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— Tá aí uma coisa que nenhuma de nós imaginávamos — comentou Anahí, abraçando os joelhos. — Passaremos o último Halloween, antes da faculdade, em uma cerimônia religiosa.

  Jaci tirou os olhos do tênis que estava tentando calçar e ergueu-os para cima. Horas antes, ela tinha encontrado as irmãs no corredor dos quartos, e as quatro concordaram em se arrumar no quarto dela; agora, o recinto era uma confusão de roupas espalhadas e sutiãs jogados por cima da cama, além de palhetas de maquiagem e batons de diversas cores que Kaolin havia trazido dentro de uma maleta, mas que agora estavam ocupando quase todo o chão.

— Bem, não é apenas uma cerimônia religiosa — disse Jaci, terminando de amarrar os cadarços e afastando os pés para analisar a simetria entre ambos os lados. — É uma cerimônia religiosa em um mundo de magia. Quantas pessoas podem falar isso além de nós, não é mesmo? — completou, virando-se de lado para enxergar seu reflexo no espelho.

— Jaci Fernandes — o tom de Kaolin era incrédulo. Ela estava sentada no chão, as costas apoiadas na lateral da cama, esforçando-se há trinta minutos para pôr cílios postiços. Seus lábios grossos e delineados estavam pintados de uma cor muito escura. — Diga para mim que essa não é a roupa que você vai usar, porque se for, a partir desse momento, você não é a mais a minha irmã.

  Jaci analisou novamente a sua imagem refletida; os cabelos louros e ondulados que ela já havia desistido de arrumar e o vestido branco de alcinha que ia até os joelhos, em contraste com os tênis vermelhos e surrados. 

  Mais cedo, ao voltar de sua pequena missão, depois de abrir a porta do quarto com o ombro enquanto carregava alguns livros que havia emprestado da biblioteca, encontrou uma mala aberta em cima da cama e, sobre a mala, um bilhete rabiscado com uma caligrafia fina, assinado do jeito mais familiar possível;

Jaci,

Hoje de manhã passei em Belém e trouxe todas as roupas e maquiagens que achei que você e suas irmãs fossem precisar; aqui estão as suas. Acrescentei seus livros preferidos na mala para que você não ficasse com tanta saudade da sua coleção, apesar de eu não ter conseguido encaixar todos os exemplares da Clarice Lispector entre as roupas.

Passarei o dia inteiro na Sede da Ordem, mas nos veremos quando a noite cair, antes da cerimônia.

Já sinto saudades.

Com amor,

Mair.

  Ao abrir a mala, sentiu-se aliviada quando encontrou todas as suas peças de roupas pacientemente dobradas e, como Mair havia prometido, volumes de diversos autores organizados entre os tecidos. O Diário de Anne Frank, O Caçador de Pipas e outros, além do seu livro preferido, A Hora da Estrela de Clarice Lispector, envolvido pelo seu vestido favorito, o branco que ela escolhera para ir à cerimônia.

  Jaci piscou.

— O quê? — balançou a cabeça. — O conjunto está muito estranho?

— Onde está o glamour? O brilho? — Kaolin levantou-se, apenas um dos olhos com cílio postiço, e tocou no ombro da irmã. — Você está indo para uma festa, não para um passeio no parque — franziu o nariz, soltando um ruído encabulado. — Esse estilo seria estranho até mesmo para passear no parque...

— Kaolin, nós já tentamos explicar para você que o traje é semiformal — retrucou Potira do outro lado do quarto, vestindo uma camiseta e uma saia brilhante. — Não formal-demais-como-se-estivéssemos-a-caminho-da-premiação-do-Oscar.

  Kaolin revirou os olhos.

— Claro que não estamos indo para a premiação do Oscar — cruzou os braços. — Se estivéssemos, eu provavelmente vestiria algo melhor.

Elemento Água - Série Witches (I)Where stories live. Discover now