Capítulo 4

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Lembro da primeira vez que Petrus me tocou. A brisa suave da tarde acariciava os jardins do castelo, onde eu estava durante um dos vários bailes da rainha.

No entanto, o ar de serenidade logo foi interrompido por uma sensação desconfortável. Sentia olhares fixos em mim de maneira indesejada e o peso era como de garras invisíveis presas à mim. O Rei Petrus rondava o jardim de maneira distraída, conversava com seus convidados e me mantinha sempre em seu campo de visão. Aproveitava das pequenas brechas para se aproximar de mim e acariciar com delicadeza o meu braço, como quem esbarra de forma acidental quando não está atento.

Naquela noite, após a maioria dos convidados terem se retirado, fui seguida até o meu quarto onde passei eternos dez minutos na presença desagradável do rei, com suas mãos ásperas que serpenteavam o meu corpo sem despi-lo por completo.

Eu não tinha como pedir ajuda, os empregados não ousariam ir contra uma ordem do seu rei, ninguém iria, nem mesmo a rainha poderia me ajudar. Mais tarde descobri que, mesmo que pudesse, não faria. Sua ira veio sem qualquer remorso para cima de mim, me causou a cicatriz que tenho em meu seio esquerdo hoje. Isso manteria o rei longe de mim, segundo Elora.

As lembranças daquela noite me causam uma ferroada em meu seio, procuro terminar o jantar mais cedo e ir para a cama, na esperança de me trancar e ser ignorada até a manhã seguinte por toda a família real.

Deveria ser perto da madrugada na hora em que acordei com um barulho em minha porta, levanto com cautela e me arrasto até lá. Coloco o ouvido contra a madeira fria para tentar escutar quem estava do outro lado.

- Lady Verena, está acordada? - A voz de Alisha soou do outro lado, eu acalmo minha respiração e abro a porta para que ela entre.

- Você me assustou, o que faz aqui uma hora dessas? - Na verdade, eu nem tinha reparado que ela havia sumido após me deixar na sala de jantar.

- Desculpe se te acordei, escutei alguns empregados comentando sobre os olhares do rei durante o jantar, fiquei com medo de que ele tivesse tentado algo contra você. Está tudo bem? - Seus olhos curiosos e preocupados vasculharam cada centímetro do meu corpo a procura de algo fora do lugar.

- Eu estou bem Alisha, obrigada. Você deveria voltar e dormir, já é tarde.

- Sim, você tem razão, me desculpe minha Lady. Ouvi alguns barulhos nesse corredor e pensei que... Bom, deve ser cansaço. Não hesite em me chamar se precisar de mim. - Com uma rápida reverência e sem esperar por uma resposta, ela partiu.

Fico alguns instantes parada em minha porta, na tentativa de escutar o barulho que Alisha mencionou, mas tudo parecia calmo e quieto, menos por um breve ruído que podia ser escutado se ignorasse o som da minha própria respiração.

Poderia ser apenas um rato, mas decidi averiguar enquanto caminhava pelo corredor, evitava fazer qualquer som. Meu semblante era uma mistura de curiosidade e inquietação, conforme os ruídos se tornavam sussurros.

Subo um pequeno lance de escadas ao final do corredor, encontro uma porta entreaberta, destacada pela pouca luz que irradiava de dentro do cômodo.

Com o coração acelerado, fiquei encostada à parede, mal respirava, enquanto escutava as vozes que ecoavam pela abertura da porta. A voz da rainha, sempre imponente e segura, agora me parecia conspiratória e sussurrante.

- Todos viram o jeito que ele olhava para a menina durante o jantar.

- Você tem certeza disso? - Uma voz masculina se pronunciou, imagino quem poderia estar a se esgueirar com Elora aquela hora da noite.

- Eu sei o que você deve estar pensando. Eu preciso me livrar dessa garota. O barão é sua melhor chance.- O meu coração apertou-se enquanto escutava as palavras da rainha. Meus olhos se encheram de lágrimas de tristeza e confusão. Era mesmo o pai de Corbin que estava ali?

A Filha do InfortúnioWhere stories live. Discover now