21 - Posso ficar na sua mansão?

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Ruby Alves

Nunca senti tanto nervoso na minha vida. Quando percebo, as palavras já haviam saído da minha boca. Tentei demonstrar, o máximo possível, não me importar com aquilo, mas porra, estava me consumindo por dentro não poder expor logo a verdade de uma vez. E sim, não poder. Digo isso porque meu filho estava ali e jamais o colocaria numa situação do tipo. Só não sei porque diabos falei que Gabriel é o pai de Caim, sendo que, por mais que não tenha certeza, no fundo do meu âmago, sinto que não, não é ele.

Nunca falei sobre isso com ninguém. E quando falo ninguém, incluo Anne nesta contabilidade. Sim, me transei com Gabriel enquanto me envolvia secretamente com Abbadon, o que torna minha dúvida em relação à paternidade plausível.

Contudo, a noite que tive com Abbadon em Búzios foi absolutamente mágica. Eu demorei a me recuperar depois daquilo, porque foi uma troca de energia surreal, inigualável e inesquecível. Exatamente, três anos se passaram e eu nunca esqueci um detalhe sequer daquela troca que tivemos.

E quando Abbadon diz que "o nome de Caim é sugestivo" ele está certo. Sim, está, por mais que odeie admitir. Porque, na minha cabeça, apenas uma noite mágica seria capaz de gerar uma criança tão cheia de luz como o meu filho. Sem contar que aquilo foi tão intenso que, quando descobri a gravidez, a memória vívida do momento ainda estava fresca na minha mente, então quis trazer mais um anjo caído para a minha vida, por mais que, na minha concepção, nunca fosse descobrir, de fato, se ele realmente é filho de Abbadon.

E agora encontro-me imersa em mais uma furada. Apenas seria diferente se não fosse eu.

A pessoa que alugava meu apartamento no Rio devolveu o imóvel na semana passada, e é lá que Anne e eu pretendemos nos hospedar durante nossa estadia na cidade.

No entanto, ainda não tive a oportunidade de verificar o estado em que o apartamento se encontra. Imediatamente após a nossa chegada, eu e Anne deixamos nossas malas e as de Caim na recepção e saímos para resolver parte de nossos assuntos pendentes, sem tempo para avaliar as condições do meu próprio espaço.

Apesar de não planejar passar muito tempo no apartamento, dada a necessidade de retornar à minha clínica e aos animais sob nosso cuidado, que não podem ser deixados sem assistência por um período prolongado, mantenho a esperança de que o imóvel esteja em boas condições, afinal, só Deus sabe quando vou conseguir desfazer essa nova burrada.

Demoro mais que o comum para chegar ao prédio, pois Caim está apagado no meu colo. O porteiro, que me reconheceu apesar da feição levemente envelhecida, me lança um sorriso enrugado.

Ele é um senhorzinho muito gentil e adorável, e não nos vemos há muito tempo, afinal, não moro mais aqui.

— Nossa, tá arrumada dona Ruby. — Elogia. — Meninão esse aí. — Ele fala apontando para Caim no meu colo e eu sorrio.

— Pois é, meninão. E tão pesado quanto. — Dou uma risadinha. — Vou levá-lo antes que acorde.

— Oh, quer que leve pra senhora? Deve estar carregando esse menino há um tempo, isso acaba com a coluna dona Ruby. — O senhorzinho, do qual não me orgulho de não lembrar o nome, ergue os braços.

Até penso em negar, mas ele está certo. Minha coluna está ardendo de dor. O apartamento fica próximo à Néctar, mas com um garoto de 16 quilos nos braços a proximidade não parece tanta.

Depois de um minuto que mais parece vários, aceito a oferta com um sorriso cansado e coloco cuidadosamente o corpo de Caim sob os cuidados do senhor.

— Depois eu desço para pegar as malas, tá bom? — Pergunto teoricamente e ele assente.

Néctar - PAUSADAWhere stories live. Discover now