Capitulo 12

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                           Liya.

Possuo medo, medo de permitir que alguém conheça o meu ponto fraco. Tenho medo do novo, de algo que não conheço; do que não vejo. E provavelmente isso já ficou claro para ela, não adequadamente, mas ficou. Não pretendo desmoronar o muro que há entre nós, apesar de que abro a porta para que ela espie.

Floris é encantadora, e me condeno por ter julgado-a. A maneira como se comporta, como se diverte. Como é. Tudo nela me encanta um pouco. Mas tenho medo, não costumo criar laços com meninas. A grande maioria é idiota, e eu repudio pessoas idiotas. Não possuo amizades, senão o Caio. Eu sei que é antiquado, mas não ligo. Prefiro viver sozinha no mundo dos livros, onde posso vivenciar inúmeras histórias sem sair de casa.

Leio livros sobre romance e fantasia, sobre amores e desamores. Sobre solitude, solidão, euforia e evasão. Tudo, tudo me encanta; do mais simples ao composto. Porém, o que me instiga a imaginar, vez ou outra, é a ideia de namorar. Como seria namorar alguém, partilhar a vida e criar momentos inesquecíveis como nos filmes? Provavelmente nunca obterei resposta, afinal das contas não me permito conhecer ninguém. Não sinto nada por ninguém.

Certa vez o Caio me perguntou se eu ficaria com uma mulher, e isso rodopiou meus pensamentos. Não sei como funciona um relacionamento entre duas mulheres; se há segredo. Não faço a mínima ideia de como seria transar com uma mulher… Como seria?

Levanto-me da cama e caminho até os meus livros. Tenho quase certeza de que possuo um livro lésbico, que comprei inusitadamente em uma feira de livros. Vasculho os dedos entre eles até encontrar. Retiro-o com cuidado e vou até a cama novamente.

Tenho alguns minutos antes do jantar, então posso ler. Leio o bastante para chegar em uma das cenas onde as duas garotas estão prestes a dar o primeiro beijo. As carícias, as palavras ecoando como súplica. A tensão. Tudo, tudo se encaixa perfeitamente para que o beijo aconteça.

Estou petrificada, sequer consigo respirar sem ofegar. O beijo foi tão bem desenvolvido que não percebo que estou com as pernas espremidas uma à outra.

Caramba!”, ofego, fechando o livro e deixando-o de lado. E me assusto ainda mais ao ver a porta escancarando-se diante dos meus olhos. Floris me olha confusa.

— Me desculpa, não achei que estivesse ocupada. - Ela diz, olhando fixamente para mim.

Por que ela achou que eu estava ocupada?

Olho para mim mesma e percebo que estou coberta até a cintura, com as mãos apertando o lençol. Queria ser mágica e desaparecer para evitar este constrangimento.

— Não é isso que você está pensando… - sussurro, jogando o tronco para trás. Solto uma lufada de ar, totalmente incapaz de formular algo para que ela não pense o que está a pensar. Mas eu sei que a primeira impressão é a que fica.

— Eu não pensei nada. - diz, erguendo as mãos e os ombros. Ela evita rir, mas sei que é tudo isso que ela quer.

— Eu só estava lendo! - Retiro o livro debaixo dos lençóis e ergo-o para que ela veja. Não sei por quê o meu nervosismo, mas não quero que ela pense que estava fazendo outra coisa.

— Isso é um livro lésbico? - Ela diz alto demais. Fricciono a mandíbula, fuzilando ela com os olhos. — Desculpe! - sussurra, entrando de vez em meu quarto. — Acho que já li este livro. - Floris o tira das minhas mãos e abre exatamente onde parei. Ela demora em torno de uns 2 minutos para ler a cena que acabei de ler, então me olha, com os lábios esmagados, as sobrancelhas um pouco erguidas. — Não sabia que você lia livros assim…

— Isso não significa nada! - Exclamo, retirando o livro da sua mão. — É somente um livro, assim como qualquer outro.

— Um livro onde duas mulheres se beijam deliciosamente? Até eu senti vontade de ler. - murmurou, com um sorriso safado nos lábios. — Não precisa ficar com vergonha.

