Capítulo 22 - O jogo de Ekom

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Sirhan pegou Sahira pelo cangote e a tirou da arena. Ela procurou Arátor no meio do caos que rapidamente crescia.

-- Espere aí...

Conseguiu ver apenas a ponta da cauda alaranjada desaparecendo atrás de um grupo de leões e onças em combate.

A leoa que acompanhava Sef apareceu ao lado de Sirhan, com o pequeno gato na boca também. Os dois correram para o mesmo lugar, e deixaram os gatos perto do tronco ressecado de uma árvore caída.

-- Fiquem aqui – Sirhan orientou, e afastou-se junto da leoa. Sef comentou para a irmã:

-- Acho que ele e a Kiala já se conheciam.

Os dois irmãos permaneceram escondidos enquanto o conflito se desenrolava. Era uma cena impressionante, onças e jaguares avançavam como se fossem um só felino e lutavam ferozmente.

Apesar de serem um pouco menores que os leões, as onças lutavam em pé de igualdade contra eles, algumas eram até mais fortes.

-- Que incrível! – Sef balbuciou maravilhado, sem conseguir desviar o olhar – Quem são eles?

-- Onças das terras do oeste – Sahira respondeu, igualmente animada – E a Iana veio também!

A leoa branca derrubava um tigre num ataque conjunto com um jaguar.

O coração de Sahira deu um salto ao ver que alguns leões súditos de Ekom passavam para o lado de Sirhan, reforçando o grupo. Mas faltava algo ali, onde estava Ekom? O rei não devia lutar ao lado de seu povo?

-- Será que ele fugiu? – murmurou para si mesma. A resposta viria em breve.

O rei derrubou três onças de uma vez, jogando-as no chão como se fossem gatinhos. Uma leoa e um jaguar pularam em suas costas, e com um rápido movimento das patas traseiras, o ligre os repeliu.

Ekom era uma máquina de batalha, por onde passava abria caminho entre os felinos inimigos. Ver o rei lutar com tanta energia renovou os ânimos de seus súditos, que avançaram com mais vigor.

Sahira cravou as pequenas garras no chão na tentativa de acalmar o nervosismo. As onças começavam a perder terreno, principalmente por causa dos tigres, que por serem maiores exigiam mais felinos para caírem.

Sirhan tentava manter os outros sob controle, mas já começava a recuar também. Sahira não aguentou.

-- Preciso fazer alguma coisa para ajudar.

-- O que podemos fazer? Somos gatos entre leões enormes – Sef estava encolhido.

-- Não sou apenas uma gata, sou a jovem feiticeira mais talentosa de Bast! – Sahira estufou o peito, e com toda a coragem que tinha em seu pequeno corpo, correu na direção dos leões e tigres.

O chão da savana não tinha areia tão solta quanto a do deserto ou da Caatinga, mas foi o bastante para erguer uma nuvem de um metro e meio de altura no meio do grupo de leões, que se desorientou.

-- Mandou bem, baixinha – Sirhan se afastou da confusão – Vamos sair daqui.

-- Meu irmão ainda está ali.

O leão foi até Sef e Kiala pegou Sahira. A nuvem de areia começava a baixar e as onças se afastaram, prontas para bater em retirada.

-- Ei, não vamos ficar? Temos que lutar, o Ekom precisa cair.

-- Nós vamos pensar no que fazer com calma – Anami chegou – Precisamos recuar para nos reorganizar. Eles são mais numerosos.

E pior que eram mesmo. Chegavam mais leões, vindos de outras partes do reino, com certeza. Em breve seriam dois deles para cada jaguar.

-- Mas vamos voltar o mais rápido possível, certo? – Sahira pediu.

-- Não precisarão voltar, porque nem vão sair – dois tigres cercaram a leoa e a onça negra – Onde está o bastardo?

Kiala pôs Sahira no chão lentamente e a empurrou para trás com a pata. E num rápido movimento, pulou em cima dos tigres.

-- Corra para longe daqui – Anami falou antes de partir para a briga também.

Sahira não correu, só conseguiu ficar parada olhando a balança pender agora para o lado de Ekom. As onças recuavam, cansadas, e ainda por cima cercadas pelos leões recém chegados.

Então escutaram rugidos, que não pareciam ser de leões, tigres ou onças. Sahira sentiu algo passar ao seu lado tão rápido que jogou vento em seu rosto, e quando piscou, um felino de pelo manchado pulava em cima de um leão e o derrubava.

Outros iguais a ele surgiram e atacaram os leões e tigres, na velocidade de águias. Só um pulo desses felinos esguios já derrubava.

-- Quem são esses? – Sahira olhava para eles maravilhada.

-- Guepardos – um deles parou ao seu lado. Manchas compridas percorriam de debaixo dos olhos até a boca – Ao seu dispor.

Os tais guepardos foram uma infeliz surpresa para os felinos de Ekom, que rapidamente foram cercados. Aquele perto de Sahira, aparentemente o líder, entrou no cerco e se dirigiu ao ligre:

-- Somos apenas os primeiros a chegar, majestade, tem um bando de leopardos vindo também.

-- Como se atrevem a invadir nosso território? – Ekom rosnou furioso.

-- Você tomou nosso território, Ekom, e estava prestes a fazer o mesmo com os leopardos. Só estamos lutando para ter de volta o que foi roubado de nós. Sugiro que devolva e se retire de nossas terras.

Sirhan apareceu com Sef na boca. Depois de ser posto no chão, o gato correu ao encontro da irmã.

-- Você agora é minoria, Ekom. Nem todos os seus tigres ou leões mais fortes podem contra onças, guepardos e leopardos juntos.

-- Veremos. Lutaremos até o último felino se necessário – o ligre rosnou.

Aquilo com certeza não era o tipo de coisa que Husani diria, ou que nenhum líder deveria falar. Sirhan anunciou para todos:

-- Aqueles que não quiserem mais fazer parte da loucura de Ekom são bem-vindos a se unir a nós.

Após um instante de silêncio em que aparentemente ninguém sequer respirou, vários leões e alguns tigres lentamente passaram para junto dos felinos estrangeiros, sob o olhara perplexo do ligre. Agora ele tinha menos soldados ainda, mas o fogo em seus olhos indicava que ele não pretendia dessitir.

Por isso foi uma surpresa para todos quando ele anunciou calmamente:

-- Eu me rendo.

A Feiticeira de BastWhere stories live. Discover now