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Takako apertou a página entre os dedos até se tornar uma bola de papel. Sayuri entrara no quarto de hóspedes para acordar Mikoto e encontrou o bilhete sobre o criado-mudo, junto à flor de shion, e imediatamente chamou a prima. Agora as duas tentavam tirar alguma conclusão daquilo que tinham.

Ela deixara para trás tudo menos o presente de Takako, não levara o celular nem a naginata. Queria mesmo viajar com pouca bagagem e não ser rastreada.

-- O que ela quis dizer com "não quero correr o risco de prejudicar mais gente"? – Sayuri pensou alto, andando de um lado para outro do quarto – Ela dá a entender que tem medo de nos machucar, mas isso não faz sentido nenhum. No que ela estava pensando para fazer uma loucura dessas?

-- Haku – Takako olhou para o menino, encolhido na beirada da cama, imóvel desde que Sayuri encontrara o bilhete – Você sabe algo sobre isso?

Ele abraçou os joelhos e enterrou o rosto nos braços. Era toda a resposta que precisavam.

-- Você viu quando ela foi embora? Mikoto falou com você? – Sayuri exclamou.

Sem erguer a cabeça, ele assentiu. Takako sentou ao lado dele e insistiu:

-- O que Mikoto te contou? Ela disse aonde ia?

-- Só que não precisaria mais da minha proteção, que não era perigoso aonde ia, e eu devia ficar aqui com vocês.

As duas jovens se entreolharam, pensando o mesmo, e Sayuri verbalizou:

-- Ela foi para casa.

Takako balançou negativamente a cabeça.

-- Quantos navios vão de Shiro para Iruka por dia? Mikoto ainda pode estar na cidade.

Mas uma rápida busca mostrou que ela estava errada. Além de não encontrar pista nenhuma do paradeiro de Mikoto, Hiro soube que um navio com destino às ilhas doo sul zarpara naquela madrugada. Era uma certeza que Mikoto estava a bordo quando partiu.

-- O que faremos? – Sayuri girou sua pérola entre os dedos nervosamente. Takako, ao contrário, cerrou os punhos com firmeza.

-- É muito claro o que vamos fazer.

*

A luz do sol da tarde ofuscou Mikoto, mas ela não se importou. Uma vez fora do segundo navio no qual entrara clandestinamente, todas as sensações que se seguiram foram prazerosas. O sol, o vento salgado, o rugir das ondas ao longe e a visão de sua cidade natal.

A emoção de estar de volta à segurança e familiaridade do lar preencheu-a de tal forma que a menina achou que seu peito fosse explodir. Suas mãos tremiam tanto que quase deixou cair a caixa de madeira.

Ela correu para a pequena colina que abrigava o Santuário Mizushima, o único templo de Iruka, galgou a escadaria gasta e cruzou o torii desbotado para enfim chegar em casa.

Megumi varria a frente do templo, deserta no momento, e deixou cair a vassoura ao notar a neta diante dela.

-- Mikoto! Você voltou!

Ela teria respondido, mas ao abrir a boca, tudo que saiu foram soluços. Mikoto deixou a caixa escorregar de suas mãos e se jogou nos braços da avó. A mulher ficou surpresa e confusa, mas nada disse e deixou que ela chorasse.

Quando Mikoto se acalmou, Megumi acariciou sua cabeça delicadamente e pôs uma mecha de cabelo atrás de sua orelha, e por fim perguntou:

-- Quer me contar qual é o problema?

-- Desculpe – ela soluçou – Desculpe por fugir de casa.

-- Não estou chateada com isso, meu bem. Fiquei aliviada pelo clã Kairiku tê-la acolhido entre suas miko.

O Conto da Donzela do SantuárioOnde as histórias ganham vida. Descobre agora