Capítulo 7

15.7K 1K 82
                                    

Todos prontos e em suas respectivas camas, era a minha vez de traçar a rotina de amanhã. Às crianças não teriam aula, porém, iriam participar de um projeto interdisciplinar, um tipo de passeio para um projeto que iria acontecer na escola.
Sairiam às 09:00 da manhã e chegariam às 16:00 da tarde. Passariam praticamente o dia longe de casa. Eu teria que arrumar a lancheira com os lanches de cada um. Eles são detalhistas sobre o que querem comer e para fazer um bom trabalho teria que acordar mais cedo.

Me sentei no chão do corredor, eu teria que anotar porque acabaria esquecendo e parece que todos, inclusive os empregados estão em suas camas e isso me bate uma pontinha de inveja do bem.
Eu necessitava de um banho bem demorado e quente, lavar o cabelo é tudo que eu queria. Logo depois, um suco de laranja natural com gelo. Caraca!

Sobre o beijo do outro dia; foi uma das coisas mais estranhas que já aconteceu comigo.
Tudo bem, que eu já tenha feito um monte de coisas das quais eu me arrependo. Mas beijar ou algo do tipo com o chefe, é a primeira vez e espero que seja a última.
Ainda preciso desse emprego e gosto das crianças, ainda mais agora que estou colocando minha vida nos trilhos.
Me afastei totalmente do senhor ogro por um milhão de motivos que eu fiz questão de anotar e decorar.
Não convém ultrapassarmos os limites impostos desde a entrevista.

Eu queria muito levantar do chão e ir escrever isso em uma mesa, mas, estou com preguiça e o ar condicionado está posicionado em minha frente. A mansão é enorme e às crianças fazem uma tremenda bagunça quando chegam agitadas. E claro, eu arrumo porque sou responsável por tudo que elas fazem e eu não tenho cara de pau o suficiente para deixar Marília arrumar a bagunça dos pirralhos.

—Júlia? O que está fazendo sentada aí no chão?

Olhei para cima, o Alexandre estava em pé olhando para mim. Ele estava um tanto desgastado parece que não vem do escritório. Ele não está com o seu terno perfeito e alinhado em seu corpo. Está mais para uma roupa de passeio.

—Estou anotando algumas coisas que tenho que fazer amanhã para as crianças, senhor Beckham. _Suspirei.

Eu estava com um bloquinho de notas anotando os lanches que elas escolheram.

—O que mais tem nessa casa são lugares onde você pode anotar tranquilamente isso, não precisaria está sentada no chão.

Até uns meses atrás, eu estava pior que o chão por que agora não posso sentar nele para um minuto de reflexão?

—Às vezes é bom parar e respirar um pouco, o chão é um ótimo companheiro para isso. Além do mais, o ar condicionado está em minha frente. _Respirei fundo.

Voltei minha atenção para o bloquinho de notas, até então, todo rabiscado por desenhos aleatórios. EU PRECISO TER FOCO.

—Tem razão, às vezes é bom sentar e respirar!

O olhei, Alexandre estava sentado no chão ao meu lado.

Ah não, hoje eu não estou de bem para ser coach não.

—Às vezes é bom se encontrar!

— Às vezes..._Sua voz saiu quase inaudível.

—Está tudo bem senhor Beckham?

Confesso que perguntei temendo sua resposta. Por favor diga que está bem e vá para o seu quarto dormir.

—Sabe, às vezes eu não sei o que estou fazendo. A empresa, a casa, as crianças, às vezes não consigo conciliar como deveria. Às vezes não consigo respirar e sinto como se estivesse preso sem conseguir fazer minha voz ecoar e alguém ouvir. _Suspirou.

É, quem diria que algum dia teríamos essa conversa sentados no chão do corredor, em plena 22:30 da noite. Ogro está sensível hoje, melhor não provocar.

—Talvez senhor Beckham, o senhor devesse tirar um tempo para pensar, tentar se reencontrar ou algo do tipo.

—Se quisermos mesmo continuar com essa conversa, pare de me chamar de senhor BeckHam por esta noite. _Sorrir.

Meus olhos foram de encontro com o belo pá de olhos azuis, cobertos por uma nuvem cinza de dúvida e desânimo, que agora estavam concentrados em mim. Eu iria jogar um monte de filosofia motivacional para ele, aquelas que eu leio no Twitter. Tenho experiência nisso.

—Sabe, quando Clarisse se foi eu perdi o meu chão não sabia como ia cuidar das crianças sozinho.
E às vezes sinto que não estou fazendo tanto quanto deveria fazer por elas. Me sinto a pior pessoa, parece que eu vou correndo em direção a uma nuvem escura e não sei o que vem depois.

—Ah Alexandre, você às vezes tem que parar e respirar. Mesmo nessa sua "corrida pela nuvem escura".

— O "Às vezes", é a pior parte. Não temos certeza de nada e ficamos nesse impasse sem sabe como vai ser ou como agir.

—Não teria graça se não houvesse o "Ás vezes"

Ele gargalhou.
Acredito que de todo esse tempo em que trabalho com os BeckHam, essa foi a gargalhada mais bonita que o Alexandre já deu e que eu pude presenciar.

—Mas me diga você Júlia, tem sempre os pés no chão? Está se saindo uma ótima coach. _Me olhou.

Se eu contasse tudo que já passei e que já aprontei, talvez ele não iria me querer mais como a babá das crianças. Melhor não arriscar.

—Estamos falando como pessoas que não se conhecem, certo? Não vai poder me demitir se eu falar da minha nada mole vida, não é?

—Claro que não! Finja que eu não sou o Senhor Ogro BeckHam por um momento!

Sorrir. Até que esse apelido pegou legal. "Senhor Ogro BeckHam"

—Eu acho que nem sempre tive os meus pés, cem por cento no chão. Há momento que o impulso me toma e eu acabo fazendo besteira. _Suspirei.

—Nossa nada mole vida!

—Nossa nada mole vida! _repetir a frase.

—Jú, sobre o beijo da segunda...

—Esquece, nunca aconteceu!!_me levantei.

—Hei, Calma! _Segurou minha mão e levantou também.

—Há limites senhor BeckHam e nós nos deixamos levar pelo momento. Então finja que nunca aconteceu.

—É que... Eu não quero esquecer!

—Se pensarmos bem...

—Mas acontece que eu não quero pensar, eu prefiro viver o momento. _Me interrompeu.

Viver o momento! _Sussurrei.

—Isso, viver o momento! _Me beijou.

***

Um barulho de portas batendo me faz abrir os olhos, o melhor e pior despertador que eu poderia colocar em meu celular.

Lentamente tento organizar os meus pensamentos e lembrar do que aconteceu ontem.
Olhei para o lado, eu não deveria ter feito isso, não é? Eu não poderia ter feito isso! Me levantei rapidamente. Por que eu estava na cama do Alexandre e vestida em uma blusa sua? Ah, tô perguntando pra que? Eu sei muito bem o que aconteceu. Eu sou muito imbecil!

Droga Júlia, você só faz merda! _Reclamei ligando o abajur e desligando o despertador do celular.

Como eu pude deixar isso acontecer? Essa historinha de "viver o momento" é uma catástrofe.

—Bom dia, Jú! _Alexandre esfregava os olhos.

—Nada de bom, que fique claro que isso nunca aconteceu! Depois eu devolvo sua blusa. _Peguei minhas roupas do chão e sair rapidamente do seu quarto indo em direção ao meu.

Eu dormir com meu chefe! Droga!


A BabáWhere stories live. Discover now