Desabafo Cheio de Esperanças...

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     Uma semana. Levou apenas uma semana até que Bruno passasse a ocupar o outro lado da imensa cama do maldito... Ricardo Medeiros Souto, filho do seu protetor.

     Desde que presenciara o lento e estranho balançar de sua mãe num dos caibros da sala da pequena casa onde morava na Vila dos Empregados, que ele soube que sua vida estava praticamente encerrada. 

     O medo de falar a verdade, até porque não queria que os pais perdessem o pouco que haviam conquistado após tantos anos de trabalho duro, de nada adiantou.  Mas o medo rapidamente virou raiva e quando o próprio Ricardo confidenciou que ele tinha feito tudo aquilo porque temeu perdê-lo, ele - o medo - virou ódio mortal.

     Por toda a semana Justino e Marinalva falaram com o patrão sobre o filho dos amigos Juca e Dalva. Eles queriam criar o menino como se filho verdadeiro fosse. O velho Joel bateu o martelo e disse que todos que viviam na sua propriedade estavam sob sua proteção, e que o casal não se preocupasse que ele iria tomar todas as providências para que Bruno jamais sofresse pela falta do pai e principalmente da mãe. Apesar de não gostarem da ideia do garoto sob o mesmo teto do filho do patrão, nada puderam dizer sobre o que muitos já comentavam não só na Vila, mas por toda Brilhante.

     Joel deixou o garoto sob a responsabilidade do filho, Ricardo, até que este iniciasse o curso de Administração na Universidade Federal de Floresta Negra no início de fevereiro do próximo ano. Até lá, levar e buscar no colégio, bem como do curso de línguas -no centro de Brilhante - e muitas outras coisas mais, tudo ficaria sob sua responsabilidade. Ricardo vibrou com isso, e  Saulo começou a se sentir preterido no amor e atenção do velho amigo de infância. Bruno nada disse e apenas acatou a ordem que seu protetor deu ao filho em relação a ele.

     Os dois já não conversavam mais como no passado. Joel as vezes insistia com ele, o estimulava a falar, sorrir,  lhe deu até mais liberdade na Paraíso, só que o garoto parecia não ter mais vida ou vontade de nada. Bruno se retraiu cada vez mais e passou a não mais rir e mal queria estar na presença de outras pessoas. De aluno brilhante, passou a ser considerado um dos piores da turma. Ele parecia sempre desinteressado e ficou mais sério que de costume.  Só na presença de Jeremias e Marinalva é que ele parecia  ter mais vida.

     Na primeira noite que voltou a ser sodomizado pelo homem que acabara com sua família, enquanto seu amigo  continuava a bater fotos e as vezes filmava tudo, ele pareceu não mais se importar e o medo e vergonha que sempre sentia parecia ter evaporado de vez do seu corpo.

     Se por um lado viver na sede da fazenda, sob o mesmo teto que seu algoz, era algo louco e surreal - uma vez que ter a presença do homem que destruíra sua vida e da sua família era algo que lhe deixava mal, por outro lado foi algo providencial, porque logo, logo, Bruno descobriu onde Ricardo guardava todas as fotos e filmes onde ele aparecia. O desgraçado catalogava tudo pelo nome do garoto... E ele conseguiu ler pelo menos 12 nomes diferentes do dele. 

     O garoto passou a pegar os rolos com as fotos originais de cada cena onde aparecia juntamente com o desgraçado do filho do patrão. Ele só pegava o rolo original das cenas e substituía por outro vazio, depois que conseguia que um dos poucos amigos que tinha no Jesuíta lhe vendia um rolo novo. Nos quase 03 meses que antecederam a ida do desgraçado para a capital do estado Floresta Negra, ele substituiu não só onde ele aparecia, mas praticamente todos os outros onde as outras vítimas apareciam também.

     No dia em que o garoto foi passar todo um final de semana na casa dos amigos dos seus pais, Jeremias e Marinalva, ele contou tudo o que aconteceu para os " tios "...

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     _ Que pancada é essa perto do seu olho, Bruno? Foi a primeira coisa que Jeremias perguntou assim que terminou de abraçar o garoto.

     _ Foi lá na casa do patrão, tio. 

