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  No caminho para o prédio velho em que sou obrigado a dormir todas as noites, eu sempre passo por dois parquinhos de crianças, que sempre estão cheios desses pequenos seres inocentes, correndo, pulando e se machucando, sempre com olhares alegres e sorrisos contagiantes, e acabo também passando por algumas lojas de roupas e utilidades.

  Normalmente, eu apenas ignoro quem estiver dentro dessas lojas mas, por causa daquela maldita alucinação, eu não consegui andar sem ficar olhando para os lados como algum drogado inquieto, e para o rosto de cada pessoa que eu encontrava, o que me fez parecer suspeito de algum crime até pra mim mesmo. Por alguns minutos, eu realmente achei que estava finalmente pirando.

  — Que merda foi aquela que aconteceu?

  Com relação a desculpa que eu dei sobre os remédios de dormir, era apenas uma mentira muito descarada só pra conseguir sair de "fininho" daquela situação. Não é mentira que às vezes eu volto a tomar esses medicamentos por causa de surtos periódicos que me provocam muita insônia, mas nunca tive esse tipo de sintoma.

  Sim, já tive uma overdose "silenciosa", após me auto medicar de maneira errônea. Passei dois dias dormindo, e quase uma semana sem forças até mesmo para comer. Mas nunca alucinei.

Deixa de ser mentiroso, Sun!

  Tá bom, tá bom, já alucinei algumas vezes sim. Mas eram só alguns vultos distorcidos, umas luzes coloridas e alguns buracos que apareciam no chão em lugares aleatórios. Essa foi a primeira vez que uma dessas alucinações me pareceu tão "viva".

  Eu conseguia ouvir a risada daquele homem. Até mesmo a sombra que a luz causava em corpo era visível. E aquela máscara... Que tipo de alucinação é essa?

  — Você está bem?

  Em meio aos meus pensamentos distraídos e enquanto eu ainda estava encarando todas as pessoas ao meu redor, uma mulher vestida de um jaleco branco se aproximou de mim, segurando meu ombro carinhosamente.

  — Estou. Só me deixe em paz.

  Diante da minha resposta seca, eu vi o olhar solidário dela se avivar ainda mais.

  — Eu sou médica, pra ser mais exata, sou psiquiatra. Esses daqui é o meu cartão.

  De um dos bolsos do jaleco, ela puxou um cartão de visitas azulado, com alguns detalhes verdes e amarelos, escrito: Dra. Giovana, uma mente boa é sinônimo de vida feliz.

  — Nesse momento, estou com um pouco de pressão, doutora.

  — Tudo bem. Também não estou com tempo sobrando hoje. Só pega o cartão, e quando se sentir à vontade, me manda uma mensagem.

  Eu não fiz nenhum movimento para pegar o cartão, e ao perceber isso ela abriu um dos bolsos da minha mochila, e o jogou lá dentro.

  — Posso saber seu nome, garoto?

  — É Sun. Adeus.

  Mais uma vez, eu não fui educado como deveria, e saí caminhando com pressa, buscando me afastar de qualquer outra pessoa que pudesse oferecer uma "ajuda".

  O que me deixa mais irritado, é a hipocrisia com que essas pessoas ajudam os outros. Principalmente porque todas elas oferecem uma abraço, e tentam cobrar um preço depois. Foi surpreendente que essa mulher não falou quanto custa cada consulta com ela, mas no máximo, ela deve passar o valor se eu mandar a mensagem.

Você que tá lendo isso, deve tá me achando uma pessoa razoavelmente idiota né? Mas lembra viu, foi a minha pele que sentiu todas as dores. E não a sua!

Entre Raposas e Assassinos: O Diário de SunWhere stories live. Discover now