10 - OBA, UM CORDÃO, QUANTAS PESSOAS EU POSSO ENFORCAR COM ISSO?

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Nós perdemos o fôlego, deixando uma exclamação no ar.

— Seu desejo de ser um lar unido para as pessoas não se concretizou. Sua cabeça se separou do seu corpo e os dois ficaram vagando pelo universo em direções opostas. Foi então que Zuno alcançou sua cabeça. E, como ele imaginava, as pessoas ali continuavam em guerra, querendo também se separar umas das outras. Sabendo do desejo de Ocheane de servir como lar, Zuno manteve a cabeça dela funcionando com sua própria força de vida. Querendo salvar as pessoas de si mesmas, ele separou o que restou de Ocheane em quatro partes, modelou quatro planetas e os deixou a certa distância uns dos outros, isolando-os. Foi assim que Zuno parou a guerra entre as pessoas. Então, depois de várias gerações, Zuno fez um imenso cordão de águas e realizou um encontro entre todo mundo ali e eles prometeram estar em paz para sempre. 

Por fim, Zuno deixou o cordão ali como um lembrete de que eles deveriam se ajudar e se tratar como se fossem um só planeta. 

— Eu acho que esse lembrete deu errado, treinador. — disse uma pessoa na multidão. 

— Do jeito que a gente é, quando pensa no cordão, nem passa pela cabeça a ideia de união. O que a gente pensa é: "oba, um cordão, quantas pessoas dá pra enforcar com isso?".

Eu abafei um riso com esse comentário, só que tinha gente que não estava achando graça de nada.

— Treinador, a gente entendeu, — disse uma voz seca. — mas o que isso tem a ver com a guerra de agora?

Amundos foi curto e grosso.

— As pessoas normais já sacaram a história toda. 

Antes que você pense algo, eu já saquei, tá bom?

— Nós estamos em guerra porque estávamos desunidos mesmo antes de nos tornarmos planetas. Mas muitos acreditam na união por causa do oceano que nos liga. Talvez nós possamos estar juntos de novo... — ele deixou as palavras flutuarem no ar. — Mas, como eu disse, é só uma lenda. O comentário não foi engolido com sucesso por Patagona.

— Lenda que muita gente acredita.

— Só os kyoches acreditam nisso, Pata. — Amundos minimizou. — O resto do universo nos critica por sermos um povo inocente, cheio de fé e supersticioso.

— Se perdermos essa fé, — Patagona rebateu. — não acreditaremos quando a verdade chegar.

Amundos pausou um segundo para digerir suas palavras.

— Eu entendo, Pata, mas, ainda assim, esse não é o ponto. Não obrigo ninguém a acreditar nem a desacreditar. Mas uma coisa é certa. Essa história nos traz uma lição. Por exemplo, o que vocês acham que estão fazendo aqui no campo de treinamento para jovens kyoches?

Houve um cochicho de dúvida, mas algumas vozes chegaram a uma conclusão.

— Ué, — disseram. — estamos nos preparando para a guerra.

— Errado. — corrigiu Amundos. — Estamos nos preparando para a paz. 

Anjo das ÁguasWhere stories live. Discover now