02 de dezembro - Parte 06

1.5K 247 189
                                    

- Ah, não! Pastel! Olha lá, Sean! – Falei, enquanto apontava freneticamente na direção de uma barraquinha que estava sendo montada. – Eu amo pastel! Você precisa experimentar!

Sean abaixou seus óculos falsificados até o nariz e me olhou por cima deles, fazendo cara de desdém. Não pude evitar rir da situação, volta e meia eu me lembrava do seu look varejo e ria sozinha.

Imagina o quanto todos os estilistas não gostariam de vesti-lo?

- Não quero – ele respondeu, seco.

- Como assim? Você nunca nem comeu! É obvio que você quer.

- Não gostei do nome. Não posso confiar em quem não gosta de água de coco. – Disse, empurrando a armação de volta para o lugar certo.

O quão afrontoso esse canadense achava que era?

- Então vai ficar sem.

Fiquei tão feliz por conta de uma barraquinha de pastel, que nem sequer costumava passar por essa região, não vai ser uma resposta atravessada que irá tirar meu bom humor. Como eu pude me apaixonar por alguém que não quer nem experimentar um pastel?

Senti uma movimentação do meu lado direito, e notei que se tratava de Sean, correndo para me alcançar enquanto colocava seu boné.

- Eu quero um sim! Só estava te provocando. Mas, o que é um pastel? – disse ele, com dificuldade para pronunciar a última palavra.

Como explicar para alguém de fora a maravilha que é um pastel? Ainda por cima, um pastel santista! Porque, se uma massa com recheio já é incrível por natureza, Santos leva essa refeição á um outro nível, com opções extremamente inusitadas. Só era preciso tomar cuidado com a inovação, para não acabar com alguma intoxicação alimentar. Mas, durante minha explicação, preferi deixar de lado essa última parte.

Escolhi para Sean um pastel de queijo, a opção que provavelmente faria grande sucesso. Para mim, pedi uma combinação com azeitonas, brócolis, queijo e camarão. Eu já sou vacinada, com certeza não me faria mal algum.            

- E então? – questionei, ansiosa, enquanto ele dava sua primeira mordida.

- Oleoso.

- Faz todo sentido mesmo. Eu deveria ter previsto essa situação. Alguém com o gosto tão duvidoso para gostar de água de coco, só poderia achar pastel oleoso mesmo. Me desculpe, não é fit o suficiente para você, Sr.Hil?

- Na verdade, não. Pode ficar com o meu também.

- Você está brincando comigo, certo?

- Não, eu simplesmente não amei.

- Que decepção.

- Eu vou comer. Deixa aí, que eu vou comer.

- Não! Não precisa se esforçar para comer pastel. Eu como os dois sozinha – disse, retirando o pastel das mãos de Sean.

- Qual a próxima especiaria que iremos experimentar?

- Nenhuma! Você acabou de negar a melhor de todas! Perdeu o direito de experimentar qualquer outra coisa quando chamou o pastel de oleoso. Seu sem coração.

Se ele não estivesse de óculos, eu poderia jurar que o vi revirar os olhos. Fazer o que? Era divertido irritá-lo, no fim das contas.

- Vamos esperar para ver qual a próxima maravilha brasileira que irá passar. Hoje você está com sorte, nunca vi a barraquinha do pastel fazer trilha para chegar até aqui, em uma praia com poucas pessoas.

Enquanto caminhávamos em direção ao mar, após minha refeição de dois pastéis, Sean questionou de maneira muito indelicada se eu sempre comia tanto assim. O que raios significa tanto assim? Dois pastéis? Eu acho que, se for isso, eu comia muito sempre.

Ele foi tão sincero ao realizar essa pergunta, tão direta. Era notável que se tratava de uma crítica, mas de uma real dúvida.

- Minha vez de fazer uma pergunta. As garotas do seu país comem tão pouco assim, ou vocês só têm o costume de fazer questionamentos indiscretos mesmo?

Sean corou, parecendo se dar conta do quão aleatório e indelicado ele havia sido e eu não consegui segurar o riso. Às vezes, as diferenças culturais são gritantes. Querendo ou não, ele não se tratava de um garoto que cresceu do outro lado da minha cidade, mas sim do outro lado do continente. Quais outras diferenças que ainda iríamos descobrir?

- Eu gostei das praias daqui. Gosto desse calor e de poder aproveitar realmente o mar, é bastante diferente do que fazemos nas nossas praias.

- Isso porque você não viu de noite – falei, enquanto utilizava as mãos também para me expressar. Conversar sobre a vida que eu já tive por aqui me faz ficar assim, saltitante – é lindo! E as pessoas vão para jogar vôlei, ouvir música ou só ficar sentado mesmo, observando o mar. Eu queria que você tivesse tempo para ficarmos por aqui.

Antes que Sean pudesse responder, uma onda quebrou em cima da gente. Por sorte, eu não fui muito atingida, mas ele foi parar bem longe.
Corri atrás dele, com medo de que algo pudesse ter acontecido, quando o vi levantar e bater as mãos no shorts que estava usando.

- Você está bem?

- Infelizmente, acho que nunca irei me recuperar. Há areia em lugares que eu nunca imaginei ser possível.

Sean puxou para fora o tecido de dentro dos bolsos, recheados de areia.

-Imagino que esse não seja o pior lugar onde ela está? – me esforcei para questionar,enquanto era tomada por um ataque de risos

- Longe disso, Lena, longe disso.

A Garota da Capa [CONCLUÍDO]Where stories live. Discover now