∂σʑє.

131 12 1
                                    

– Taci?

Raoni abriu a porta da biblioteca com cuidado para não fazer muito barulho. As cortinas da janela estavam afastadas, revelando o vidro que apresentava a luz das distantes estrelas no céu, assim como os pontos escuros e claros na densa floresta que percorria o resto da terra de Ephdam. Tacira estava encolhida em uma das poltronas perto da lareira, vestida com um uniforme escuro e as botas de couro que tanto gostava.

Assim que se aproximou, Raoni pôde constatar que ela tinha adormecido com um livro aberto no colo e outros espalhados ao seu redor no chão, e tomando cuidado para não pisar nos volumes, ele deu um passo para frente e balançou suavemente o braço da amiga.

— Taci — repetiu, dessa vez com o tom de voz um pouco mais alto, e observou enquanto ela abria os olhos lentamente, piscando para se acostumar à luz.

— Rony? — esfregou os olhos sonolentos, afastando o livro do colo e ajeitando a postura na poltrona. Virou o rosto para olhar para a janela, e quando voltou a olhar para Raoni, a luz do fogo na lareira fez suas íris azuis brilharem. — Já está muito tarde?

— Bastante. Eu fui ao seu quarto, mas você não estava lá, então estou te procurando pela Sede há uma meia hora — ele abaixou-se para pegar um dos livros no chão, folheando-o rapidamente. — Pontos turísticos em Belém? Eu nem sabia que tinha esse tipo de livro por aqui.

— Eu estava procurando por informações sobre o Forte do Castelo; qualquer característica que fizesse sentido ou tivesse importância o suficiente para os vampiros construírem uma Matriz nas redondezas.

— E encontrou alguma coisa?

Ela balançou a cabeça lentamente, bocejando.

— Eu li algo sobre terem construído para conter eventuais agressões de alguns povos que queriam invadir Belém, principalmente porque a localização é um ponto muito estratégico da cidade — indicou o livro nas mãos de Raoni com o dedo. —, mas, tirando isso, nada que clareie os pensamentos da minha mente. Vou continuar procurando... — de repente, interrompeu a própria fala e franziu o cenho, olhando para o nada. — Eu tive um sonho com o meu pai. Acabei de lembrar.

Apesar do vidro da janela que separava o lado de fora da Sede e a biblioteca, Raoni ainda conseguia ouvir o som distante dos uivos dos lobisomens que se misturavam com o crepitar do fogo. Ele abaixou o livro que estava folheando e olhou atento para Tacira, esperando que ela continuasse a falar.

— Prossiga.

— Na verdade, foi mais como uma lembrança. Como se eu revivesse algo que já aconteceu — sua expressão estava vazia, como sempre ficava quando o assunto era o pai. — Eu estava deitada em uma cama e ele estava sentado ao meu lado, apertando a minha mão — em um gesto inconsciente, Tacira pôs a mão sobre a pulseira laranja que rodeava o pulso direito – havia sido um presente de Yahto, seu pai, dias após o nascimento da filha. — Meu pai estava me contando a história de Maria Quitéria; ela teve uma participação muito importante na luta de reconhecimento da independência do Brasil porque seu pai a proibiu de se alistar para lutar, então ela teve que se passar por um homem para se alistar no Batalhão. Foi uma heroína. No sonho, lembro do meu pai dizendo: ''você precisa ser corajosa na missão, Taci. Assim como Maria Quitéria, você não pode desistir. Você precisa ser forte.''

Raoni sentou-se na poltrona ao lado dela.

— Você acha que foi uma Visita? — a Mystica acreditava que quando alguém perdia um ente querido, ele, às vezes, com benção dos deuses, visitava a pessoa viva em sonhos, como espíritos de luzes trazendo mensagens ou conselhos. Raoni nunca recebeu um; entretanto, nunca perdeu alguém que amava muito.

Elemento Água - Série Witches (I)Where stories live. Discover now