Capítulo 4

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Todos os anos, no mês de janeiro, voltava ao haras. E, todos os anos era tratada como lixo por meu pai, porém já estava acostumada a tal tratamento. Nunca contei a ninguém sobre como meu pai fazia questão de ofender-me, pois tinha medo que ele ou outra pessoa me proibisse de voltar, e se isso acontecesse, eu nunca mais veria o Lucas e sua irmã, a qual tornou-se uma grande amiga.

Assim o tempo foi passando e tinha certeza de que chegaria o dia em que não teria mais desculpas para voltar ao haras.

Depois que fiz dezessete anos, Lucas passou a agir de forma diferente, ele já não me abraçava e procurava manter certa distância, no entanto sempre me tratou com muito carinho e respeito. A cada ano ele tinha uma garota diferente, e a cada ano eu tentava me convencer de que eu era forte e não sofreria. Era cada vez mais difícil imaginar o Lucas beijando e abraçando cada uma daquelas garotas.

Sempre que ele aparecia ou saía com uma mulher, eu passava a noite chorando e desejando que ele me amasse, mesmo sabendo que era impossível me amar. Se nem minha mãe e meu pai  me amavam, como poderia o Lucas, um rapaz lindo e rico gostar de mim de maneira diferente?

Lembro que minha mãe sempre gritava comigo, dizendo que eu era um grande erro e não deveria ter nascido, pois só atrapalhava a vida dos outros. Ela me disse isso tantas vezes que acreditei, ainda mais com meu pai afirmando a mesma coisa.

Então eu sabia que não era digna de amor.

Minha vida nunca foi fácil, as únicas coisas boas que eu tinha eram meus amigos e o Lucas. Ah, o Lucas! Como eu o adorava. Com o tempo meu sentimento por ele tornou-se ainda mais forte, acho que me apaixonei por ele na primeira vez que o vi, naquela época eu não tinha ideia do que eu sentia, mas eu sempre o vi como um herói, e mesmo quando criança eu sonhava com ele, e o que era um amor inocente, uma amizade sincera, foi se transformando em algo muito forte e intenso. A cada dia tinha mais certeza de que Lucas seria meu único amor, eu dei meu coração a ele e não poderia pegá-lo de volta.

Mesmo com tantas dificuldades e com meu coração ferido, continuava a voltar. Com dezoito anos, estava me sentindo triste, pois finalmente seria minhas últimas férias no haras e mesmo assim não ficaria o mês todo, pois teria uma apresentação de patins para fazer.

Sim eu entrei para uma equipe de patinação, fora graças a mãe da Vicky que consegui realizar esse sonho, minha mãe nem tinha ideia do que eu fazia, e as únicas pessoas que sabiam disso eram minhas amigas Vicky, Mel, Gabriela e nosso amigo Eric. Eles eram muito importantes para mim, e tínhamos uma amizade muito forte e sincera.

Gostaria de convidar o Lucas e a Stella para verem minha apresentação, mesmo sabendo que eles não iriam, talvez Stella pudesse pedir a sua mãe para levá-la, mas Lucy, sua mãe era uma mulher deveras ocupada. Entretanto, queria contar para o Lucas sobre tudo o que fazia, eu ainda não havia contado a ele e nem a sua irmã que estava patinando e que poderia até mesmo participar de campeonatos, eu estava muito empolgada e pensava em dividir com ele esta minha alegria.

Dois dias após chegar ao haras ainda não tinha visto o Lucas e nem a Stella, perguntei a tia Ivete por eles, então ela me informou que Stella viajou para o nordeste, a contragosto, com sua tia e prima, a qual ela odiava, e que o Lucas trabalhava nos negócios da família e só apareceria no final de semana. Então fiquei contando os dias para vê-lo.

Um dia estava passeando pelo haras e ouvi duas mulheres conversando, eu sabia que era falta de educação, mas não pude resistir a ouvir, afinal elas falavam do meu Lucas.

— O Lucas gosta mesmo é de mulheres ousadas, que tomam a iniciativa — disse uma delas.

— Será mesmo?

— Sei do que estou falando, ele não gosta do tipo tímida, você tem que chegar e avançar, é disso que ele gosta — afirmou com riso na voz.

— Como você sabe disso? — perguntou a outra.

A mulher riu alto.

— Minha querida, foi assim que ele me comeu no celeiro — admitiu soltando outra risada.

Fiquei muito enciumada de saber que Lucas havia feito sabe-se lá o quê com aquela mulher. Elas foram andando e não pude ouvir mais nada, então fiquei pensando. Será que se eu tomar alguma iniciativa o Lucas pode me ver de maneira diferente? Pensei e fui andando para casa, eu teria que perder totalmente a minha timidez, e se houvesse alguma maneira de conquistar o Lucas, eu poderia muito bem me aproveitar. Com um frio na barriga e um pouco de esperança continuei caminhando.

Decidi que eu tentaria fazer algo com o Lucas assim que ele chegasse, afinal era meu ultimo ano ali, se tivesse uma chance de conseguir que ele me notasse não como uma menina e sim como mulher, eu agarraria essa chance com unhas e dentes.

Na sexta à tarde Lucas chegou e veio me procurar para me cumprimentar. Eu estava sentada na minha árvore, e assim que o vi me levantei e fui abraçá-lo. Senti que ele endureceu o corpo, como se não quisesse me tocar.

— Lucas, que saudade — saudei e me afastei dele.

Ele sorriu e me olhou com carinho.

— Menina Karen! Você a cada ano está mais linda — elogiou me deixando feliz e ao mesmo tempo envergonhada.

Senti meu rosto corando e sorri sem jeito.

— Estou a mesma coisa.

— Você parece mais crescida — comentou e passou os olhos por meu corpo.

— Claro, não sou mais nenhuma criança.

— Pode ser — murmurou muito pensativo e voltou seus olhos aos meus.

Estava achando estranho o comportamento do Lucas, ele parecia não querer ficar perto de mim, mas me olhava com fascínio. Ele passou a ter esse comportamento há algum tempo, poderia ser impressão minha, mas alguma coisa nele não estava certo.

— Vai ficar o mês todo aqui? — perguntou enquanto dava um passo para trás.

— Não, desta vez vou ficar por pouco tempo — revelei um tanto triste, pois não poderia ficar mais tempo com ele.

— Entendo. — Ele estava muito inquieto, alguma coisa o incomodava. — Eu vou dar uma olhadinha no Mavrós, quer ir comigo? — Mavrós era seu cavalo, ele era um lindo garanhão negro e Lucas era louco por ele.

Eu sorri e acenei com a cabeça.

— Claro, eu ainda não o vi desde que cheguei.

Ele sorriu.

— Então vamos! — exclamou e virou-se em direção aos estábulos.

Fiquei alguns segundos parada o observando, eu suspirei fundo e minhas mãos suaram.

É agora minha chance de tentar alguma coisa e mostrar que não sou nenhuma criança, pensei.

Afinal o que de ruim poderia me acontecer?

Minha PerfeiçãoWhere stories live. Discover now