Capítulo 15

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                                Floris.

Semicerro os olhos, trincando os dentes, retraindo a vontade de esmurrar o Caio por ter aparecido justo agora. Liya se afastou rapidamente quando o viu, ficou assustada. Não consigo pensar em outra coisa senão no calor dos nossos corpos juntos que, apesar da roupa que os separaram, deu para sentir o que ambas vibravam: euforia.

A sua chegada foi improfícua, predestinada. E se há um Deus que nos rege, o condeno por ter permitido a chegada dele. Não havia outro momento? Por que não daqui a 10 minutos? Tempo suficiente para que eu pudesse sentir a textura dos lábios avermelhados de Liya. Agora, cá estamos nós, paralisadas diante da vergonha, sem saber como agir ou o que pensar. A culpa é dele, e eu irei esbofeteá-lo.

— Vocês estavam…? - inferiu, um pouco assustado, como se soubesse que acabara de interromper um dos beijos mais intensos que estava previsto para acontecer. — Merda! - Silabou, em um sussurro.

— Não, eu só vim pedir desculpas e… - Liya me olhou, receosa. — Enfim, eu

— Mereço! - Fecho os olhos, com a mão sobre a testa, negando com a cabeça que isso está acontecendo. Ergo o olhar e fuzilo Caio, que me pede desculpas pelo olhar. Indico com a sobrancelha para que ele saia. — Caio… - murmuro, suspirando todo o ar que outrora prendia.

— Eu… - Liya ainda ressoa nervosa, sequer consegue manter seu olhar, fica desviando há cada segundo. Seguro em seu queixo, trazendo sua atenção para mim. Estou próxima novamente dela, mas desta vez consciente. — Floris…

Hum? - sussurro, arqueando um meio sorriso de canto. Desço meu olhar para os seus lábios e percebo que ela recua um passo, chocando-se com a parede. Quero rir do seu desnorteamento visível, mas também estou tão nervosa quanto, apenas consigo disfarçar. Meu olhar permanece fissurado em seus lábios convidativos e sedentos. — Liya… - arrasto seu nome em um sussurro, fazendo-a prender o ar e espremer os lábios. — Péssimo gosto, hum? - Minha voz está tão suntuosamente arrastada, que há cada palavra dita, Liya contrai. E eu adoro vê-la assim, nervosa. — Pelo visto, não… você não é um péssimo gosto - aproximo meus lábios do seu ouvido, firmando minhas mãos em sua cintura. — Não repita isso, Maliya. Com certeza o seu gosto é delicioso… - mordisco o lóbulo da sua orelha.

Liya me empurra com as mãos, afastando-me. A vejo se perder entre os corredores e da minha visão. Encosto a testa na parede, com os olhos fechados, sentindo meu ventre contrair diante de tudo que aconteceu. Estive tão perto e tão longe ao mesmo tempo que, com certeza, estou vulnerável. Necessito aliviar a vontade indestrutível dos lábios de Liya.

Encontro Caio, ele está de costa, o que me dá total liberdade de esmurrar seu ombro levemente. Queria mesmo era afundar sua cabeça em uma privada, depois asfixiá-lo. Mas não posso fazer isso, então acabo suspirando frustrada. Caio percebe e se vira, me olhando como se pedisse perdão. Agora quero rir, porque o seu desespero é evidente.

— Eu.. eu não imaginava, amiga. - lamentou.

— Deveria. As duas sumiram e… - Desvio meu olhar para o lado oposto da quadra. — Você acha que deu certo?

— Você ainda pergunta? - ele me interroga, com as sobrancelhas erguidas. — Vocês quase se beijaram! - exclama, eufórico.

— Isso, divulga pra todo mundo saber. Fala um pouco mais alto, bobo. - Rolo os olhos, ainda com o olhar fixo. — Eu… estou sem reação. - sussurro, sentindo meu corpo padecer diante das sensações.

— O que ela falou? - pergunta.

— Me pediu desculpas, mas ela é esquentadinha, se irrita fácil, então… a provoquei. - Dou de ombros, agora com o olhar voltado para Caio. — Caio - deslizo a mão sob meu cabelo — Ela tem uma boca tão gostosa… Acho que essa é a minha sentença.

