Capítulo 33

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A gente tende a repensar a vida depois de uma certa idade

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A gente tende a repensar a vida depois de uma certa idade. Pelo menos, foi assim comigo. Eu tenho 32 anos, em breve farei 33, e a verdade é que eu sinto que desperdicei todos os meus anos.

Não me entenda mal, eu amo os meus filhos de paixão — acho que, se não fosse por eles, eu já teria partido dessa para uma melhor, — porém, eu reconheço que fui inconsequente. Por muito tempo até cheguei a me isentar da culpa, mas era impossível. A escolha foi minha.

Eu sempre quis ser mãe. Nunca acreditei em príncipes encantados, mas acho que, parte de mim, sempre quis encontrar um. Porém, o meu sonho se realizou de uma forma um tanto quanto distorcida.

Eu conheci o Victor quando eu estava quase me formando no ensino médio. Eu tinha 17 anos e ele, 24. Conheci-o em um baile funk que eu frequentava escondida dos meus pais com alguns amigos.

Não posso negar que gostei dele desde a primeira vez que o vi, mas hoje eu me sinto uma idiota. Quero dizer, hoje, eu vejo que ele não tinha qualidade nenhuma e que o que eu gostava nele não passavam de frutos da minha própria imaturidade.

Eu queria viver uma aventura, sair da vida que eu julgava medíocre. Então comecei a faltar ao cursinho de inglês para ficar com o Victor. E assim foi até que um dia eu passei um tremendo mal e fui parar no médico: eu estava grávida.

Aquela foi certamente a primeira de muitas vezes que eu assisti o meu castelo de areia se desfazer diante dos meus olhos. Todos os meus segredos estúpidos vieram à tona sem que eu tivesse a mínima chance de escondê-los. Foi um efeito dominó.

Descobriram sobre Victor, sobre os bailes, sobre minhas bebedeiras e sobre a maconha que o meu "príncipe encantado" havia me ensinado a fumar.

Lembro de cada palavra que meu pai me disse naquele dia como se tivesse sido hoje. Ele havia acabado de me dar o meu primeiro carro e estava feliz de eu estar cursando odontologia. Mas então eu lhes joguei um balde de água fria.

Hoje, como mãe, eu compreendo bem, mas, na época, mesmo arrependida, eu não entendi o porquê de tanto "drama".

Agora, aqui estou eu, vivendo com o que me resta.

Eu sei que tem gente por aí que acha que sou feliz. Sim, eu sou dona de uma clínica que está indo de vento em popa. Sim, eu tenho quatro apartamentos em um dos melhores prédios da cidade. Sim, eu também tenho dois carros do ano. Enfim.

Mas o que isso me trouxe?

Eu sei que soa clichê dizer que dinheiro não traz felicidade e eu poderia passar facilmente por hipócrita para a maioria das pessoas. Alguns de vocês poderiam dizer: "É fácil dizer que dinheiro não é tudo quando você o tem". Talvez. Mas falo de mim. Eu não sou feliz, eu finjo ser.

Talvez seja puro pessimismo da minha parte, mas tenho tido cada vez mais certezas de que a vida é feita de fingimentos, porque somos fracos demais para encarar a realidade.

Então, todos os dias pela manhã, eu me disfarço de mulher bem-sucedida, sem problemas, sem defeitos, porque a verdade é que eu já não tenho coragem para me revelar como sou a ninguém.

Quero dizer, quase ninguém.

Antes de tudo, quero pontuar que, desde que Victor fez o que fez, eu prometi a mim mesma que não iria me envolver emocionalmente com mais ninguém. Decidi que daria atenção tão somente para os meus filhos. E até mesmo firmei o propósito de fazer laqueadura assim que meu bebê nascesse.

O amor que se dane! — eu praguejei certa vez.

Mas então eu conheci o Raul...

Até me dá vontade de rir quando penso nisso. Que eu sempre fui boba no quesito amor, isso não é segredo para ninguém. Deve haver quem pense que eu sou difícil, mas a verdade é que eu fico como uma criança quando estou apaixonada, eu reconheço. E, pensando bem, talvez esse seja o meu defeito.

Mas não é que eu esteja apaixonada. Quero dizer, é cedo demais para isso, não é? E eu, honestamente, não sei se quero emprestar o meu coração ao amor outra vez. Além disso, por Deus, ele é muito novo para mim. Apesar de Raul ser o rapaz de 24 anos mais sábio que eu já conheci, ainda assim, nossos quase 9 anos de diferença insistem em me deixar incomodada.

Ademais, estava o fato de que ele, provavelmente, quer recuperar o tempo perdido agora. Afinal, ele foi morar na rua com 19 anos. Não consigo imaginar tudo que ele perdeu. E eu aqui, com uma bagagem enorme, não teria jamais o direito de ocupar a sua vida. Qual o rapaz de 24 anos que iria querer uma mulher de quase 33, com três filhos e recém-divorciada? Não. Ele merece algo melhor.

O Raul é definitivamente a melhor pessoa que eu já conheci em toda a minha vida e não há um só dia em que eu não pense em maneiras de como dizer isso a ele. Mesmo que nós dois nunca cheguemos a algo mais, só a sua amizade já é valiosa.

Ele se desculpa por tudo quando Victor não se desculpava por nada.

Ele se preocupa com tudo quando Victor não se preocupava com nada.

Até para os meus filhos ele dá a atenção que o pai quase nunca deu.

Mas, apesar das peças se encaixarem perfeitamente na minha cabeça, quando volto os olhos para a realidade, o cenário da minha vida parece muito mais caótico do que o imaginado. Não me sinto pronta para amar alguém outra vez. Aliás, mais do que isso, quem colocou na minha cabeça que Raul me vê com esses olhos? Talvez, eu apenas esteja iludida.

No entanto, uma pergunta ronda a minha cabeça dia e noite: quem seria o culpado da minha ilusão? Eu, por ainda agir como uma criança diante do amor? Ou ele, por não ter me dado a chance de me proteger contra o seu encanto?  

O Malabarista - ConcluídaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora