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Helena colhia flores para Josephine no bosque depois do almoço. A avó foi fazer compras com Kitty e foi categórica quando Helena implorou para ir. Todos foram. Ela acenou para Will que estava pendurado na escada consertando uma janela do segundo andar.

As arvores ao redor do chalé dos Dunne não eram arvores quaisquer. Eram homens-árvores, criaturas bondosas que protegiam as florestas. Helena tentou alcançar a flor branca no topo de uma delas, quando sentiu os galhos se enroscando ao seu redor e a levantando.

― Eu sinto muito se o machuquei. ― Disse para arvores. 

A árvore retirou a flor branca com pontinhos rosas com o próprio galho, uma espécie precária de dedos e entregou para Helena. No centro da árvore retorcida ela viu um símbolo gravado na madeira, formando um redemoinho, que Helena havia visto em algum lugar, mas não se recordava aonde.

― Muito obrigada. ― Ela disse e fez um carinho na árvore.

As arvores dançaram em agradecimento e as folhas cobertas pelo orvalho da manhã salpicaram em seu cabelo cacheado. As suas companheiras retiraram algumas flores e fizeram uma coroa improvisada.

Helena fez uma reverência, mas as arvores não responderam, ficaram estáticas e tensas. Os pássaros voaram para longe. Helena franziu o cenho, até que o viu. Prepotente e altivo com um sorriso estampado no rosto.
Um centauro.

― Você deveria fazer uma reverência. ― Disse o centauro numa voz preguiçosa e mística.

Um arrepio passou pelo seu corpo e ela fez uma reverência desajeitada e insegura. Quando se levantou, ele sorria.

― Você é a protegida delas. ― Ele notou. 

O centauro tinha o pelo castanho e cabelos longos trançados ao redor da cintura. Os olhos eram levemente afastados um dos outros e pequenos. Era musculoso e o centauro deu um meio sorriso. Ela desviou o olhar e notou o grande arco de madeira preso em suas costas. 

― Me chamo Éfero, do clã de Ciron, segundo na ordem da cavalgada. ― Ele fez retribuiu a reverência, ficando quase do tamanho de Helena. ― Não vai me dizer seu nome?

― Não estou certa de que devo.

Éfero riu.

― Eu entendo, você é uma protetora, porque confiar em um centauro devorador de criancinhas?

― Eu me chamo Helena, não quis ofendê-lo.

― Ah... Helena. ― Ele sorriu mais ainda e reparou no telhado do chalé ao longe. ― Neta dos Dunne.
 
Helena assentiu. Torcia para que Will sentisse sua falta.
 
― Muita irresponsabilidade deixar uma garotinha sozinha na floresta. ― Ele a circundou. ― Ainda mais com um assassino a solta. ― Helena arregalou os olhos. ― Ah, pobrezinha, não te contaram?

― O que não me contaram?

― O assassino dos seus pais fugiu e foi visto próximo a Brascard. Eu não me surpreenderia se ele estivesse disposto a terminar o serviço. ― Éfero estava tão perto que Helena foi capaz de sentir o seu hálito quente.

A discordância entre Althariel e Ivan. A obstinação para que usasse aquele manto estúpido. Até mesmo a forma como Josephine havia insistido que ela ficasse em casa. Todos sabiam. Todos eles sabiam.

― Eu sei como é. ― Ele disse numa voz melosa. ― Eles mentiram para você.

Aquela frase. Já havia escutado aquela frase antes. Na floresta dos grasnassáros. Éfero tornou a sorrir. Ele sabia que ela havia se lembrado.

― O que você quer? ― Ela vociferou. As mãos estavam quentes e seu fogo crepitava pronto para ser usado.

― Não sou eu quem a quer.

Éfero empinou o corpo e Helena caiu para trás. Ele a esmagaria num piscar de olhos. Helena concentrou o seu poder, não morreria sem lutar, mas percebeu que o centauro não a encarava. Ele via além.

Helena não precisou olhar para trás para saber que era Will vindo ao seu encontro. O protetor parou a poucos metros de Helena com uma expressão tranquila.

― Não aqui. ― Foi tudo o que disse.

