Capítulo 21

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  Dois meses se passaram. Uma carta de sir Benjamin chegara há alguns dias, avisando que estava voltando para casa, por uma semana, e voltaria para o regimento. A sua carta era saudosa e alegre, que me deixou ansiosa à sua espera.

A sua chegada aconteceu numa manhã de quinta-feira. Estava frio e chuvoso, o suficiente para querer continuar na cama por um dia inteiro. Ao invés disso, eu me levantei e me arrumei para receber meu marido, que chegou com um buquê generoso de flores silvesrees das mais diversas cores e aromas, e um abraço muito apertado. Sir Benjamin estava mais magro.

— Pensei que não a veria mais, minha doce Beline. Cada dia que se passava parecia uma eternidade. — Ele diz, enquanto se serve do chá — Como tem passado?

— Aprendi a cozinhar!

— O quê?

— Isso mesmo. Agora sei cozinhar.

— Temos cozinheiras.

— Sim, mas eu estava em completo tédio. Cozinhar me rendeu momentos frutíferos. Este pão, por exemplo, fui eu quem fizera na noite passada.

— Está delicioso. Então tenho uma esposa realmente prendada. Estou muito orgulhoso.

— Fico feliz que tenha gostado.

— E o que mais tem feito na minha ausência, além do aperfeiçoamento na cozinha?

— Visitei minha mãe, e eles também me visitaram. Prometi que faria um jantar com todos reunidos quando você voltasse.

— Faremos isso. Enviarei uma carta convidando-os para um jantar e alguns uns dias conosco. O que você acha? Podemos juntar as nossas famílias.

— Tudo bem. Para mim, está ótimo.

Sir Benjamin passou a tarde descansando no quarto, enquanto fiz alguns doces e bolos na cozinha. Quando ele acordou, eu estava indo à biblioteca ler um pouco, e escutei seus passos descendo os degraus da escada.

— Descansastes bem? — Perguntei.

— Estou novo em folha. A viagem foi bem exaustiva.

— Imaginei. — Ele se aproxima e segura minhas mãos. — Fiz bolos e biscoitos, além de um doce famoso em Londres, o crumble. Posso pedir para lhe servirem com chá.

— Aceitarei feliz, se me acompanhar.

Eu o acompanhei à mesa, e nos servimos. Ele ficou maravilhado com as coisas que aprendi a fazer com as cozinheiras. A governanta não economizou nos elogios e disse que estou atingindo o nível profissional, além de brincar que eu roubaria o lugar das cozinheiras.

— Arthur também está voltando? — Eu quis saber.

— Voltará em breve. Ele precisou ficar por mais alguns dias.

— Eu ainda não vi Charlotte desde o nosso casamento...

— Podemos visitá-la.

— Acho melhor não. Eu soube que ela anda ocupada com a escolha do pretendente. Parece que recebeu dote. Então, ela se casará em questão de dias, eu acredito.

— Você disse uma vez, que ela tinha sentimentos por alguém.

— Sim.

— Eu o conheço?

— Está curioso?

— Confesso que sim. Você nunca revelou o nome do cavalheiro.

— Não devo esconder-lhe nada, meu marido, mas isso é algo muito pessoal da minha melhor amiga. Só lhe adianto duas coisas sobre ele.

— Quais são.

— É casado e você o conhece muito bem.

— Ela se apaixonou por um homem casado?

Eu me arrependi de ter aberto a minha boca, mas era tarde demais para voltar atrás.

— Ele não era casado antes...

— O seu irmão Louis?

— Deixe para lá. Eu não devo nem confirmar, nem negar, já que não posso revelar a identidade do cavalheiro. Eu só espero que ela seja feliz com sua escolha.

— Pensei em juntá-la ao Sr. Thomas, mas... depois daquela nossa conversa, penso que não é o melhor das minhas aspirações.

— Sr.Thomas é livre, ele pode juntar-se com quem quiser.

Forcei um sorriso e fingir estar focada no meu chá de ervas relaxantes. E relaxar era tudo o que eu precisava naquele momento.

Três dias depois, nossos familiares nos visitaram. A casa ficou tão cheia que eu havia me esquecido de como era ter uma manhã tão movimentada. Senti falta de tudo isso. Do cheiro do café da manhã misturado com outros aromas. Das vozes misturadas em assuntos aleatórios e cheios de energia.

— Como é cuidar de uma casa sozinha, querida Beline? — Perguntou a Sra. Halfenaked.

— No início, eu me senti um pouco perdida, mas a Sra. Elsie me ajuda bastante.

Ela levantou as sobrancelhas, analisando tudo o que estava posto à mesa.

— Eu soube que você andou envolvida na cozinha...

— Sim, é algo que tem me feito bem, e fui útil dentro de uma casa gigantesca e vazia. Além da leitura, música e bordado, eu pude encontrar na cozinha o preenchimento desse vazio.

— Uma senhora casada e com tantos empregados, não precisa se envolver na cozinha ou qualquer outra atividade doméstica, querida.

Respirei fundo, tentando encontrar a calma que eu perdia lentamente, com os desdéns da minha sogra.

— Acredito que isso fica a critério de escolha de cada uma. Só sei o que devo fazer do meu tempo livre, e gostaria que respeitasse minha escolha, senhora. Seu filho passa muito tempo no seu ofício, e quem sou eu para reclamar. No entanto, com a sua ausência e a casa vazia, eu pude encontrar algo mais para passar o tempo, e sou grata por me sentir útil. Para mim, está sendo prazeroso vê-la saboreando do pernil assado que eu mesma preparei.

A Sra. Halfenaked arregalou os olhos para o pernil que passei a manhã toda preparando, antes da sua chegada. Minha mãe, que ouvia tudo em silêncio, acabou se engasgando e a ofereceram água. Já sir Benjamin, meu marido, sorria satisfeito.

Após o almoço, ficamos na sala principal tomando café e ouvindo Leo tocar no piano. O silêncio envolvido com a música nos trazia uma certa harmonia. Sir Benjamin segurava minha mão todo o tempo, como se temesse que eu fugisse.

Em nosso quarto, em nossa quarta noite, desde o seu retorno, nos trocamos e fomos para a nossa cama. Ele não me tocou desde que voltou. Acho que esperou por sinais meus, ou sentir que eu estaria à vontade com a sua presença.

— Adorei o nosso almoço e de como enfrentou a minha mãe. Fiquei surpreso com a sua ousadia. — Ele comento, em voz baixa perto do meu ouvido.

— Eu não queria ser rude, mas achei que ela deveria saber que esta é minha casa e meu espaço. E que respeitasse as minhas escolhas como sua esposa. Não estou fazendo nada errado. Estou?

— Não, não está. Às vezes, ela passa do limite mesmo.

— Mas acho que devo me desculpar com ela depois.

— Não faça isso, ou ela pensará que pode controlá-la. Eu amo minha mãe, mas detesto seu apreço por controle.

— Você nunca mencionou sobre isso.

— Não tivemos a oportunidade de conversar muito, querida.

Olhei para ele e vejo seus cabelos acobreados com a luz da lareira. De volta, recebi o seu olhar furtivo. 

BelineWhere stories live. Discover now