capítulo 19

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——— every time I try to bring it down
you always turn my hand around








Três dias sendo obrigada a ficar na cama para repouso e Thalassa se sentia pronta para se jogar no mar novamente de tanto tédio — obviamente aquilo era uma brincadeira, levando em consideração que a culpa e terror ainda corriam seu peito ao lembrar-se do pânico e caos que se instauraram no barco nos momentos de terror durante o ataque do leviathan. Não estava mais na enfermaria, mas Helion e Trovard a obrigaram a repousar na cama impedindo de fazer o que queria, levantar-se e ir pedir desculpas para o Círculo Íntimo, seus dias naquela cama a fizeram refletir sobre absolutamente tudo. Elain havia passado um dia inteiro ao seu lado, onde falou sobre diversos assuntos de sua vida desde que suas flores favoritas eram dálias embora seu aroma favorito fosse o das peônias, a Capitã recebeu uma verdadeira aula de botânica e achou incrível a forma apaixonada e devota que a grã-feérica se referia a jardinagem. Em determinado momento Thalassa sentiu uma presença a mais no quarto, e quando notou sua sombra mais escura e uma leve carícia em sua pele deu-se conta de que algumas sombras do Azriel estavam ali, não sabia se com consentimento do macho ou não. Makaela também falou dos seus hobbies e discretamente abordou o assunto de Elain aprender a se defender; ela não queria pressionar a feérica, mas querendo ou não em poucos dias ela criou um apego grande em Elain e se preocupava com a segurança da grã-feérica, quando a mesma disse que estava pensando positivamente sobre o assunto um sorriso brilhou nos lábios de Thalassa. 


Ela constantemente recebia visitas de sua tripulação junto à Helion e Aleksander, mas Elain fora a pessoa que mais ficou ao seu lado naqueles dias, a grã-feérica levava chás e biscoitos e até alguns livros que Thalassa pedia; a Capitã riu quando a mais nova contou que Koko havia deixado que usasse sua cozinha a vontade contato que ela ensinasse a receita dos deliciosos biscoitos de polvilho que Elain fizera para Thalassa. Ela não o julgava já que os biscoitos saborosos até derretiam na boca de tão saborosos. Em seu tempo juntas diversas coisas haviam sido faladas, desde o noivado com o humano maldito de Elain, até as aventuras de Thalassa em pântanos e mares em busca de tesouros. 

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No quarto dia em que era suposto ser o seu repouso Thalassa levantou junto ao sol, sua mente indo e voltando em diversos eventos. Nenhuma leitura distraía sua cabeça dos pensamentos confusos nem mesmo as pesquisas sobre o Quartzo de Carspar, nada a afastava da memória de Hedia sobre si destilando veneno. Não, aquela não era sua esposa; certamente não a mesma mulher que fez votos no alto de um campo tendo céus e mares como testemunha. A Capitã do Nostradamus, sabia que sua mente deturpada criava tudo aquilo, fazia ver a esposa morta, fazia escutar o choro da filha, e mesmo assim com toda aquela noção, ela simplesmente não conseguia seguir em frente. Toda dor e lágrimas eram incapazes de irem embora porque Thalassa Makaela não conseguia lidar com seu trauma, fechava os olhos tentando se lembrar apenas das partes boas, mas sempre quando os olhos oceânicos encontravam a escuridão tudo que ela podia sentir era o peso constante do eterno vazio que a morte de Hedia e Agnes causaram em seu coração. 

De uma forma deturpada o reinado de Amarantha trouxe os melhores e piores dias para a vida de Thalassa. 

Thalassa levantou-se de sua cama confortável ainda de pijama e agarrou as muletas — embora elas já não fossem tão necessário ainda ajudavam em certos momentos, como quando acordava e a perna ainda estava meio dormente — mancando para o banheiro, seu pijama foi largado no chão e aguardou que a banheira enchesse; saiu do banheiro e encarou a si mesma nua no espelho de seu quarto, a visão de seu corpo fez lágrimas brilharem nos olhos de mar, a aparência da Capitã era algo que muitas vezes a deixava insegura e naquele momento ela se sentia como lixo em seu próprio corpo. As cicatrizes a faziam sentir-se como um vaso quebrado mal consertado, as peças estavam juntas mas não significava que funcionava como antes; havia hematomas roxos, vermelhos e amarelados espalhados em todo o seu tronco principalmente na coxa esquerda onde agora se encontrava a grotesca cicatriz, mas o pior era na área das costelas que mesmo curadas possuíam uma dor fantasma. Por incrível que pareça ela parecia ter emagrecido no mínimo cinco quilos nos últimos três dias, mas não de uma forma bonita — mas algo que beirava o doentio. Seus cabelos estavam secos e embaraçados, a raiz platinada parecia ainda maior e ela não quis pensar no porquê daquilo, seus rosto parecia estar com as bochechas fundas e enormes bolsas escuras circulavam seus olhos e sua pele outrora com um leve tom dourado agora beirava o cinza. Seu desejo foi quebrar o reflexo por lhe mostrar a verdade. 


Corte de Sombras e Marés Where stories live. Discover now