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'Sophia Williams, venho por este meio informar que você foi uma dos dez candidatos escolhidos para a vaga de estagiária interna no hospital Seattle Grace.
Agradecia que comparecesse para uma visita guiada pelo hospital já este sábado, dia 22 de Janeiro pelas 09:00H, portanto evite qualquer tipo de atraso.                               Grato pela sua atenção, Logan Collins.'

Olhei preplexa para o e-mail e o facto de ter sido aceite num dos melhores hospitais de Seattle ainda parecia uma realidade distante.

Encontrava-me no quinto ano do curso de medicina e de momento precisava de dois anos obrigatórios de estágio e ao fim desse período, iria finalmente poder optar por uma especialização. O meu objetivo sempre foi formar-me em cirurgia geral e não ia deixar que nada se intrometesse no caminho que já venho a delinear há anos.

A primeira coisa que fiz depois destes dez minutos pasmada com a notícia, foi ligar à única pessoa que conseguia verdadeiramente considerar como amiga.

"Advinha." Disse assim que a Avery atendeu o telemóvel.

"Por algum motivo formei-me num curso de direito e não num de vidente." Sarcástica, tipicamente Avery.

"Acabei de receber um mail do Seattle Grace e neste momento estás a falar com a mais recente estagiária." Tive que afastar o telemóvel do meu ouvido com o grito que ela soltou.

"Todo o trabalho e noites passadas sem dormir, compensaram. Eu sabia que ias conseguir, parabéns!"

"De entre mais de duzentos candidatos, eu fui uma das dez escolhidas. Isto nem parece real, ainda estou à espera de um telefonema a dizer que foi um erro."

"Deixa de ser ridícula e começa de uma vez por todas a acreditar nas tuas capacidades. Quando é que começas?"

"Sábado vamos ter uma visita guiada, portanto deduzo que comece logo no dia seguinte."

"Na próxima segunda vou a Seattle porque tenho que me reunir com um cliente para preparar uma audiência no tribunal, então à noite quero estar contigo para celebrar."

"Espero que fiques cá por mais de vinte e quatro horas, tenho imensas saudades tuas."

"Vou tentar ao máximo, agora tenho que voltar ao trabalho. Vai-me mantendo atualizada, beijinhos."

A Avery tem sido a minha âncora desde os tempos do secundário até aos dias de hoje. Apesar de termos a mesma idade, a formação académica dela terminou aos vinte e um anos, porque o curso de direito apenas exige três anos de licenciatura, enquanto que o meu envolve pelo menos oito anos até poder exercer a profissão de forma autónoma.

Agora com vinte e três anos completados recentemente, sabia perfeitamente que tinha capacidades, mas nem sempre o consigo demonstrar devido à ansiedade e à constante falta de confiança.

.......

Naquela manhã de sábado estava mais inquieta que o normal, a verdade é que tinha dormido pouco menos de quatro horas, mas nada que uma boa dose de café não resolvesse.

Estava um dia de chuva como era normal nesta cinzenta cidade, mas honestamente não trocava Seattle por outro lugar. O inverno era sem dúvida a minha estação favorita, portanto não me importava de viver no estado de Washington.

Ao chegar ao hospital, dirigi-me à receção onde fui recebida por uma atenciosa senhora de meia idade que me encaminhou para uma sala no primeiro piso.

Já se encontravam cerca de seis pessoas na sala a falar descontraídamente e ainda que tivesse vontade, o meu pânico social impedia-me de iniciar uma conversa, por mais banal que a mesma pudesse ser.

Entretanto o resto do pessoal foi chegando e eu continuava num canto, agradecendo mentalmente por ninguém reparar o suficiente em mim para me abordar. 

Ás nove em ponto, a porta da sala abriu, revelando o homem mais alto e com o cabelo mais escuro que já tinha visto, o que entrava em contraste direto com os olhos cizentos. A sua expressão rigída era tudo o que precisava para saber que não devia pisar uma certa linha.

Ele estava vestido com uma farda azul escura e uma bata branca e não era necessário um génio para concluir que a pessoa à nossa frente era o chefe de departamento. Aos poucos as conversas foram cessando à medida que cada um reparou na mais recente companhia.

"Bom dia, o meu nome é Logan Collins, mas agradeço que me tratem por Dr. Collins. Esta é a minha adjunta Hellen Grey e vai estar encarregue por cinco de vocês, enquanto que eu estarei a supervisionar outros cinco." Quando ele mencionou o nome da Hellen, finalmente virei a minha atenção para a mulher que se encontrava ao seu lado, mas aparentemente estava demasiado absorvida pela sua presença para reparar nela.

A médica adjunta tinha sem dúvida uma expressão mais amigável e eu pedia interiormente para que ficasse atribuída à sua equipa.

"Bom dia a todos, atrás de vocês têm as vossas fardas e um conjunto de instrumentos que devem carregar com vocês todos os dias. Juntamente com o vosso kit, hão de ter um bilhete com a respetiva equipa." Disse ela apontando para umas mesas dispostas de forma simétrica e após alguns segundos encontrei a minha.

O meu estomâgo contorceu-se quando olhei para o meu bilhete que tinha estampado 'Equipa B - Logan Collins'.

Sabia não podia estar a sofrer por antecipação, mas algo naquele homem inquietava-me e não sei até que ponto é que iria estar à altura das suas exigências.

O grupo da Hellen foi levado para outra sala e o meu grupo constituído por três mulheres e dois homens, permaneceu na mesma sala.

Quando finalmente nos acomodámos nos nossos assentos, o doutor olhou para cada um de nós e sem muitos rodeios disse "Espero que tenham consciência da oportunidade única que é poder vestir uma farda neste hospital. Eu não estou aqui para ser vosso amigo, estou aqui para ser vosso mentor, portanto espero nada mais, nada menos que profissionalismo da vossa parte."

Após uma longa pausa, continuou "Não venham para cá com a mania que sabem tudo, observem, aprendam e executem tal como vos é ensinado. A faculdade ensina-vos a parte teórica, mas garanto-vos que na prática é completamente diferente."

Fomos obrigados a fazer uma breve apresentação e era como se estivesse de volta à escola, mas desta vez não deixei que a minha ansiedade se apodera-se de mim.

"Sou a Sophia Williams, tenho vinte e três anos e faço patinagem no gelo quando tenho tempo." Sentia os olhos da sala inteira postos em mim, mas o que mais me incomodou foi a forma como o doutor me fixou, era quase como se fosse capaz de me decifrar com base numa primeira impressão e eu odiei cada segundo.

Quando as apresentações finalmente terminaram, fomos levados a cada piso daquele hospital e eu não sabia como é que me iria orientar. Já tinha estado em muitos hospitais, mas este era sem dúvida o maior e o facto desta vir a ser praticamente a minha segunda casa durante os próximos meses deixava-me com um pequeno friozinho na barriga.

"O vosso turno começa amanhã ás sete, mas quero que aqui estejam meia hora antes para nos reunirmos e estabelecer-mos o plano do dia, por isso não se atrasem." Disse o doutor no fim da visita.

Durante estas duas horas ele mal nos tinha dirigido a palavra, mas de uma forma estranha achei isso confortante porque eu mesma era uma pessoa de poucas palavras.

Antes de me virar para o elevador e voltar para o piso 0, olhei uma última vez para aqueles olhos cinza e para minha grande surpresa ele já se encontrava a encarar-me. A troca de olhares não durou mais que três segundos, mas foi o suficiente para sentir a minha temperatura corporal subir.

Cirurgião CollinsWhere stories live. Discover now