02 de dezembro - Parte 12

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No rosto de Sean havia se formado uma expressão confusa, como quem não entende onde eu gostaria de chegar. Sua boca entreaberta, tentando formular uma frase, mas nada saía. Não esperei que ele se recompusesse, e continuei:

- Você acha que eu posso largar tudo para ficar com você, assim do nada? De onde você tirou essa ideia? E além disso, quem te deu permissão para me beijar?

Ele tentava se explicar, dizendo algo sobre eu estar sem o meu anel e achar que isso era um sinal. Um sinal! Só se for sinal de que eu preciso de um remédio para memória!

- Quando eu sai para te procurar, depois do que aconteceu com a garrafa d'água – Nem deixei que ele continuasse. Assim que Sean fez uma breve pausa para respirar, eu me intrometi, acusando-o de se achar no direito de receber algo em troca somente porque havia sido simpático comigo inicialmente.          

Quem ele achava que ele era?

Eu estava possessa. Sean não passava de um menino imaturo! Alguém que chega aqui e acha que eu simplesmente vou revirar minha vida, largar tudo por ele? Não pode ser nada além de uma criança inocente.

- Não é nada disso, Elena. Eu não queria algo em troca, sinto muito por você ter se sentido dessa maneira. O que eu queria dizer é que gostei de você desde quando te vi, e queria te conhecer melhor, por isso te procurei. Não é possível que você pense essas coisas de mim, não posso acreditar que você está agindo dessa maneira, Lena. Você não sentiu nada do que eu senti?

Sean parecia não conseguir encontrar uma posição ideal. Ele se levantou e sentou no sofá diversas vezes em poucos minutos, incrédulo.

Não é como se eu não entendesse a situação. Tenho certeza que, de certa maneira, acabei influenciando-o para tomar essa atitude. Mas uma coisa é o flertar comigo, ou imaginar uma cena - ou uma vida, confesso. Mas, outra bem diferente é beijar uma pessoa comprometida.

Eu me sentia suja, completamente perdida e confusa.

Como vou explicar tudo isso para o Mateo?

- Pensa bem, Lena. Eu tenho certeza que você não se sente dessa maneira. Vem comigo, nós podemos passar um tempo juntos, viajarmos para vários países. Pensa no quanto você vai gostar.

- Ah sim – falei, completamente sarcástica – e eu largo tudo para te seguir, então? É esse seu plano?

- Você nem ao menos gosta do seu trabalho! O que tanto estaria perdendo?

- Isso não tem nada a ver com meu trabalho, Sean! – Nesse ponto, eu já me sentia completamente fora de mim. Caminhando, de um lado para o outro da sala, tentei entender como eu deixei a situação chegar a isso. – Você nem ao menos me conhece. Como pode achar verdadeiramente que eu largaria minha vida para seguir um homem? Além disso, nós passamos dois dias juntos. Dois dias. Sean, não dá para conhecer uma pessoa nesse período, não de verdade.

- Você está deturpando tudo o que eu digo! Não é para me seguir, Lena, e sim para viver uma nova etapa, começar de novo, conhecer novos lugares. Quem sabe, fazer um blog e realmente trabalhar com aquilo que você gosta? Quanto a não te conhecer, eu não vou me dar ao trabalho de te responder. Afinal, acho que você está querendo mesmo é se convencer com essa desculpa. Para de tentar controlar tudo, premeditar vida inteira!

- Eu não consigo! Não dá para deixar a vida nas mãos da sorte, dessa maneira.

- A sorte não existe, quanto tempo você vai demorar para entender isso? Quem faz seu destino é você! E quando você não toma uma atitude, está escolhendo um caminho sem perceber.

Sentei no braço do sofá, no lado oposto de Sean. Fiz isso pois queria ficar o mais longe que desse, eu já sentia meus olhos lacrimejando, e não gostaria de dar a entender que ele tem razão.

Quem eu quero enganar? Nós nos conhecíamos muito para quem está junto somente por dois dias. Mas tudo que eu havia dito até o momento era real, eu nunca abandonaria a minha vida porque ele pediu. Não me perdoaria por viver as custas dele, como uma aproveitadora.

Passei as mãos em meu cabelo, tentando arruma-los. Era mais fácil encontrar um biscoito da sorte naquele emaranhado no momento, do que ajeitá-lo de uma maneira que me fizesse parecer sã.              

Mas, como Sean bem me disse, não havia sorte que pudesse me indicar o caminho, muito menos penteado que me desse confiança. O que eu precisava era de tempo. Tempo para colocar minha cabeça em ordem, e também meu coração. Tempo para que eu não magoasse de maneira irreversível pessoas tão importantes para mim. Tempo para que eu não me machucasse precocemente.               

- Você é só um menino Sean. Um garoto mimado que teve sim muita sorte na vida, e agora acredita que todo mundo fará suas vontades.

Pude nota-lo murchar. Era como se todos os nossos momentos me escapassem pelos dedos, feito areia da praia. Assim que falei essas palavras, me arrependi. Temi que tivesse sido dura demais, mas já era tarde, eu havia acertado onde mais doía e sabia disso. Infelizmente, só consegui aliviar as dúvidas que haviam dentro de mim de um jeito sádico, despejando-as em Sean.

Sai correndo para o banheiro, as lágrimas brincando de corrida em minhas bochechas. Meu peito subia e descia muito rápido, a respiração descontrolada. Eu sabia que Sean continuaria insistindo se soubesse que possuía ao menos uma misera chance, por isso falei tudo aquilo. No fim das contas, eu não saberia dizer se a chance é realmente real.

Abaixei a tampa da privada e me sentei, relembrando todos os momentos bons dos últimos dias. E se eu o magoei tanto, a ponto de não haver mais volta?

Esperei meus soluços pararem e limpei o rosto. Não haveria tempo para aguardar os olhos recuperarem a cor normal.               

Mas, ao abrir a porta, eu já estava sozinha. Em cima de minha escrivaninha, um bilhete:

Sinto muito que você me veja dessa maneira

Viro o pequeno papel, buscando por mais algumas palavras, ou talvez uma mensagem subliminar que eu não tenha entendido. Leio e releio diversas vezes, mas não há nada ali, além do adeus que eu deliberadamente quis tanto que ele dissesse antes.

Não há motivo para esconder os olhos inchados agora – penso, antes de me render a mais um período de choro. Sean chegou de maneira inesperada, e foi embora da mesma forma.

A Garota da Capa [CONCLUÍDO]Where stories live. Discover now