Capítulo Dezesseis - Hannah

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- E a programação do mês que vem? - Beth me pergunta, mas não estou de fato prestando atenção. Minha cabeça está em outro lugar. - A gente pode colocar um pouco mais de rock indie. O que acha?

Olho ao redor e todas as pessoas ainda estão em seu horário de almoço. Estou sentada na habitual mesa que sento perto de Beth todos os dias, nesse mesmo horário. Meus olhos passam pelo relógio e ele informa que são 12h40.

- Hannah?! - ela chama minha atenção, mas sai como um zunido. Não quero conversar agora; será que ela não prestou atenção nisso?

Quando Frank saiu do jantar da minha casa, tia Holly fez questão de ir no minuto seguinte, e eu só queria uma resposta para a reação dela. Minha tia era louca, por acaso?!

- HANNAH?! - Beth grita, assim chamando a atenção de outras pessoas que estão no local.

- O que foi!?- pergunto de volta, em um tom um pouco mais baixo, mas não muito.

- Dá para prestar atenção em mim por um minuto?!

- Me desculpe - peço com sinceridade em minha voz. Não queria deixar Beth sem nenhuma resposta, mas, pela primeira vez, tudo o que eu queria, ao invés da rádio, era o conforto da minha casa.

- Tudo bem - ela suspira. - O que está acontecendo com você? - Mordo os lábios.

Beth ainda não sabe sobre o jantar e nem sei se devo mencioná-lo.

- Nada.

- Hannah, eu te conheço. Só não fiquei insistindo para me contar porque sei que você seria grossa. Daí tentei puxar outro assunto, mas você foi rude do mesmo jeito.

Respiro fundo.

Como Beth consegue ser tão... Observadora? Acho que essa é a palavra.

- Lembra-se do Music Zone? Quando Frank me levou pra sair? Foi durante nossa saída que eu recebi o telefonema e Frank acabou chamando um de seus melhores amigos que é cardiologista, um dos melhores de Londres. Depois que ela ficou ok, ela acabou convidando Frank para um jantar em casa.

A boca de Beth se abre em um perfeito "O" e eu fico feliz de ela não ter me interrompido novamente.

Eu continuo a contar a história até a parte do selinho e ele não ter dado as caras mais depois disso. E já se faz quatro dias.

- E você não tem a mínima ideia do por que tia Holly maneira? - Beth pergunta.

- Não, e isso está me irritando- desabafo. - Se olhar matasse, Frank já estaria morto em meia hora de jantar.

- E o selinho? - Beth pergunta e eu levanto uma sobrancelha, com medo do que ela esteja pensando.

- O que tem ele? - questiono, com medo da resposta.

- Você gostou?

- Não! - e eu nem paro para refletir sobre a pergunta; apenas jogo um "Não" rápido, simples e eficiente. Beth não parece acreditar. Eu reviro os olhos.

- Seu "não" muito rápido não me convenceu. Mas vou deixar assim. Você não precisa admitir isso para mim, só pra você mesma já está bom.

- Hmm... - penso numa resposta para isso, mas não encontro, sendo assim, resolvo ficar calada.

- Acho que você deveria tentar encontrar Holly para ela te explicaras atitudes dela.

- Eu já tentei ligar pra ela,- falo, novamente, irritada com minha tia - mas agora ela deu pra me ignorar.

Beth revira os olhos. Provavelmente, achando a atitude de Holly mais infantil do que a minha por não querer admitir em voz alta que eu, de fato, havia gostado daquela selinho.

- Você sabe onde ela mora. Vá até ela.

- Porque eu não pensei nisso antes? - pergunto, me sentindo uma idiota.

- Porque você estava ocupada demais pensando no selinho de Frank.

- Vá se ferrar, Beth!

Apesar de, pela manhã, eu ter ficado irritada com Beth, fiz o que ela me aconselhou e fui procurar por tia Holly, mas, dessa vez, sem usar o telefone.

Peguei três estações de metrô para chegar a sua casa e mais uma de trem.

Ela mora em uma cidade vizinha de Londres e é necessário ir de trem da estação King Cross para vê-la.

Me recuso a pegar todo esse caminho apenas para ela não atender a porta. Tia Holly iria me responder, querendo ou não.

Como hoje é quarta-feira, sei que Tia Holly está trabalhando em seu escritório. Ela é dona de uma loja de roupas, perfumes e todos os artigos femininos que você possa imaginar. E como ela está perto de abrir sua própria marca, ela tem ficado mais tempo fora de casa durante a semana. E isso seria perfeito, porque quando Holly chegasse, ela me encontraria esperando em sua varanda.

E sim, eu estou preparada para esperá-la por umas quatro horas se fosse necessário. Esse é o motivo de eu levar dois livros comigo.

Quando chego à casa de Tia Holly, sento-me na rede que ela deixa na balança para usar nos fins de semana. Apesar de a rede ter o intuito de servir à Holly, toda vez que venho aqui eu a uso.

A casa fica afastada do centro urbano. Tia Holly diz que ela já tem dor de cabeça demais quando ela vai para a cidade para trabalhar e que precisa de calma pelo menos em sua casa.

É um terreno grande e verde, a casa é de madeira e poderia facilmente ter sido retirada de um filme de fantasia. Tia Holly era uma das minhas pessoas favoritas, por isso. Minha mãe tinha um pouco de ciúmes de quando eu era pequena e preferia ficar horas na casa de Holly do que na minha própria.

Tia Holly e minha mãe, desde pequenas, se deram super bem, mas quando nasci, um ciúme excessivo entre as duas começou.

♥ ♥ ♥

"Não! Ela quer ficar mais tempo brincando aqui em casa, então deixe que ela fique. Largue de ser chata, Verônica".

"Ela precisa voltar pra casa; ela tem aula amanhã"

"Eu a levo", Holly tentava.

Meu pai apenas assistia à situação rindo.

"O que vocês não brigaram na infância, estão brigando agora. Me espere dois segundos para continuar a briga que eu vou me servir de um pouco de pipoca para assistir a isso".

♥ ♥ ♥

Dou risada com essas lembranças. Apesar de isso ter acontecido quando eu tinha uns dez a doze anos, me lembro de como meu pai se divertia com a situação toda.

Abro o livro que está em meu colo e começo a ler, esperando Holly chegar. Gosto de passar o tempo lendo, apesar de também, nunca deixar uma boa música de lado. E a coisa ficava ainda melhor quando os duas coisas estavam juntos.

Tia Holly chega duas horas depois que o sol já não estava mais no céu e quando eu já terminara um dos livros que eu havia trazido. Além de já ter escutado toda a playlist de música do meu celular umas duas vezes.

Ela olha pra mim com a testa franzida. Eu mando um sorrisinho de deboche pra ela depois de me ajeitar na rede para que pudéssemos nos encarar.

É hora de respostas, Tia Holly.


Para Sempre ElaOnde histórias criam vida. Descubra agora