Olho Por Olho

Um Dia Pra Jamais Esquecer...

     Terminei de lavar meu prato e minha mãe me viu sair em direção a pequena mesa, que ficava ao lado da dispensa e pegar minha mochila.

     _ Já vai fazer suas tarefas, meu amor? Esqueceu que amanhã é sábado e você poderá fazer tudo no final da lida de amanhã? Seu pai tá todo feliz porque você tá indo ver ele trabalhar com o novo bicho que chegou. Ele disse que o touro é brabo que só.

    _ Isso é  verdade, mãe. Juro pra senhora que jamais iria montar num daqueles lá. O bicho parece ter raiva de todos os humanos que vê na frente dele. Só que amanhã eu tenho umas coisas da escola pra fazer e vou falar com o pai que não vou na lida depois do almoço.

     _ E o que é tão importante pra que você esqueça seus dias de folga, meu filho?

     " E agora meu Deus o que eu faço? Conto logo o que tá acontecendo, ou deixo pra lá e vejo se o filho do patrão vai mesmo fuxicar do meu nome? Acho melhor não dizer nada. Ele disse que ia jogar a gente na rua e o meu pai disse que vai começar a juntar dinheiro pro nosso pedaço de terra... "

      Esses pensamentos passaram na velocidade da luz pela mente do garoto. Por fim ele disse em resposta...

     _ Tem um negócio chamado HABITAT, mãe. É tipo um local onde a agente e os demais seres vivos vivem a vida toda. Eu e minha equipe ficamos de pesquisar os habitats aquáticos para um trabalho de Biologia, e nossa líder falou que iremos nos encontrar amanhã lá na grande cachoeira porque lá é cheio de vida aquática. 

     _ Eita, menino. isso parece ser mesmo bem difícil. Tenho tanto orgulho de você, Bruno. Benza Deus que um dia você seja alguém importante e consiga ter uma vida melhor que essa que a gente pode te dar. Fala com teu pai hoje sobre isso tudo. Se ele chiar deixa comigo que dobro aquela fera.

     _ Rsrsrsrs... O pai é tranquilo até demais, mãe. Esqueceu o que seu Jeremias vive falando? O Juca parece que nem sangue tem. Mais pode deixar que falo com ele assim que ele chegar.

     Assim que abriu a mochila e tirou os livros e cadernos é que o coração do pobre garoto voltou a bater normalmente. Mentir pra mãe e logo mais pro pai seria algo que nem mesmo ele sabia que iria virar uma rotina, porque com o passar dos meses, a coisa pro seu lado ia só piorar.

     O sábado raiou com o dia claro e ameno. Os 03 tomaram o café cedinho e pai e filho saíram pra lida. Bruno ficou pela fazenda fazendo uma coisa e outra, até que o patrão chegou perto dele e disse:

     _ Bom dia, garoto. Será que tem uma caneca d'água pro velho patrão do seu pai, Bruno? O garoto que já ia repreender o patrão do pai por chama-lo de garoto, sorriu. 

     Desde o primeiro dia que o velho Joel gravara o nome do garoto e acompanhava de perto a sua evolução na escola e também na lida da fazenda. Todos gostavam do garoto e ele tava cheio de planos para que quando ele crescesse fosse uma engrenagem importante na condução da empresa da família Medeiros Souto.

     _ Bom dia, Dr. Joel. Claro que tem água patrão.

     E assim que o garoto voltou com a água...

     _ Então já sou seu patrão? Não seria só lá no futuro?

     _ Desculpa, senhor... Só tô lhe chamando como os demais lhe chamam.

     _ Vamos combinar uma coisa, Bruno Almeida?

     _ O que seria, senhor?

     _ Quando a gente estiver sozinhos, será que você pode me chamar de Joel como todos os meus amigos?