[00] Prólogo; asas da liberdade.

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No Rainbows — Prólogo.

Asas da liberdade.


Março, 1986.
— Senhor Kim, por favor, não ande tão depressa! — o mordomo perseguia-me com um guarda-chuva, tentando falhamente proteger-me da fraca garoa que caia por sobre nossas cabeças. — Senhor Kim!

Não estava acostumado com tamanha formalidade, muito menos com o tratamento que estava recebendo. Mal havíamos pisado na terra do sol nascente e já tínhamos seguranças e criados ao nosso encalço.

Meu mais novo — e também o único que já tive na verdade — mordomo chamava-se Nakamoto Yuta, e, sinceramente, aquele beta parecia ser mais jovem do que eu.

— Senhor Nakamoto, já peguei chuvas bem piores que essa, propositalmente ainda. — Lhe explico em um japonês que reconheço ser deveras embolado. — Acalme-se, por favor.

Minha mãe, Kim Yongsun, andava um pouco atrás de nós. Um intérprete lhe traduzia literalmente tudo, desde placas aleatórias até nomes de lojas, mesmo que ela claramente não estivesse dando-lhe atenção; estava, bem como eu, fascinada pela capital japonesa.

Tive de parar de andar por algum tempo para observar uma imensa vitrine com pequenos aparelhos acinzentados com uma tela minúscula e algumas teclas, além de algum tipo de antena. Talvez uma máquina de escrever portátil, para os homens e mulheres alfas de negócios? Sei que não haviam tais tecnologias em Anyang.

— Não posso permitir que molhe as suas vestes, senhor Kim. — Ele explicou, recompondo-se após a minha repentina parada, e então seguiu o meu olhar na direção da vitrine. — Oh, vejo que o senhor interessou-se pelos celulares.

— Celulares? — Encarei-o, confuso.

— São como telefones comuns, só que são portáteis. — Sorriu serenamente. — Desejas um modelo, senhor?

Tornei a olhar para a vitrine. Celulares. Essa palavra me fazia lembrar das aulas de ciência em meu tempo de escola, e não de telefones.

Mas, curioso como sou, assenti algumas vezes para Nakamoto, que imediatamente fez um sinal para que um dos seguranças se aproximasse de nós e então, já na companhia deste, levou-me para dentro da loja.

— Boa tarde, cavalheiros! — Um alfa nos recepcionou, sorridente. — Em que posso lhes ser útil?

— Meu senhor ganhará seu primeiro celular, por tanto mostre-nos apenas os seus melhores modelos. — Nakamoto disse ao homem, que apenas assentiu.

No instante seguinte, o alfa explicava-me sobre os aparelhos e como eles funcionavam. Acabei por ver — e testar — cerca de vinte e oito dos modelos, embora não visse nenhuma diferença entre um e outro, no final decidindo-me por um cinza qualquer.

Pode parecer estranho, e tenho plena consciência de que realmente é, mas eu senti que perdi um pouco de minha própria essência ao comprar um produto japonês, mesmo que não fosse com meu próprio dinheiro.

Está certo, tudo era muito bonito e moderno, parecia que eu estava andando em uma cidade futurística, mas ainda sim eu era sul-coreano e, terei de assumir, levemente patriota. O Japão havia feito muito mal ao meu país e à minha gente, ao meu povo, isso sem motivos. Esse era um rancor que eu me obrigava a guardar.

[···]

Enquanto Tóquio parecia mil anos no futuro, Kyoto estava presa em algum lugar do passado, talvez só alguns milhares de anos.

A arquitetura tradicional japonesa era bela, mas não era algo a que eu estivesse acostumado. E todas as estruturas da região pareciam ser assim, tirando uma ou duas.

no rainbows | taekookWhere stories live. Discover now