VOCÊ NÃO ME DÁ MEDO

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(...) Alice seguia o coelho branco, mas o perdeu de vista. Perdida encontrou um gato e perguntou "—Sr. Gato, qual caminho devo seguir?", e o gato lhe respondeu: "— Depende de onde você quer chegar". Disse ela aflita. "— Mas eu não sei aonde quero chegar!", o gato então falou: "— Se você não sabe aonde ir qualquer caminho serve" (Alice no País das Maravilhas, Lewis Carrol).

"Quanto será que essa brincadeira vai custar?!", era o que preocupava Olívia na noite anterior, sentada no restaurante esperando por Gerard que havia ido ao banheiro. Pierre dizia que os catalães dividem a conta. Olívia apertou a bolsa nas mãos como se assim fizesse aumentar a quantidade de dinheiro que havia ali. "— Vamos embora?", Gerard disse ao voltar. "— Mas não trouxeram a conta!", ela observou. "— Não se preocupe, Olívia", e sorriu dando uma piscadela.

— Droga, estou atrasada! — gritou para si mesma e saltou do colchão estirado na sala. Gerard logo chegaria para buscá-la.

Como um flash passou pela pilha de objetos e sacolas amontoados no caminho. "Minha vida bem resumida: uma penca de coisas para jogar fora reorganizar e vários espaços vazios a serem preenchidos". Tirando as roupas de dentro das caixas para todos os lados avistou seu par de botas e caminhada. um pote de vidro. Havia uma folha de caderno dobrada dentro. Lista para o Universo, dizia o título escrito em caneta azul. Olívia reconheceu a própria caligrafia e do que se tratava. Uma vez assistiu no Youtube, uma atriz famosa ensinar como atrair as coisas que queria. Segundo ela, era só colocar tudo no papel e mentalizar para que o universo tornasse real. Olívia leu, e se deteve no ponto cinco:

5. O homem perfeito: carinhoso, prestativo, responsável. Alguém com quem eu possa falar de tudo. Que seja esportista e que aprecie caminhadas. Que seja calmo. valorize a família e que respeite minha cultura.

— Aff... Que pretenciosa, Dona Olívia! Como se com algumas palavras em um papel você conseguisse mudar a sorte!

O celular apitou. Gerard estava de caminho. Chegaria em cinco minutos.

Barcelona amanhecia entre névoa. Na esquina do Parque Turó com a praça de Pau Casals, uma impaciente Olívia batia as botas sobre calçada revestida de panot flor de Barcelona, rosa de quatro folhas. Se perguntou se seu idealizador teria sido influenciado pelos símbolos cosmográficos da Mesoamérica; dizem que o mundo dos humanos é dividido em quatro rumos. "Qual era o meu rumo?", se perguntou no momento em que um grupo de pombos madrugadores saia em revoada quando um vulto de uma moto se aproximou.

— Pronta para a aventura? — perguntou Gerard levantando a viseira do capacete.

— Já nasci pronta! — respondeu se concentrando em arrumar o capacete para disfarçar o efeito hipnotizante que os olhos de Gerard.

— Não tem medo de montar na moto de um desconhecido na madrugada, Olívia?
—Você não me dá medo.

Partiram para a montanha de Collserola atravessando as ruas arborizadas com cheiro doce das flores de jasmim dos jardins dos casarões do final do século XX que cercavam as avenidas da zona alta. Quanto mais subiam, menos civilização havia. Vinte minutos depois a cidade como uma maquete; os edifícios da mesma altura, as ruas formando retas verdes perfeitas que corriam da montanha para a praia, uma linha azul royal que que marcava onde acabava a cidade e onde começava o imponente mar.

— Vou te mostrar meu lugar favorito.

Deixaram na entrada de uma estrada de terra estreita e seguiram a pé até outra mais larga, a Carretera de les Aigües.

— Nossa... já sei por que não tem casas em Barcelona. Estão todas aqui em cima! — comentou ela.

Uma neblina fria lambiscava seu rosto. Pararam para observar a vista e tomar fôlego. O cheiro de pinho entrou com tudo e seus pulmões.

A RESPOSTA DE ALINA ( CONCLUÍDO)Onde histórias criam vida. Descubra agora