IX: Desaparecidos

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Felipe olhou a notificação de seu celular, antes de entrar na biblioteca. Aron havia lhe mandado uma mensagem, um convite para um jantar em sua casa. Porém, as últimas três semanas foram difíceis para Felipe. A imagem daqueles rostos lhe pedindo ajuda, assombrava seu sono e lhe tirava da realidade de dia. Para completar, a relação com o namorado não ia tão bem assim. Afinal, se o tivesse, ele teria respondido, ao invés de bloquear o celular e entrar na biblioteca.

O local estava praticamente vazio, alguns alunos se encontravam espaçados e a bibliotecária não tirava os olhos de um relógio próximo. O local e a hora perfeita para Felipe.

O rapaz foi até uma mesa desocupada, colocou o notebook em cima, se sentou e ligou o aparelho. Nesse momento, mais uma notificação chamou sua atenção, assim como o olhar de rapina da bibliotecária. Dessa vez, Felipe não se deu ao trabalho de olhar a mensagem, se voltando para o notebook à sua frente. O rapaz começou a digitar algo, no site de busca. Mas, antes que pudesse pressionar para a pesquisa começar, ele olhou para o que havia escrito "pessoas desaparecidas". Depois de alguns segundos tomando coragem, ele confirmou a busca.

Felipe acessou o primeiro link, e logo entrou em uma página da polícia. Ele ficou algum tempo, olhando os rostos que ali apareciam. Nenhum era familiar. Ele foi rolando a página, até que alguém lhe chamou sua atenção, com um "olá" tímido:

— Oi Amélia — Felipe respondeu ao cumprimento da moça. Ele percebeu que ela olhava para a página aberta em seu notebook. O rapaz escondeu o máximo que pôde, de forma discreta, e então se esforçou para puxar uma conversa. — O que você está fazendo aqui?

— Eu vim pegar alguns livros para estudar para uma prova. E você?

— Coisa de um trabalho.

— Ah sim! E como está o Aron? Ele anda distante do trabalho.

— Está bem — Felipe recebeu mais uma notificação no celular. — Ele está ocupado, também com provas.

Mais uma notificação apareceu no celular do rapaz, o que fez a bibliotecária olhar ainda mais impaciente para Felipe:

— Eu vou deixar você sozinho, acho que alguém está preocupado com você. Bom, se você ver Aron, fala que eu mandei um oi.

— Falo sim — Felipe olhou o celular, mas não viu nenhuma das mensagens do namorado, apenas o silenciou e voltou para seu notebook.

As mensagens continuaram vindo, enquanto ele olhava para aqueles inúmeros rostos desconhecidos. Porém, um deles se destacou da multidão de desaparecidos. Era um rapaz, de cabelos negros. Ele viu aquele jovem, mas esse estava com olhos esbranquiçados e o rosto em agonia, pedindo-lhe ajuda. Felipe entrou na ficha do rapaz e descobriu que ele havia fugido de casa, e ali existia um link para um vídeo. Felipe colocou os fones e iniciou o vídeo, onde a mãe do rapaz pedia para que ele voltasse, pois se arrependia de tê-lo expulsado.

Quando o rapaz voltou para a página de desaparecidos, mais rostos começaram se tornarem conhecidos.

Assim que não aguentava mais olhar para aquelas histórias, todos de jovens sem amparo, Felipe tirou os óculos e esfregou os olhos. Nesse momento, mais uma notificação fez seu celular vibrar. O rapaz finalmente abriu as mensagens de Aron. Imediatamente ele sorriu, ao ver aquelas carinhas repetidas.

Felipe olhou para o notebook, depois para o celular e então se decidiu. Mandou uma mensagem, confirmando sua presença no jantar. Assim, desligou o computador e o colocou na mochila, em seguida, foi até a saída, indo em direção a seu alojamento.

...

Felipe desceu do ônibus e caminhou pela rua vazia. Assim que atingiu um sobrado específico, tocou a campainha ao lado do portão. Não demorou muito, e Aron apareceu, com um avental rosinha enrolado no corpo:

— Adorei o estilo do chefe — disse Felipe, depois de receber um beijo do namorado.