     Marinalva lhe deu um abraço e um beijo na testa e o olhou com atenção redobrada. Assim que falou...

     _ Você demora a vir aqui, Bruno, mas sempre que vem, tem no corpo um hematoma novo e diz pra gente que não lembra de nada, ou onde o conseguiu. Isso tá errado, meu filho. Tem alguma coisa errada nisso tudo. Será que dá pra você nos contar o que realmente acontecendo com você naquela casa, meu amor?

     Bruno encheu os olhos de lágrimas e baixou a cabeça. A mochila que levara com suas coisas caiu do ombro esquerdo e ele voltou a abraçar a tia...

     _ Eu não tô mais aguentando viver naquela casa, tia. Meu pai tá lá num quarto e sempre que vou lá, ele me olha como se me acusasse de alguma coisa, e eu sei que sou culpado dele tá daquele jeito.

     _ Você não teve culpa de nada não, filho. Falou Jeremias que começara a tratar o garoto como um filho que nunca teve.

     _ Eu tive sim, tio Jeremias. Se eu tivesse contado a verdade, minha mãe estaria via e meu pai não estaria entrevado numa cama pro resto da vida. 

     _ Do que você tá falando, Bruno? Que verdade é essa que você tá falando, menino? Perguntou Marinalva já temendo o que ele iria dizer em seguida.

     _ Naquela dia que meu pai e minha mãe foram atacados, eu tive a chance de dizer a verdade pro meu pai e eu não consegui. Eu só pensava que nossa vida tava começando a mudar pra melhor, e que a gente ia conseguir juntar dinheiro pra comprar um pedaço de terra. Só que eu me calei. O pai voltou da sede da fazenda e me perguntou se o desgraçado do filho do patrão e o amigo dele já tinham feito algo de ruim comigo e eu disse que não. Só que eu menti, tia. Ele e o amigo dele me faziam de mulher sempre que terminava a aula. Ele me dava beijos e me mandava tirar a roupa e sentar no colo dele. Isso no começo me deixava com muita vergonha. Depois que passei a recusar a fazer o que o seu Ricardo queria, ele passou a me bater e a me ameaçar com as fotos que o seu Saulo sempre tirava de nós 02 juntos. Se eu não tivesse negado pro meu pai sobre tudo isso, a gente teria ido embora e com certeza meu pai iria trabalhar em outra fazenda aqui da região de Brilhante. Minha vida naquela casa é um verdadeiro inferno. Eu tenho que dormir no quarto dele e ele só me deixa em paz depois que termina tudo. Ontem, eu disse que não queria mais fazer essas coisas que a gente fazia e ele me bateu e disse que se eu não continuar a ser dele, ele vai fazer comigo o mesmo que mandou fazer com o meu pai. 

     _ Meu Deus... Foi a única coisa que Marinalva fez antes de chorar copiosamente.

     _ Eu não quero mais voltar pra lá não, tio Jeremias. O senhor pode ficar comigo? O senhor pode me tirar de lá e tirar o meu pai também?

     _ Claro que posso, filho. Eu só vou descansar quando conseguir tirar você e o Juca daquela casa. Eu só não sei como vou fazer, mas que vou fazer algo... Ah, isso eu vou.

     _ Eu trouxe algo que pode ajudar, tio.

     _ E o que é, Bruno?

     _  Como lhe disse, ele faz as coisas comigo e o seu Saulo fica filmando e batendo fotos. Eu consegui pegar muitos rolos dos filmes que ele coloca na máquina que ele tem. E o garoto se agachou e abriu a mochila. Ele meteu a mão num bolso menor e tirou dele 02 filmes e entregou ao tio. Jeremias olhou pra mão estendida do garoto e rapidamente pegou os 02 rolos de filmes.

     _ Eu vou sair, mulher. 

     _ E você vai onde, homem de Deus?

     _ Vou falar com o patrão. Ele tem que saber o que tá acontecendo na casa dele e debaixo das barbas dele. Acomoda o menino e faz uma comida bem gostosa pra ele comer. 

     Jeremias saiu e logo os 02 o viram galopando pelo pasto indo em direção a sede da fazenda...

CONTINUA...

Olho Por OlhoWhere stories live. Discover now