— Qual?

— Desejá-la eternamente. - murmuro.

                                ~*~

Caminhando em direção ao meu apartamento, o peso das chaves na minha mão denunciava a ansiedade que crescia a cada passo. A minha mãe está aqui, e eu estou farta de saudade. Achei que nunca sentiria tanta saudade assim, mas sinto, sinto o suficiente para querer abraçá-la e me aninhar em seu colo. Ao me aproximar da porta, algo fora do lugar chamou a minha atenção: um cartaz grotesco estava pregado, cruelmente, na madeira familiar. Engulo em seco o nó que forma-se em minha garganta, enquanto vago com o olhar pelos arredores em busca dele, mas não encontro. O gosto amargo do medo invade minha boca.

Um calafrio percorreu minha espinha enquanto lia as palavras escritas com raiva. Meu coração batia descompassado, e o medo transformava o ambiente conhecido em um labirinto desconhecido. A sensação de vulnerabilidade envolvia cada pensamento, como se as paredes do meu próprio refúgio se fechassem sobre mim.

Com as mãos trêmulas, finalmente destranquei a porta. Cautelosamente a abri, e o alívio inundou minha alma ao ver o rosto acolhedor da minha mãe do outro lado. Seus olhos expressavam preocupação e amor, dissipando as sombras que o cartaz havia lançado. O medo cedeu lugar à segurança, e abraçá-la foi como encontrar um porto seguro após uma tempestade.

Era como se, naquele abraço, eu encontrasse o conforto que qualquer outro lugar fosse incapaz de me dar.

Mamã - sussurrei, abraçada ao seu corpo, sentindo seus braços apertando meu corpo. — Que saudade, mamãe! - desabo a chorar, por medo.

Ao perceber, minha mãe desvencilha-se de mim e ergue sua mão para limpar as lágrimas que insistem em cair. Sorrio diante da sua atitude, e a abraço novamente, desesperada pelo calor dos seus braços.

— Mamãe está aqui com você - ela diz, aninhando seus dedos em meu cabelo.

Queria tanto poder dizer a ela que estou com medo, que estou assustada. Queria poder dizer que o Liam nunca me deu paz, que ele é um psicopata que eu não sei do que ele é capaz de fazer. Queria chorar todo o meu desamor, todo o meu medo e desconforto. Mas não posso, pois isso resultaria em não morar sozinha e ter que voltar para as asas da minha mãe. E depois que você prova o gosto da liberdade, recuar não é mais uma escolha.

— Senti tanta saudade de você, filha. - disse, olhando em meus olhos.

— Eu também, mamã. Muito. - Ela sorri, como se estivesse frente a frente com o seu grande e único amor. — Eu te amo!

É muito difícil pra mim expressar o que sinto, mas às vezes se torna difícil não falar. Não sou clichê, mas às vezes me permito ser.

A luz suave da sala de jantar criava uma atmosfera acolhedora enquanto minha mãe e eu compartilhávamos risadas e conversas reconfortantes durante o jantar. O aroma familiar dos pratos que preparávamos juntas preenchia o espaço, dissipando as sombras da tarde tumultuada.

Entre uma garfada e outra, a campainha tocou, quebrando momentaneamente a tranquilidade. Senti medo, medo e curiosidade. Implorei, mentalmente, para que fosse o Caio e não o Liam. E lá estava ele. Caio. Minha mãe o cumprimentou com um gesto amigável.

Uma onda de apreensão me envolveu quando percebi que minha mãe estava prestes a mencionar seu nome na conversa. Um medo, resquício do que pode acontecer, fez meu coração acelerar. Ele não sabia que a minha era ninguém menos que Sabrina Jenkins, e não estava em meus planos apresentá-los.

— Nos conhecemos por intermédio de uma loja, mãe. Ele me ajudou a montar os móveis e acabamos virando amigos - Relembro, com um sorriso cauteloso. — E ele estuda na mesma faculdade que eu.

— Ai, que legal! - disse mamãe, entre sorrisos sinceros e acolhedores. — O que você faz da vida?

Com uma única frase ela conseguiu segurar uma conversa por longos minutos, e eu fiquei de cobaia dos dois, que riam como velhos amigos. Como uma tia e um sobrinho.


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