Capítulo 23 - Reticências e pontos finais

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O início do pôr do sol anunciava a chegada de mais um fim de tarde.

Mas, aquele pôr do sol em especial não nos trazia a alegria corriqueira de um início de noite cheias de possibilidades, mas sim, a tristeza de uma dolorosa despedida.

Lágrimas já não eram mais suficientes para demonstrar todas as amarguras do coração, muito menos todas as emoções que eram sentidas por todas aquelas pessoas em torno do caixão onde o corpo de Francisco se encontrava, sem um último vestígio de vida, um último sorriso ou até mesmo um último suspiro.

Rafael estava entre sua mãe e Marina, ambos sussurravam palavras um para o outro, como uma espécie de consolo, havia lágrimas junto a sorrisos emocionados dos quais gostava de pensar que eram resquícios de boas lembranças que Francisco deixaria em todos eles, vê-los daquela forma tão entregues a dor e a felicidade de terem participado da pouca vida de Francisco, fez meu coração se aquecer.

A mão tão pequena e fria de Clarice se entrelaçava na minha, a força com que ela exercia para apertar minha mão cada vez mais forte contra a sua, me mostrava o quão abalada ela estava por estar presenciando toda aquela dor em sua volta.

— Eu precisava ser forte para cuidar de todos eles tia Júlia – sua voz infantil e tão doce soou em meio as lágrimas que caiam de seus olhos.

— Você é forte Clarice, a menina mais forte que já conheci em toda a minha vida — eu disse sorrindo e abaixando em sua direção para ficar do seu tamanho.

— Se eu já fosse forte tia Júlia, eu não sentiria essa dorzinha aqui dentro — ela disse colocando sua mão livre do lado esquerdo do peito.

— Sabe Clarice, essa dorzinha ai dentro é que me faz ter a certeza de que você é forte, porque só pessoas fortes tem o dom de ter sentimentos, de ter um coração cheio de amor a ponto de doer quando perdemos alguém tão importante em nossas vidas, assim como o seu papai.

— Você sabe das coisas tia Júlia. Obrigada por me fazer acreditar que sou forte para cuidar da minha família, meu pai me pediu isso e vou sentir muita saudade dele, ele sim sabia como cuidar de todo mundo — ela disse com um sorriso em seus lábios, enquanto suas mãozinhas limpavam as lágrimas que escorriam pelo seu rosto.

— Seu pai deve estar orgulhoso por ter deixado essa missão com você Clarice, você é tão forte e encantadora, toda a sua família está em boas mãos, pode ter certeza — eu disse sorrindo enquanto acariciava sua bochecha rosada.

— Obrigada tia Júlia, ainda bem que o tio Rafa encontrou você para me ajudar nessa missão! — ela disse agora rindo com as mãos cobrindo sua boca tão miúda, logo seus bracinhos contornaram meu pescoço e me apertaram em um abraço gostoso.

Ao me levantar, depois de nosso abraço desfeito e segurar a mão de Clarice novamente, pude sentir uma mão forte tocar meu ombro e ao me virar me deparei com Rafael com os olhos marejados.

— Queria muito ter participado desse abraço — ele disse com um sorriso fraco nos lábios.

— Não seja por isso tio Rafa — Clarice disse em meio a um sorriso, soltando minha mão e envolvendo seus braços em torno da cintura de seu tio.

Rafael passou a mão pelos cabelos de Clarice, lhe fazendo um carinho que pareceu tão bem recebido por ela, e logo ele me olhou nos olhos, pegando em minha mão para que eu me aproximasse mais dele, fazendo com que meu corpo ficasse colado ao seu em um abraço lateral, seus lábios tocaram minha testa em um beijo sereno.

— Obrigado por cuidar dela, obrigado por cuidar de mim — ele sussurrou em meio a um sorriso enquanto me encarava.

— Na verdade foi ela que cuidou de mim, e quanto a você, eu quero tanto cuidar mais de você — eu disse sorrindo, passando meus dedos por entre sua barba por fazer.

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