— Quem disse que estou? As pessoas se beijam em livros também, é normal. - Concluo, me levantando para guardar o livro. Assim que me viro, Floris está com a cabeça apoiada em uma das suas mãos, me olhando estranhamente. O seu olhar me causa embrulho no estômago. Tento esconder as minhas mãos que estão suadas atrás do meu corpo. — O jantar já está pronto?

Quero mudar de assunto. Não quero que ela perceba que um simples beijo ocasionou em sensações irreconhecíveis.

— Você já beijou mulheres? - pergunta, perscrutando-me.

— Não, não beijei e nem desejo. - apressadamente falo.

— Calma, gatinha furiosa, não precisa ficar nervosa. - Sua voz sai arrastada, em um tom desconhecido para mim. Floris está com o polegar entre os lábios, mordendo a unha. — É só um beijo. As pessoas se beijam, não é?

Seus olhos penetrantes fixos nos meus faz-me recuar para trás, debatendo minhas costas contra os livros. Não consigo manter-se quieta.

— A primeira vez em que eu beijei uma foi… incrível. Nos beijamos na varanda da minha casa. Ela era amiga de Liam, veio com ele. Ele tinha ido buscar o nosso lanche, até que ela me empurrou contra a soleira da porta e me beijou lentamente… - Floris comenta os detalhes, mas o que cessa o meu ar são suas reações ao contar. Seus olhos caídos sob as lembranças, a voz falha lembrando das sensações, a maneira como os seus lábios se movem constantemente. Retomo o fôlego rapidamente ao sentir que seus olhos recaíram sobre mim. — Beijar mulher é diferente, calmo… - suspira, ofegante — Enfim, eu acho normal. - Completou, sentando-se sobre a cama.

Um nervoso irreconhecível tomou conta de mim enquanto tentava processar suas palavras. Incapaz de desviar meus olhos curiosos, a tensão entre nós se tornou palpável. Cada palavra parecia aumentar a distância entre nós, mas nossos olhares se encontraram, criando um momento carregado de sentimentos não ditos. A troca de olhares prolongada revelou uma tensão inexplicável, como se ambas estivessem à beira de algo, mas nenhum de nós sabia exatamente o quê.

Floris deu alguns passos na minha direção, e uma tensão elétrica encheu o espaço entre nós. Minha garganta fechou, e as minhas mãos trêmulas se entrelaçaram nervosamente. O silêncio tornou-se denso enquanto nossos olhares se encontraram, trocando palavras não ditas. Cada movimento dela era como um passo em direção a um precipício desconhecido. Sentia como se o chão sob os meus pés não existisse. Fechei os meus olhos à medida em que ela se aproximava.

Nesse instante carregado de tensão, o meu pai apareceu inesperadamente. Seu semblante sério e a presença imponente fizeram com que recuássemos involuntariamente. O silêncio foi interrompido por sua voz firme, como se trouxesse consigo a realidade que estávamos evitando. Era como se o tempo tivesse retomado seu curso normal, dissipando a atmosfera intensa que se formara entre Floris e eu.

— O jantar está pronto, meninas! - disse, nos olhando. — O que vocês estavam fazendo? - Meu pai franziu o cenho, e eu rapidamente olhei para Floris implorando para que ela falasse algo.

— A Liya estava jurando que era mais alta do que eu.

É tudo que ela diz. Reprimo o riso, mas ela me encara para que eu encene também. Olho para o meu pai que ainda não está convencido do que ela diz.

— Pai, não é verdade que eu sou mais alta do que o senhor?

Ele olha para si, depois nos olha.

— Essa é a sua vontade, filha. Mas não, você sequer chega perto. — Riu, tentando fingir que acreditava. — Venham comer, meninas!

Quando ele por fim sai, consigo respirar. Olho para Floris, não quero entender o que iria acontecer caso o meu pai não tivesse nos interrompido. Mas fico curiosa. Engulo em seco e saio da sua presença, e antes que eu gire a maçaneta para sair, Floris segura a porta com a mão.

— Tudo bem com você? - Ela me olha.

— Tudo ótimo, por que? - dirijo meu olhar para o dela, a fim de transpassar segurança, quando na realidade estou trêmula por dentro.

— Curiosidade. - É tudo que diz.

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