Éfero sorriu de um jeito perturbador, fez uma reverência à Helena e cavalgou na direção oposta.

― Você definitivamente não tem senso de proteção. ― Ele estendeu o braço.

Helena o dispensou e se levantou sozinha.

― Você tem noção do que acabou de fazer? ― Vociferou. ― Do perigo que se expôs?

― Estava tudo sobre controle. ― Helena elevou a voz.

― Cala a boca, Helena. Eu não quero saber se você se acha capaz ou forte o bastante para sair por aí sozinha enquanto... ― Ele xingou de frustração. ― Um centauro! Um centauro pelo amor do Elo.

― Você sabia? ― Perguntou com toda calma possível, apesar de estar queimando por dentro.

Will passou a mão nos cabelos. Aquilo era um sim. Helena deu meia volta pisando duro, mas Will segurou o seu braço.

― Eu soube ontem pela manhã. Althariel me fez prometer.

― Porque? ― Ela chorou de raiva.

― Não importa, Helena. ― Will disse num tom sério. ― Todos estavam com medo de você surtar.

― E queimar tudo. ― Ela sorriu em escárnio.

― E ir procurar por ele. ― Foi o que Will disse. ― Você não pode sair por aí andando pela floresta, e se eu não tivesse aparecido?

Helena bufou.

― Grande coisa para o excelente protetor William Cardragon. O que eu sou para você além de uma missão no seu currículo? ― Ela lançou as mãos no ar. ― É só por isso que você está aqui, para ser a minha babá, então não finja que se importa.

Helena voltou para o chalé sem saber se Will estava a seguindo ou não. Ela queria gritar e queimar coisas, especialmente aquele cabelo preto e lustroso. Porque ele nunca o penteava afinal? Idiota. Idiota. Idiota, ela pensou.

Não passava de um mentiroso. Todos eles eram. O assassino dos seus pais fugiu e ninguém pensou em contar? Nem mesmo Charlotte, que nunca mentia! 

⚡⚡⚡

A neta havia partido a pouco. A presença de centauros nas imediações tornou a viagem mais curta. Mas não faltou promessas do seu retorno.

Robert olhou a carruagem partindo pela estrada de terra e voltou para o chalé. Encontrou Josephine pensativa na sala de estar. Não fora como ela havia planejado. A torta de maçã intocada ainda estava sob a mesa.

― O que você sentiu?

― Não sei do que você está falando. ― Ela desconversou.

― Ora, você acha que eu não sei quando está mentindo? Depois de todo esse tempo, Josie.

― Ontem eu tive uma sensação e hoje tive de novo quando a vi partir.

― Que sensação, mulher? ― Robert perguntou impaciente.

― O destino daquela menina foi selado e aquele medalhão é só mais uma confirmação das infelicidades que ela vai experimentar.

― Que medalhão?

― O que estava com o menino. ― Ela explicou. A lembrança da última vez que vira o medalhão lhe atingiu. No pescoço de uma jovem no dia do seu casamento. Não fora um casamento longo.

Josephine era uma sentire. Não cabia a Robert contestar o seu dom. Já tivera provas o bastante das sensações que a esposa sentia. Ela não errara uma.

Só o vira tão afetada daquela forma uma única vez, porém. Enquanto iam visitar a filha no hospital em Brascard. Tereza estava radiante com o uniforme de médica. A guerra era apenas uma promessa longínqua. Mas o dom de Josephine estava lá para lembra-los de que algo ruim iria acontecer. E aconteceu.

― Há algo mais que você esconde. ― Não foi uma pergunta, mas uma constatação.

Josephine meneou a cabeça, ainda relutante, mas não fazia sentido mentir.

― O garoto também teve o seu destino selado. Eu senti a fúria de uma besta quando o conheci e ele está tão ligado a ela.

― Você se refere à besta ou a Helena?

Josephine sorriu de um jeito triste.

― A ambas

***
Um pedido de desculpas enoooooorme por ter ficado tanto tempo sem postar. Acontece que eu me formei na faculdade e tudo foi uma correria desde então. Não desistam de mim ainda! Prometo recompensar vocês com vários capítulos.

As Raças IrmãsOnde histórias criam vida. Descubra agora