A savana não era tão cheia quanto a floresta, nem tão seca quanto o deserto. O mato alto era ótimo para passar despercebida; quando ouvia ou via um animal passando, era só se abaixar e o ambiente a ocultava.
Não muito longe, ao sul, começava uma mata fechada semelhante à das onças, onde os tais leopardos moravam, Sahira supôs.
Depois de horas caminhando, a gata sentiu muita fome, mas não via nada para comer além de alguns insetos voando perto ocasionalmente. Só quando o capim começou a rarear e se abriu num campo mais aberto, Sahira viu um ratinho andando. Rapidamente o pegou e matou a fome.
Com a grama mais baixa, ela avançou mais rapidamente, chegando a correr. Porém, não o fez por muito tempo, afinal não dormia bem há quase dois dias, não podia continuar naquele ritmo por muito tempo.
A lua já ia avançada no céu escuro, Sahira apenas caminhava, sem energia para correr, quando ouviu movimento à frente. Apreensiva, procurou onde se esconder em campo aberto, e bingo! Uma árvore logo ali.
Escalou a planta, que não era muito alta, mas ficava acima da cabeça de um leão ou de um tigre.
Em menos de um minuto chegaram duas leoas e um tigre debaixo da árvore, mas aquele que chamou a atenção de Sahira era o menor do grupo. Tinha uma cauda longa, orelhas e patas curtas. Atátor! Mas o que ele fazia ali?
-- O que quer que estivesse aqui já foi embora – a leoa mais nova falou num bocejo. O tigre comentou:
-- Patrulhamento de fronteira é o trabalho mais chato de todos. Nunca acontece nada.
Enquanto os grandes conversavam, Arátor farejava, concentrado.
-- O que acham que era? Um coelho? – perguntou a leoa mais velha.
Arátor murmurou ao ouvido do tigre, que assentiu com a cabeça, e ordenou:
-- Se separem, vamos cobrir um terreno mais amplo.
Os quatro andaram em diferentes direções. Só quando se afastaram Sahira se permitiu respirar, a mera presença deles fora o bastante para deixa-la morrendo de medo, e por um instante achou que Arátor a farejaria. Seu coração quase parou nessa hora.
Esperou um pouco antes de descer, para garantir que não iam voltar, e seguiu em frente. O tigre falara que estavam na fronteira do reino de Ekom, então era só uma questão de andar um pouco mais para chegar a Sef.
Antes que percebesse, estava correndo novamente, atravessando grama, pedras, árvores caídas e até um pequeno córrego. Tão animada que estava por imaginar rever o irmão, acabou se distraindo, e não percebeu o tigre correndo não muito longe dela.
Só notou que estava sendo perseguida quando as duas leoas e o tigre fecharam círculo em volta dela. Sahira parou abruptamente e tentou escapar por entre eles, mas Arátor pulou na sua frente.
-- Nos encontramos de novo – ele ronronou maliciosamente, enquanto Sahira recuava alguns passos. Não tinha areia nem nada do deserto que pudesse usar com magia. Mas ainda que tivesse, a pequena gata não era páreo contra quatro felinos maiores.
-- Nossa, ela é igualzinha ao gato que está na toca – uma das leoas olhava divertida para Sahira – Até o tamanho é o mesmo.
Estava confirmado que era Sef, não podia ser sua mãe se tinham o mesmo tamanho. Sahira encheu a voz de confiança e exigiu:
-- Eu quero ver o meu irmão.
O tigre tentou abafar o riso, mas não conseguiu. Arátor gargalhou em deboche.
-- Olhem como ela fala, "quero ver meu irmão". Por que deveríamos fazer o que você quer em vez de ataca-la agora, que é a punição por invadir terras reais?
Sahira engoliu em seco, assustada, mas pensou rápido:
-- Porque eu tenho uma coisa que o rei de vocês quer. Meu irmão não sabe a magia secreta dos gatos, não é?
As leoas se entreolharam, o que foi a resposta que Sahira precisava. Arátor, porém, se manteve firme:
-- E por acaso você sabe?
-- Sim. Eu sou a mais velha da ninhada, sou eu a herdeira do posto de feiticeira chefe de Bast, então eu sei.
Agora os felinos grandes a encaravam intrigados. O tigre perguntou baixinho a Arátor:
-- Será que o que ela diz é verdade?
-- Talvez. Ela é realmente talentosa em magia, e o outro gato não parece saber de nada, você ouviu os gritos do rei.
-- Então vamos falar com sua majestade – a leoa mais jovem foi até Sahira e a pegou como se fosse comê-la, e saiu andando, carregando a gata na boca como uma caça.
Eles começaram a correr, Arátor ao lado da leoa com Sahira.
Só então a jovem gata percebeu o efeito que suas palavras poderiam ter sobre o irmão. Sef desconhecia a mágica que Ekom desejava tanto, e com sua chegada ele se tornava descartável.
O que o ligre faria?
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A Feiticeira de Bast
Teen FictionSahira é uma gata da terra de Bast, um oásis no deserto, povoado por gatos. Sendo uma gata negra, ela é dotada de magia e está em treinamento para se tornar uma maga. Um dia tigres e leões invadem sua casa em nome de um rei ligre tirano, e Sahira pr...