10 | Efervescente

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O ponteiro do relógio batia exatamente oito em ponto, a cidade que nunca dormia estava em seu ápice. Nova York presenteava aquela noite de sexta-feira com luzes reluzentes no alto dos arranha-céus, jovens da classe média se aventuravam nas ruas de paralelepípedos lotados de atrações, letreiros neon coloriam a paisagem em um belo desfile fluorescente.

Dentro de um Mustang sem teto solar, o vento varria meu cabelo para trás, se desfazendo de todo meu esforço em arrumá-lo para aquela ocasião. As madeixas douradas de Jimin Park se transformavam em fios de ouro, cintilando no vulto. Se eu não estivesse no volante, teria dedicado mais tempo a admirar aquela cena que eu nem sabia porque me atraía tanto.

Foi só no terceiro ou quarto semáforo que notei alguns olhares curiosos da rodovia. Me senti como um espião infiltrado na alta sociedade; ninguém arriscaria apostar sequer um dólar que minhas raízes tinham solo no lado menos glamouroso do Brooklyn, não quando eu conduzia aquele possante que parecia ter saído diretamente de uma cena de filme.

Jimin trocou a face da fita k7, fazendo Bonnie Tyler gritar no tocador sobre seu desejo inclemente por um herói forte, rápido e disposto a lutar.

— O que você fazia na Coreia antes? Como as coisas eram lá?

Dei um giro nos pneus do Mustang e saí da avenida principal, direcionando para o lado mais afastado da cidade.

— Há pouco tempo atrás estávamos gritando pela democracia, sacudindo as coisas.

— Tá brincando? — Ri, incrédulo.

Jimin jogou a cabeça para trás e gargalhou, aproveitou o vento fresco que quebrava o ar.

— Vivem em um regime? Estamos no final do século vinte!

— Não é de todo mal, pelo menos temos nosso próprio pop.

Gargalhamos.

— Você deve amar a América.

Jimin assentiu, sem vergonha nenhuma.

— Eu não diria que amo. Apenas acontece que as pessoas aqui estão um pouco mais a frente.

— O avanço de integração racial deu certo lá? Tem algum negro em Columbia ou é só lenda urbana?

Jimin soltou outra gargalhada, uma tempestade sonora que sacudiu tudo dentro de mim. Seu sorriso tornava a ideia de um choro quase uma profanação. Era tão bonito que eu queria que permanecesse intocável, tão bonito que eu queria só para mim.

— Tem em outros cursos menos elitizados. Na minha turma, a coisa menos branca sou eu.

— Fala sério.

O Drive-In se aninhava em uma paisagem pitoresca, um respiro distante da agitação nova-iorquina. Um amplo campo se estendia diante de nós, salpicado por carros conversíveis e impregnado pelo irresistível cheiro de pipoca amanteigada. Entre risadas abafadas e murmúrios ansiosos, alguns jovens, envoltos em mantas, criavam acampamento nas capotas dos veículos, enquanto Besouro Suco dava seus primeiros passos na enorme tela.

— Chegamos tarde demais? — Jimin inquiriu ao balconista, que ostentava uma camisa listrada e uma gravata borboleta no quiosque à entrada.

REFLEXOS • jikook (1988)Where stories live. Discover now