Desentendidos

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Eu tinha apenas cinco anos quando me mudei para o Rio de Janeiro. Tinha apenas cinco anos quando encontrei, pelo menos era o que eu acreditava na época, a garota mais linda do mundo.

Elisa sempre gostara de rosa. Nunca a vi com uma roupa de cor diferente. Em todas as festas à fantasia, a garota vestia-se como a boneca Barbie, o que condizia perfeitamente com sua personalidade: uma garota extremamente bonita, mas impossível de existir tamanho extremo. Todas as garotas tinham inveja dela, e todos os garotos apaixonaram-se pelo menos uma vez na vida por Elisa. Ela, porém, até quando eu morava a seu lado, recusava todos os pedidos de namoro. Inclusive o meu.

Fui me apaixonando por ela a cada dia. Nós sempre brincávamos juntos na rua. Pega-pega, amarelinha, pião, futebol... Elisa parecia a garota perfeita. Era gentil, bonita, e ainda gostava de esportes e videogame. Resumindo: para qualquer garoto da minha idade, ela era o tipo ideal.

Era o aniversário dela de dez anos. Eu continuava apaixonado por Elisa, por isso, resolvi me declarar. Escrevi uma carta e fiquei até tarde em sua casa a fim de entregar. Quando ela terminou de ler, rasgou na minha frente e disse:

- Eu não quero nada que não seja amizade com você. Ou nem isso. Não quero sentir saudades de nada do Rio de Janeiro. Espero que me entenda.

Dito isso, Elisa saiu da sala e trancou-se em seu quarto. Desde então, nunca mais nos vimos, já que ela se mudara para a Inglaterra. Eli, como minha mãe a chamava, foi minha primeira - de muitas - decepções amorosas. Eu só a entendi anos depois, quando vi que esquecer tudo que te ligava à um lugar era uma opção considerável.

Agora, depois de oito anos, estávamos cara a cara. Eu, boquiaberto, e Elisa, com seu sorriso perfeito que eu tive que aprender a odiar.

- Thomas, que saudade! Faz tanto tempo que não nos vemos...

- Ah, é... Como descobriu meu endereço? - me fiz de desentendido, como se dissesse "eu segui seu conselho e me esqueci de você".

- Thomas, éramos vizinhos! Não se lembra de mim?

- Não consigo te reconhecer com toda essa maquiagem...

- Sou eu, Elisa!

Eli me abraçou e eu não retribuí. Não foi um ato de vingança, mas sim de timidez. Minha velha amiga timidez...

- Você não se mudara para a Inglaterra?- indaguei, meio confuso, enquanto me soltava do abraço.

- Sim, mas isso já tem oito anos! Queria cursar Moda lá, mas decidi voltar. Não aguentava de saudade de você, dos meus amigos, do Rio... E trago boas notícias: vamos estudar na mesma classe!

Fiquei atônito demais para responder. Diga-me: o que você faria se o seu primeiro amor, o qual lhe tratara com grosseria, voltasse para a sua vida oito anos depois, como se nada tivesse acontecido? Depois de muito tempo, apenas consegui dizer:

- É tudo tão... irônico. - e me joguei no sofá.

- Por que diz isso? - agora era ela quem se fazia de desentendida.

Amor nos olhos azuis [CONCLUÍDO]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora