3 | Billie Jean

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1

— Eu disse que ele não parece.

Charlie estava incrédulo, gritou para eu parar de mentir e me golpeou com o travesseiro.

— Caralho! — Devolvi a travesseirada na cara do indivíduo. — Eu já disse que ele não parece.

Charlie não se deu por vencido.

— Todo moleque rico é um mauricinho. É regra.

— Mas ele não parecia ser um! — Redargui novamente, puxando meu caderno de notas da sua mão.

Mantenho todos os meus rabiscos naquela caderneta do tamanho de um porta-retrato; meu primeiro desenho do cupido ainda estava na terceira página, embora um tanto desgastado pelo passar dos anos. Entre as páginas amareladas, todos os contornos de decalques que desejava recriar na minha pele. Aqueles modestos traços de lápis, agora um pouco desvanecidos, permanecem como vestígios de uma tatuagem. Quem sabe, algum dia, eu preencheria meu corpo de tinta com todos os desenhos daquelas páginas.

— A mãe dele parece uma mistura da Marilyn Monroe com a princesa Diana.

— O mauricinho puxou a mãe?

Soltei um riso de canto, me preparando para soltar a bomba. Se ele me achava branco de costas, é porque não tinha visto Jimin Park.

— Coreano como o pai, loiro como a mãe.

Como eu imaginava, Charlie teve um treco.

— JK, se você fosse uma mulher... Estaríamos fabricando mestiços agora mesmo.

Contei sobre o engomadinho meticuloso que me recebeu na mansão, as duas imponentes Ferraris que vi na garagem, os espaços grandes e luxuosos dos cômodos ainda vazios, o jardim que parecia ter saído de um conto de fadas da Disney, e um pouco mais das estranhices que envolviam o herdeiro da fortuna milionária.

— Ele buscou água para você? Que tipo de rico é esse?

— Foi o que eu disse.

— Estranho.

Charlie aprofundo-se em questionamentos silenciosos; após isso, me olhou de uma forma um pouco suspeita.

— Como era o jeito dele?

Franzi o cenho.

— Esquisito?

— Não, isso não — ele coçou a garganta. — Tipo... ele parecia algo como o Freddie Mercury?

Hã?

— Não! O que quer dizer com isso? — Indaguei. — Ele parecia ser meio ingênuo, com uma voz aveludada. Mais Michael Jackson do que Freddie Mercury.

Charlie deixou o corpo cair, como se estivesse cansado de mim. Me olhou de forma tediosa. Qual era a dele ultimamente?

— Às vezes você é tão burro.

Começamos a nos bater com o travesseiro de novo.

2

No dia seguinte, rasguei as ruas de Manhattan, cantando pneu pela segunda vez, e fui brindado com os xingamentos familiares do Sr. Huang pela segunda vez. O rádio local ecoava o som envolvente de ABC dos Jackson 5, assobiei pelo trajeto inteiro. Atravessei os imponentes portões abertos pelo engomadinho a serviço da família Park.

Manobrei até a área dos funcionários e, curioso, lancei um olhar rápido para a parte de trás da mansão. Uma ampla piscina tomava conta quase que por completo da paisagem; e em volta, palmeiras e espreguiçadeiras debaixo de guarda-sóis coloridos. No trajeto, a garagem dos afortunados exibia com orgulho reluzentes Porsches e imponentes Mustangs naquele dia, seus capôs brilhando intensamente sob o radiante sol do verão de NY.

REFLEXOS • jikook (1988)Onde histórias criam vida. Descubra agora