01 de dezembro - Parte 11

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Então lá estávamos nós, na madrugada de sexta para sábado, sentados no piso do meu apartamento.

Todos os meus poemas no chão, espalhados. Dava para ver toda a minha vida neles, mas Sean não sabia disso. Talvez, se eu os organizasse em ordem, ele entenderia.

Meu primeiro amor estava lá, consequentemente a primeira vez que partiram meu coração também. Ele poderia encontrar histórias que vivi com minhas amigas, dias que só de lembrar fazem meus lábios se arranjarem em um sorriso.

Depois, passei por todas as dúvidas e inseguranças e, obviamente, escrevi sobre elas. Páginas cheia de angustias, mas eu adoro cada uma.

Eu queria viver disso. Mas quem vive da escrita hoje em dia? Ainda mais de poemas.

Também haviam as poesias sobre o Mateo e todo nosso relacionamento. Elas estavam em uma pasta especial, que eu gostava muito desde pequena, com imagens de princesas e castelos – infantil e ingênuo, eu sei.

Os poemas que contavam minha vida eram somente 10% dos que estavam pelo chão, todos os outros eram histórias que criei.

- Por que você escreve? – Sean me questionou, enquanto investigava as folhas, digitando algumas partes no tradutor do celular.

- Eu gosto de viver mais de uma vida. Faço isso lendo, mas faço escrevendo também. Quero que as pessoas, aquelas que assim como eu não se contentam com a realidade, tenham a possibilidade de viver outras histórias também. Quero que todas essas narrativas e pessoas que vivem na minha cabeça possam se libertar – meus olhos lacrimejaram ao dar essa explicação. Era uma confissão muito grande para mim, eu estava compartilhando muita coisa rápido demais.

Enxuguei as lágrimas, primeiro a da bochecha esquerda, depois a da direita. Se ele notou, foi discreto o suficiente para não comentar.

Sean pediu que eu as lesse para ele, primeiro em português e depois fazendo a tradução do que diziam. Escolhi as mais importantes para mim, mas também as que não eram extremamente pessoais. Alguns textos eu não tenho a menor pretensão de compartilhar, são sentimentos que ainda não consegui lidar por completo, só que disfarçados de palavras.

- Eu gostei muito deste. Por que você não mostra para alguém, ou sei lá, posta no seu Instagram?

Não sabia explicar para ele o porquê daquele em particular não ser bom o suficiente. Nem sabia dizer o motivo de eu sentir que qualquer um que ele escolhesse não seria perfeito para ser mostrado. Eu não estava pronta para todas as críticas que viriam. Ficava pensando em nas pessoas que conheci quando mais nova, todas elas comentando o quanto eu estava fazendo papel de idiota.

- Como você lida com as críticas? – Perguntei. Se ele interpretasse, saberia que meu questionamento era a resposta para sua pergunta.

- De maneira péssima. As críticas me deixam muito inseguro, e é por isso que aprendi a ignora-las. Eu não leio mais os comentários nas minhas postagens, assim evito todas as mensagens negativas que tem no meio. Quando alguma revista ou site faz uma reportagem realmente interessante, com opiniões relevantes de verdade, alguém da equipe sempre me avisa. Do contrário, eu simplesmente não leio nunca. No começo, eu proibia comentários em todas as minhas redes, era mais fácil assim. Mas depois, quando eu comecei a crescer um pouco mais como artista, era importante deixar essa opção disponível. Você se torna mais humano e sua publicação tem um maior alcance. Só que eu ainda não estou pronto para ler todas as mensagens e guardar só as que valem a pena. Um dia eu estarei, espero.  

Estava torcendo por um passo a passo que eu pudesse seguir, mas foi bom perceber que mais um pedacinho da estátua havia desaparecido nele. De alguma maneira esquisita, entender que até alguém com fama mundial é inseguro me fez sentir um pouco mais segura.

Ficamos mais alguns momentos por ali, lendo e traduzindo meus poemas, uma sensação de liberdade e ansiedade que até então eu não havia experimentado. Liberdade por finalmente compartilhar tudo aquilo, parece que os textos finalmente haviam se tornado reais depois que uma outra pessoa leu. Ansiedade porque, assim que eles não são só meus, passo a correr o risco do julgamento alheio.

Quando eu já não conseguia manter as costas reta sem ter que encostar no sofá, Sean foi tomar um banho e eu aproveitei para arrumar seu colchão na sala.

Juntei todos os papeis em suas respectivas pastas, toda minha história dividida em pequenas folhas e pedaços de plástico, e deixei em cima da minha escrivaninha.

Enquanto eu escolhia o lençol e ajeitava o travesseiro, me dei conta de quantas meninas queriam estar aqui agora. Quantas delas já viveram esse momento com ele em suas imaginações? Eu precisaria escrever sobre isso – pensei – assim elas poderão viver esse momento também.

Fui me deitar feliz, a sensação de uma nova história iminente sempre me deixava assim. Troquei minha roupa por um conjunto de short e camiseta, nunca consegui dormir de calça. Aproveitei para retirar meu anel também, e guardar em um potinho protegido, meus dedos estavam inchados por conta do álcool, não seria uma boa ideia dormir com ele.

A Garota da Capa [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora