[Cap.4] Quando se sabe voar.

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Elas não eram as únicas incomodadas com o cheiro, ainda era a semana da limpeza e se sentia que parecia não ter fim. Era um alívio estar longe de toda aquela fumaça das roupas velhas, as que estavam ali ainda haveriam de torrar mais dois sacos. Mãe Ursa improvisou máscaras para Acácia e Idára suportarem o cheiro, porém isto deixava ainda mais insuportável e este era um verdadeiro sufoco. Aproveitaram o clima quente do Brasil para lavar todas as parafernálias que haviam sobrado e não como conveniente queimarem muitas roupas sem qualquer checagem ao aproveitamento.

— Acácia, se você não jogar essas roupas rápido no fogo irá fazer com que isso demore mais que o necessário. — Mãe Ursa disse em meio as tosses.

— A culpa não é minha se algumas roupas estão nojentas e eu nem sei mais a diferença do fedor da fumaça com o fedor do cecê!

Ela tirou a máscara improvisada não antes de se arrepender de ter feito isto, colocou um pregador no nariz e passou a pegar as roupas do saco na ponta dos dedos, muda por muda. Murmurou ainda bastante de terem ficado responsáveis por aquela péssima tarefa, mas não obteve engajamento da parte de Idára. Esta permaneceu fazendo o trabalho em silêncio, nisto parecia muitíssimo com o pai, se calava e não tinha a mania de fazer contestações. Se estivesse em um jogo seria peça de manobra na condição de contentar-se em estar no tabuleiro, se mexeria caso conveniente as regras do jogo. Seu pai não era assim, os outros não o comandavam, ele mantinha o silêncio por forma de reclusão, por querer se distanciar. Idára tinha o silêncio por forma de inclusão, achava que a fazia se aproximar.

A fumaça não a incomodava, não mais que seus pensamentos, tinha os deixado evadir, imaginava com curiosidade a aparência da mãe, a fisionomia montada era ainda muito parecida com a sua própria. Lendo o livreto não conseguia tirar grandes comparações além de alguns jeitos de falar. Cogitou por um instante em perguntar para alguém que a conheceu se seriam parecidas, mas balançou a cabeça em seguida, faltava certeza se isto seria seguro e pensar que haveria algo de inseguro nas pessoas do circo a fez recuar. Os seus próprios sentimentos invadiram sobre a barreira estabelecida. Deu cabo deles num segundo. Os enlaçou e jogou para o lado de lá da claraboia, se manteve no sol e perto do fogo, ficou repetindo, o circo não, o circo não, enquanto jogava rápido as roupas nas chamas.

— Idára? Deixe por enquanto esse saco e vá buscar para mim dois galões de gasolina, por favor. — Mãe Ursa precisou falar mais alto pois estava debaixo da claraboia, num pedaço dentre três paredes mal sustentadas onde havia sombra.

— Por que ela e não eu?

— Porque você é mole, Idára está sendo rápida na tarefa e sei que não enrolará para trazer ou fará um truque de sumiço.

Acácia se segurou para não retrucar, haveria ali meias verdades. Era da parte dos mágicos, que realmente eram bons com truques e pequenas picaretas, eles sabiam sair não importa de onde. Ela não melhoraria ou iria piorar a fama de sua parentela, tinha uma grande habilidade, mas preferia ficar nos bastidores e com a parte dos cenários e caracterização dos personagens. Treinava em si mesma, os olhos num castanho vivo pareciam ter o formato do peixe Platy, este era seu belo detalhe, deixava o meio a meio assombrear, gostava de uma sombra rosa e no outro olho verde e ficava realmente bonito. Era morena e de uma opinião neutra, não reclamava e nem deixava claro gostar do circo, mas era um bom membro.

Prosseguiu nas ordens de Mãe Ursa sem contribuir em nada para Acácia. Ficou rodando em volta do caminhão central, não lembrava onde ficavam os galões de gasolina. Se apoiou perto do caminhão e começou a ponderar, foi quando olhou para a porta aberta. Uma pontinha, que logo cresceu, de curiosa vontade de entrar. Era algo tecnicamente proibido, afinal, apenas a motorista Yancy, Hamish e alguns palhaços podiam entrar, ninguém além tinha sido convidado. Na ponta dos pés pisou a escada e deu uma boa olhada. O cheiro era agradável e tudo estava tão bem organizado, Yancy cuidava bem dali. Era muito calada, passava seriedade e tomava conta do dinheiro e por um tempo Idára pensou que o motivo de ninguém entrar no caminhão central era por conta disso, "mas Yancy dormia no trailer de trás"; a mente estava descumprindo tudo outra vez. "Havia outros caminhões e nós podíamos ir aos outros trailers", prosseguiu e veria se chegaria em algum lugar. Deu uma olhada rápida no ambiente, foi quando bateu o pé num baú. Ele estava embaixo de um armário empoeirado. Abriu-o, retirou o plástico que havia por cima e mexeu na única coisa que haveria ali, fotografias. Procurou por achar alguma moça que daria a ideia de ser sua mãe e não achou nenhuma, apenas uma curiosa foto de cinco crianças e um senhor de chapéu branco que estava rasgada do lado.

Em todos os cafésWhere stories live. Discover now