Capítulo 1

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O café do copo do Starbucks estava balançando muito, e por um momento até achei que iria derrubar em cima de mim. Ah, ótimo, derrubar café na minha roupa é tudo o que eu preciso para tornar meu primeiro dia de aula o melhor de todos. Penso comigo mesma. Eu aperto o copo com um pouco mais de força para evitar que o café caia em cima de meu jeans. Minha mãe percebe meu nervosismo e segura minha mão.

            - Filha, é só uma escola nova. – Minha mãe diz após um longo suspiro. Ela costumava dizer que existiam dois extremos da vida: os otimistas e os pessimistas, naquele momento eu poderia dizer que eu estava mais pessimista do que qualquer pessoa no mundo.

            - Não é uma escola nova. – Protesto estupefata. – Achou mesmo que eu ia ficar feliz de mudar de escola logo no segundo trimestre? No segundo ano do ensino médio?

            - Lógico que não, mas não achei que fosse odiar tanto a ideia. Você sabe que não tivemos muita escolha.

            - Para mim tiveram sim. Um "sinto muito mas recuso essa oferta" estaria ótimo.

            Eu costumava ser uma garota legal, mas quando eu e minha família tivemos que nos mudar de Porto Alegre para São Paulo por causa do emprego de meu pai, as coisas ficaram péssimas para mim. Meu mau-humor foi de mal a pior, e eu não conseguia me animar com absolutamente nada. Por mais que estivéssemos a apenas duas semanas na cidade, eu queria estar de volta à nossa casa e cidade antiga. Minha mãe deu a ideia de eu começar a ir a um psicólogo, eu quase ri da cara dela, quer dizer, todas essas coisas da mudança estavam me deixando louca, mas eu já tinha 16 anos, não precisava de um psicólogo para me fazer me sentir melhor.

            - Querida, seu pai vai ganhar quase o dobro do salário, vai ficar muito melhor, você vai ver, assim que fizer novas amizades...

            - Opa, opa, mãe, odeio fazer novas amizades, já se perguntou por que eu tenho apenas uma amiga? – A interrompo. Isso não era mentira. Eu nunca fui aquele tipo de pessoa que conversa com todo mundo, eu espero as pessoas virem falar comigo primeiro.

            - Sim, e se ela for mesmo sua amiga não vai te largar assim tão facilmente.

            Reviro os olhos.

            - Meu deus Bia! Por que você sempre tem que odiar tudo? Pelo menos tente uma coisa diferente uma vez na vida! – ela bate com as mãos no volante.

            - Esse é o problema! Sempre que tento mudar alguma coisa dá errado! – Viro de lado para encará-la melhor.

            - Bia você está agindo como uma criança de sete anos.

            - Mãe! Se você estivesse no meu lugar certamente estaria agindo como eu!

            A minha relação com minha mãe sempre foi boa, eu nunca tive medo de dizer a ela o que penso sobre as coisas, e pela nossa diferença de idade não ser tão grande, ela me entendia. Mas com a mudança e tudo o que estava acontecendo nos últimos meses, acabei me afastando dela, mais por raiva do que por outra coisa.

            Ela para no farol vermelho e suspira, como se estivesse pensando em alguma coisa.

            - Ok. – Ela diz com uma expressão indecifrável no rosto. – Vamos fazer assim: prometa para mim que vai tentar, pelo menos um mês, se eu ver que você realmente não se adaptou, e que está realmente tão infeliz quanto diz que está, eu vou pensar no fato de você ir morar com sua tia.

            Voltar para Porto Alegre, pelo menos para terminar o ano lá parecia ser uma boa ideia para mim, por isso sorrio e abraço minha mãe.

            - Obrigada, obrigada, obrigada! Te amo. - Digo enquanto a abraço. Por um instante quase esqueço do café em minhas mãos, que minutos antes eu estava com tanto medo de derrubar, por isso me obrigo a me acalmar, se eu quisesse voltar para Porto Alegre ainda teria que enfrentar um longo mês em São Paulo.

            Minha mãe ergue o indicador, como se quisesse permissão para falar.

            - Mas você tem que me prometer que vai tentar se adaptar, e além disso, não sabemos nem se sua tia vai deixar.

            - Ta, eu prometo. – Digo convencida.

Minha mãe para o carro em frente da escola. Observo a minha nova escola através da janela do carro. Aparentemente ela era grande, tinha um gramado na entrada com algumas árvores, e até parecia agradável, alguns alunos conversavam em rodinhas e por alguma razão isso me causou um arrepio instantâneo, os muros da escola eram pintados de bege e o letreiro com o nome da escola era grande o suficiente para alguém à quilômetros de distância enxergar. Olho para minha mãe, que estava inclinada do meu lado e parecia ocupada demais analisando a escola assim como eu. Encaro o horizonte e não digo nada, sem vontade de sair do carro, ela suspira antes de dizer:

            - Quer que eu desça com você?

            Nego com a cabeça.

            - Eu me viro. – Respondo.

            - Então tudo bem. – Ela dá um sorriso fraco. Despeço-me dela e abro a porta do carro, saio devagar, olhando para a entrada do colégio que já estava ficando lotada. Antes de eu fechar a porta escuto minha mãe dizer – Ei filha. – Olho para ela para encará-la seriamente. – Tente se enturmar. – Aceno sutilmente com a cabeça e fecho a porta do carro.

            Eu não sabia exatamente o que poderia acontecer naquele dia, mas de uma coisa eu sabia: se enturmar não estava na lista. Não se isso dependesse de mim, mas mesmo com tantas dúvidas e motivos para não ir para escola no meu primeiro dia de aula, eu fui mesmo assim.

Clichê AmericanoWhere stories live. Discover now