um erro, uma sobra. 

Stenio a abraçou pelos ombros, beijando seu rosto com carinho. Ele não conseguia imaginar tudo isso. O advogado teve a família perfeita, uma mãe amável e dedicada ao filho único, pai carinhoso, férias em família, tudo sempre tão estruturado, que era impossível sequer tentar imaginar o que era tudo isso que ela passou. O que ele sabia sim era que ela merecia tudo. Amor, família, férias perfeitas, uma casa grande com risada de criança, dos netos, o amor dos amigos. 

Ela não era um erro, nem sobra. 

— Você não é nada disso, Heloísa Sampaio. — ele olhou firme para ela, prendendo seus olhares. — Você é cada grão de areia, cada gota no oceano e cada estrela no céu. Você é uma pessoa incrível, uma mãe e avó perfeitas, a mulher da minha vida, uma amiga fiel, Helô... você é tudo que o universo tem de melhor. Não foi um erro e nem sobra, e eu sinto muito pela sua mãe, com essa alma rasa que ela tinha, por nunca ter sido capaz de enxergar o universo em você. 

Chão de Giz Tempat cerita menjadi hidup. Temukan sekarang