— É a última moda em Paris. Vem, entra — Aron gentilmente pegou na mão do namorado e conduziu para dentro, depois de fechar o portão.

Lá dentro, eles passaram pela escada e entraram na cozinha. Um cheiro agradável encheu Felipe de felicidade, assim como jeito despreocupado do namorado, que andava de um lado para o outro, preparando o jantar:

— Eu encontrei Amélia hoje. Ela te mandou um oi.

— Acho que ela tem uma quedinha por mim. Às vezes vejo ela olhando para mim, enquanto eu estou trabalhando.

— Também, você deu esperanças antes. Sua mãe que me disse.

— Sim, eu dei, mas um certo rapaz de barbinha loira, roubou meu coração.

— Coitado desse aí — os dois riram, deixando o ambiente ainda mais leve. — Ela também perguntou o porquê você não estava indo.

— Ela também? Minha mãe vive me dizendo isso, até Morgan me mandou uma mensagem.

— Por que você não quer ir?

— Você sabe muito bem o porquê.

Felipe olhou para o chão, lembrando de suas buscas:

— Emma disse para a gente não levantar suspeitas. Acho melhor você voltar.

— Eu vou pensar nisso — Aron deu as costas para Felipe.

— Eu ... eu... também não consigo parar de pensar naquele dia. Hoje eu fui na biblioteca, para sair um pouco do meu quarto.

— Ótimo, eu já estava bem preocupado com você.

— Eu achei algumas pessoas... quero dizer, aquelas que eu vi... lá embaixo.

— E...

— Elas estavam desaparecidas há meses. A mais recente foi há um mês.

Aron foi até o namorado e ajoelhou a sua frente, em seguida levantou o olhar de Felipe, tocando gentilmente em seu queixo:

— Me desculpa ter levado você lá. Eu não sabia que você iria ver aquilo. Eu sinto muito.

— Está tudo bem, Aron. Você não tem culpa de eu ver essas coisas.

— Eu já te disse que não tem nada de mais com seus poderes. Você não precisa ter medo.

— Mas eu tenho. Não tem como controlar. E ver aquelas pessoas, foi horrível — Felipe começou a chorar, e Aron imediatamente o consolou. — Elas me pediam ajuda, e eu não conseguia fazer nada.

— Por isso eu quero chegar ao fundo disso. Para a gente salvar mais pessoas.

— Você sabe o que a Emma disse. É perigoso.

— Mas eu sou um guardião!

— E como a gente ajuda aquelas pessoas?

— Eu não sei, ainda, mas a gente descobre como.

— Você vai tentar convencer Emma?

— Talvez. Acho que a viagem que a gente vai fazer, vai ajudar.

— Ah é mesmo. Eu tinha até esquecido da viagem — Felipe começou a secar suas lágrimas.

— Lá, quando eu tiver uma oportunidade, eu converso com Emma. Ela não vai gritar na frente da família de vocês.

— Você realmente não conhece Emma, não é? Ela, com certeza, faria isso.

Assim os dois riram, fazendo o clima voltar a ficar leve na cozinha. De repente, a porta da frente abriu e fechou, não estando mais sozinhos, os dois se afastaram e logo Sara chegou na cozinha:

— Desculpa a demora meninos — a mãe de Aron foi até Felipe e o cumprimentou, depois fez o mesmo com o filho — a delegacia está uma bagunça, com esse suicídio de Lorna.

— Foi tão estranha a morte dela, não é? — disse Aron, já colocando parte da comida em uma travessa.

— Nem me fala. Alguns dizem que foi assassinato, outros já não. Bom, eu vou tomar um banho rápido, já vão colocando a mesa, daqui a pouco eu desço.

Assim, ela saiu da cozinha, deixando os dois sozinhos novamente. Então, os rapazes começaram arrumar a mesa de jantar, em um cômodo adjacente. O assunto entre eles não era mais a incursão a aquele prédio,e sim o estranho suicídio. O qual era exaustivamente falado em qualquer roda de conversa.

Os Guardiões: Parte I - Correntes de FogoUnde poveștirile trăiesc. Descoperă acum