Capítulo 27 - Shaya e Arátor na Caatinga

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Arátor correu durante horas. Quando aquelas onças invadiram Xangô e começaram uma briga com os felinos de Ekom, o jaguarundi aproveitou o caos para fugir e se distanciar o máximo possível.

Desde que aceitara uma aliança com Ekom, sabia que ele não era muito confiável, mas não esperava ser traído daquela forma.

Mas o próprio Arátor não pretendia trabalhar para ele para sempre de qualquer forma.

Quando percebeu, chegou ao Rio Verde, e faltando ainda algum tempo para amanhecer, o felino se deitou ali mesmo e imediatamente pegou no sono.

Ao nascer do sol, acordou, e mesmo com a dor de estômago, vazio há horas, ele atravessou o caminho de pedras emergidas para o outro lado do rio. Felinos sentimentais teriam ficado felizes, se sentiriam mais seguros ou completos por voltar à sua terra natal, mas Arátor não era assim.

A Caatinga era só mais um lugar onde podia ficar. Poucos estrangeiros se aventuravam lá.

Caçou um pequeno calango para enganar a fome e se deitou no alto de um galho para lamber as feridas. Mas nem todas podiam melhorar dessa forma.

Ele fraquejara durante a briga, tremera na base e deixara uma pequena gata, praticamente um filhote, defendê-lo.

Seu orgulho se ferira profundamente ao não reagir enquanto a gatinha se recusava a cair sem lutar. Ele enterrou o rosto entre as patas dianteiras, tremendo de frustração e raiva de si mesmo.

-- Ei – alguém chamou e Arátor olhou para baixo. Uma fêmea de maracajá o encarava do chão – Tudo bem aí?

-- Vá embora – ele respondeu emburrado. Não tinha paciência para conversar besteiras.

-- Mas dá para ver que você está ferido, precisa de ajuda.

-- Não pedi nada de você.

-- E dá para escutar o seu estômago roncar daqui. Vou trazer comida e depois ajudo com seus machucados – ela o ignorou e foi até outra árvore mais alta, onde um macaquinho sagui catava piolhos na própria cauda.

Em vez de subir e pular em cima do primata, como se esperaria de qualquer felino, a maracajá ficou escondida nas raízes. Arátor se perguntava o que ela pretendia quando a felina abriu a boca e fez um barulho igual ao produzido pelo sagui.

O jaguarundi observou de olhos arregalados ela imitar com perfeição o chamado agudo do animal e atraí-lo para baixo. O macaquinho desceu, achando que encontraria outro de sua espécie, mas encontrou só uma maracajá, que pulou nele.

-- Você não caça? Só arma emboscadas? – Arátor perguntou quando ela voltou com a caça.

-- Às vezes é mais fácil emboscar, mas eu acho caçar bem mais divertido.

Ainda com um pouco de má vontade, ele aceitou a comida oferecida. Enquanto comia, a maracajá sorria e olhava a paisagem, e só quando ele terminou ela indagou:

-- Você é o Arátor, não é?

-- Posso ser apenas mais um jaguarundi – ele recomeçou a se lamber.

-- Você é bem famoso nessas bandas. E se não fosse ele, negaria na hora, não é? – ela riu para si mesma – Meu nome é Shaya, e se não tiver para onde ir, pode ficar comigo enquanto se recupera.

Arátor estranhava cada vez mais aquela maracajá. Mas, pensando bem, não seria nada mau ter alguém para ajudar enquanto suas feridas saravam. Ela era boa para conseguir comida e escalava mais rápido que um esquilo.

Ele podia viver ali com Shaya numa boa por alguns dias.

A Feiticeira de BastWhere stories live. Discover now