|MEMÓRIAS|

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— Mas que bela manhã!— a voz estridente da Rainha fez com que Janna segurasse com mais firmeza a xícara. A temperatura do chá já não estava tão quente e ela conseguiu sorver um longo gole.— Pedi para que servissem o chá aqui dentro por causa do vento. Imaginei que a princesa Ayra ainda deva evitar qualquer tipo de exposição.

Ayra forçou um sorriso que logo escondeu sob a própria xícara.

— É muito gentil de sua parte.— Janna agradeceu pelo gesto depositando o recipiente de porcelana no pires sobre a mesa.

— Não precisa agradecer! Somos família.— Saniya deu um sorriso significativo.

As princesas sorriram e olharam em volta claramente desconfortáveis com aquela afirmação. Sendo forçada a procurar algo para desviar sua atenção Janna se permitiu ser transportada pelas próprias memórias ao olhar para a sala em que estavam. O lustre de cristais, os sofás com estampas finas de flores, a tapeçaria vermelha e rica em detalhes, o amplo salão que ficava bem na frente daquela sala. Tinha vagas lembranças feitas naquele lugar. Memórias que ela imaginava capazes de aquecer mesmo os corações mais frios. Seu pai dançando com a mãe, jantares em família, algumas brigas com a irmã quando ainda eram bem pequenas. Sem perceber Janna deu um sorriso nostálgico.

Ayra ao perceber aquele sorriso o retribuiu com um olhar de profunda compreensão.

— Ainda me lembro de quando conheci o seu pai.— Saniya falou depois de algum tempo quebrando o silêncio. Só então as jovens perceberam que ela também tinha estado imersa em seus próprios pensamentos.— Foi bem aqui nesta sala. Foram tempos felizes desde então.

Ayra mal conteve o olhar entediado que só reprimiu diante da dura advertência contida no rosto da irmã mais nova. Teve vontade de gritar.

— E você minha querida como tem passado?— Saniya se virou pegando Janna desprevenida.— Não pense que eu não percebi como foi o seu ano. Esteve dividida entre a ala leste e esta sala. Te vi por vezes debruçada ao lado do telefone.

A forma como a rainha pronunciava as palavras com pena fez com que o interior de Janna estremecesse. Um sorriso lento e dolorido começou a despontar em seus lábios. De repente tudo retornava para afligí-la. A dor, o frio das madrugadas, as lágrimas, o cansaço e principalmente as incertezas e o medo do que poderia ter acontecido.

— Você esperou tanto. Mas ele não ligou não é?— Saniya se levantou de onde estava e sentou ao lado dela.

Ayra apenas observava aquele diálogo com uma expressão apreensiva.

— Os homens podem ser cruéis.— A rainha tocou a mão dela. Janna teve um leve sobressalto. A pele de Saniya era muito fria se comparada com a dela.— Mas veja, eu tive o prazer de me encontrar com o secretário de sua excelência o Duque de Savoie hoje. E ele me entregou isso.— Ela revelou o envelope amarelado com uma letra grande e rebuscada.

A princesa o recebeu com as mãos trêmulas e os olhos marejados. Sua expressão era como se lhe tivessem sugado a alma.

— Janna!— Ayra se manifestou chamando a atenção das duas.—Eu não estou me sentindo muito bem. Será que podemos voltar para o meu quarto antes?

A Janna custaram alguns segundos para esboçar uma reação ou resposta.

— Janna?— Ayra insistiu.

— É claro. Peço desculpas majestade.— Janna se curvou e apertou o envelope nas mãos.

Em seguida ela se aproximou da cadeira de rodas e esperou que Ayra prestasse uma reverência.

Com Amor, Eu Creio.Onde as histórias ganham vida. Descobre agora