Néctar - PAUSADA

23 - Me deixa sem controle

Ruby Alves

Sinto todo o meu corpo em erupção. Mas não posso dar atenção a isso, pelo menos não agora. Isso porque as palavras de repreensão de Anne dominam o ambiente no quarto onde ela está hospedada na casa de Abbadon, para onde ela me levou após interromper o momento quase íntimo que estava tendo como ele próximo à piscina.

— O que você tem na cabeça, Ruby? — Anne fecha a porta e me encara. — Está querendo que essa merda fique ainda mais complicada? Porque, pelo que me explicou no carro, você conseguiu ferrar ainda mais a situação afirmando com todas as palavras que Caim é filho de Gabriel. Quero ver sob qual justificativa vai pedir a porra do teste de DNA.

Fecho os olhos e respiro profundamente. Passo as duas mãos no rosto e, em seguida, pelo cabelo, desarrumando-o ainda mais. Recosto meu corpo na parede e, lentamente, abre novamente os olhos, visualizando minha amiga sentada sob a cama, aguardando algum tipo de resposta.

— Simplesmente perdi o controle. Desde que entrei naquela merda de Boate, Anne. Eu o senti escorrer lentamente pelas minhas mãos. Quando me vi presa na sala de Abbadon, ao lado dele e de Gabriel, eu perdi a porra do controle. — Levo as mãos ao rosto novamente, mas agora para poder segurar as minhas lágrimas, que já começaram a descer sem qualquer permissão. — Gostaria de voltar no tempo e nunca ter voltado para esta merda de cidade. — Esbravejo. — É muito mais fácil fingir que fiz Caim com o dedo.

O choro que há anos estava preso na minha garganta finalmente encontrou sua liberação. As lágrimas escorriam abundantemente, cada uma carregando consigo a dor e a angústia acumuladas ao longo do tempo. Sentia-me completamente fora de controle, uma sensação estranha e desconfortável para alguém que sempre prezou por manter as rédeas da própria vida. Reencontrar Gabriel e Abaddon, após tanto tempo, reacendeu em mim um turbilhão de emoções conflitantes. A traição de Gabriel ainda doía, uma ferida que jamais cicatrizou completamente. E, paradoxalmente, a lembrança da minha própria traição com Abaddon, e o prazer proibido que dela derivou, adicionava uma camada ainda mais complexa de sentimentos à minha dor. Para piorar, a gravidez inesperada sem saber ao certo quem era o pai do meu filho, tornava tudo ainda mais insuportável.

O choro que agora me consumia era a expressão mais pura da minha vulnerabilidade. Estava exposta, sem escudos, enfrentando o peso das minhas escolhas e das consequências que elas trouxeram. Era como se, ao chorar, eu finalmente admitisse para mim mesma a extensão do caos que havia criado em minha vida.

Ao perceber meu estado deplorável, Anne, que antes me dava um belo esporro, senta-se ao meu lado e envolveu os braços ao redor de meus ombros, senta esta a única coisa capaz de me acalmar agora.

Ela se afastou do abraço, segurou meu queixo com delicadeza e ergueu meu rosto, direcionando meu olhar ao dela. Antes de falar qualquer coisa, Anne limpa minhas lágrimas insistentes e cruza os braços, me encarando seriamente.

— Você não pode fugir da responsabilidade para sempre — disse minha amiga, com uma voz firme e carregada de preocupação. — Se você pudesse voltar no passado, estaria apenas sendo egoísta novamente, impedindo seu filho de ter um pai e um dos dois de ser pai. Se fosse esperar o tempo resolver, só pioraria as coisas. Caim vai crescer, e se ele fosse descobrir no futuro que você não veio resolver isso, a culpa recairia toda sobre você. Ele poderia pensar que você só pensou em si mesma. É hora de enfrentar isso de frente e dar a ele a chance de ter uma família, não importa o quão difícil seja para você. — Afirma firmemente, embora bastante preocupada. Já eu soluço.

— Não sei por que disse aquilo quando Gabriel entrou na sala de Abbadon, nem por que perco o controle perto do meu ex-sogro. Eu só queria resolver tudo e voltar para casa. Juro que não planejei dizer aquilo, nem ficar por aqui. Isso estava totalmente fora dos meus planos. — Lamento.