Ecos na escuridão

1K 60 24
                                    



Porque meu eco

É a única voz a voltar

Minha sombra

É a única amiga que tenho

(Jason Walker – Echo)

A solidão era sua companheira diária.

Dentro da cela fria, repleta de dementadores desesperados por uma alma feliz, o jovem loiro, pálido e raquítico não era um prato cheio. Seu interior era vazio e obscuro, o antônimo da palavra felicidade; quem o conhecera em seu tempo de glória, se o visse nas condições em que se encontrava naquele momento — dentro de um ambiente tão vergonhoso e repulsivo —, diria que ali estava a sombra de alguém que um dia tivera tudo, mas, infelizmente, sempre estivera fadado ao insucesso.

Tanta ausência de vida o transformara num ser oco, sem qualquer emoção nas pupilas negras e dilatadas, restando apenas a opacidade de um homem corrompido e sem esperanças. E talvez este fosse o motivo de os guardas encapuzados ficarem tão nervosos quando se aproximavam da cela de número 106.789, onde repousava — nada tranquilamente — Draco Lucius Malfoy.

Aos 24 anos, dos quais seis havia passado na tenebrosa Prisão de Azkaban, o herdeiro dos Malfoy não era mais a mesma pessoa, e isso não guardava qualquer relação com uma sofrida mudança de vida, ou mesmo uma repentina redenção. Dizem as más-línguas — e as boas também— que a prisão tem o poder de transformar um homem, revelando tudo aquilo que ele seria se não houvesse optado por um caminho de erros. Mas com ele não fora assim. Não havia um dia em que não se regozijasse por seus feitos. Assassinatos, torturas e tramas complexas para afugentar o lado inimigo. Sua mudança, entretanto, se dera em virtude do decurso do tempo, que, infelizmente, corria apressado pela maré dos anos. O tempo nunca passava ali, no antro de perdição em que estava enfiado, mas os claros sinais de loucura, típicos de Azkaban, o contaminavam. Ele sabia que, dentro em poucos anos, cometeria suicídio. Ou pior, seria consumido pelos vermes que rondavam as frestas das paredes negras e úmidas de sua cela.

x

15 de Abril de 1999

Sua chegada em Azkaban fora marcada pelo frio cortante dos ventos do norte, e pela fragrância característica da maresia. As ondas quebravam-se suavemente na Ilha. Draco respirou, em um ritmo pesado, sôfrego, no que ele sabia ser a última vez que teria contato com tal atmosfera: os ares da liberdade.

Ele detestava o cheiro do mar, dava-lhe náuseas e o fazia se lembrar de quando seus pais o levavam para as "reuniões agradáveis de família". Nestas reuniões tinha o desprazer de encontrar seu avô, Abraxas Malfoy, que igualmente detestava o mar, mas mudara-se para uma Mansão medieval que ficava a 12,5 km do mar. Louco. Foi sentindo o cheiro do mar que viu o pai de seu pai morrer de varíola de dragão. Uma morte horrível, e, mesmo sendo uma criança de quatro anos, Draco nunca se esqueceu dos furúnculos gigantes, das manchas esverdeadas e das faíscas saindo pelas narinas do avô.

No entanto, enquanto navegava silenciosamente pelo sossegado por encantamentos milenares, tendo a visão da temida prisão cada vez mais próxima de si, sentiu uma vontade insana — e bastante inconveniente — de chorar, quando se lembrou de que não sentiria o cheiro de qualquer coisa que não fosse a podridão da prisão bruxa à sua frente. Preferia o cheiro do mar se isto representasse sua liberdade.

— Inferno— ele exclamara baixinho quando a balsa tocou o solo arenoso.

— O que disse, Sr. Malfoy?— a voz de Thomas Delavick, o bruxo responsável pelas navegações até Azkaban, perquiriu. O tom nada suave ou gentil, tampouco subserviente, como Draco estava acostumado.

ConstelaçãoWhere stories live. Discover now